Filme do Dia: Os Idiotas (1998), Lars von Trier


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Os Idiotas (Idioterne, Dinamarca/Suécia/França/Itália/Holanda, 1998). Direção:  Lars von Trier. Rot. Original:  Lars von Trier. Fotografia: Casper Holm,  Jesper Jargil, Kristoffer Nyholm &  Lars von Trier. Montagem: Molly Marlene Stensgård. Com: Bodil Jørgensen, Jens Albinus, Anne Louise Hassing, Troels Lyby, Nikolaj Lie Kaas, Henrik Prip, Luis Mesonero, Louise Mieritz, Knud Romer Jorgensen, Anne-Grethe Bjarup Riis, Paprika Steen, Erik Wedersøe, Michael Moritzen, Anders Hove.

             Um grupo de amigos, cujo líder é Stoffer (Albinus), decidem passar a viver pondo para fora o idiota que vive em cada um deles. Assim, Stoffer finge-se de débil mental em um restaurante, para o constrangimento de convidados e empregados. Quando sai do restaurante, leva consigo Karen (Jorgensen), que lá se encontrava almoçando. Porém todos se desmancham em gargalhadas quando pegam um táxi, para o susto de Karen, que dorme com o grupo. Aos poucos, Karen se inicia nos princípios do grupo que, entre outras perfomances, entra coletivamente no banheiro de um clube para um banho coletivo ou imita retardados mentais em uma fictícia cliníca liderada por Stoffer. Individualmente, Susanne (Hassing), complica a vida profissional de Ped (Pripp), quando surge repentinamente em seu trabalho, e faz-se passar por uma executiva interessada no estúpido slogan criado por ele. Ou ainda  faz com que Jeep (Kaas), fique com um grupo de homens em um bar, enquanto seu pretenso irmão, Stoffer, vai comprar algo perto. Jeep repentinamente sai da mesa e seu desconforto é interpretado como vontade de ir ao banheiro, sendo levado para lá e tendo que um dos homens manipular seu pênis para que urine. O tio de Stoffer (Wedersøe), dono da casa em que vivem, fica escandalizado com o que vê, já que havia lhe incubido de vendê-la. Uma das interessadas (Steen), desiste após Stoffer deixar claro que os enfermos da instituição ao lado passavam o dia na casa, e faz com que eles apareçam prá falar com ela. Stoffer fica irritado, no entanto, quando um grupo de pessoas com verdadeira deficiência mental aparece na casa. Reage furiosamente a tentativa sutil de transferência para outro município, feita por um representante da municipalidade (Moritz), que foge acuado da insânia coletiva do grupo, que começa a desmontar seu carro. Logo, no entanto, após uma orgia sexual coletiva, o grupo terá que se defrontar com uma mais forte eminente ameaça de desintegração, após o pai (Hove)  de Josephine (Mieritz), a levar, afirmando que ela precisa tomar medicação psiquiátrica, provocando o desespero de Jeep, que pouco tempo antes vivera momentos de amor semi-pueris com a mesma. Da mesma forma, Karen não apenas integrou-se perfeitamente ao grupo, como dá sinais de se encontrar pisquicamente profundamente abalada e Ped prefere abandonar o grupo, quando é escolhido em sorteio por Stoffer para representar o idiota que existe dentro dele para sua própria família.  Henrik (Lyby), por outro lado, falha ao tentar fazer o mesmo em uma aula coletiva prá sua família. Todos arrumam suas coisas e partem. Karen pede Katrin (Riis) que a acompanhe em uma visita que fará a sua própria família, onde irá demonstrar para ele que consegue expor a idiota que existe dentro de si. Em casa, no entanto, Karen tem que enfrentar a indiferença da família, magoada com o seu sumiço após a morte de seu filho, sendo esmurrada pelo marido (Clemensen) ao representar a idiota no momento em que come um pedaço de bolo.
Seguindo os preceitos do movimento autodenominado Dogma-95, von Trier realizou um filme que se aproxima menos do mais ortodoxo Ondas do Destino (1996), dirigido por ele próprio, do que de Festa de Família (1997), do colega Vinterberg. Outra vez uma câmera que em nenhum momento se apoia em tripé ou se importa em ficar fora de foco,  reforçando a atmosfera de improviso e espontaneidade buscada. Outra vez temas sensacionais, envolvendo distúrbios emocionais que chegam ao limite da racionalidade e, aqui ainda mais que no filme de Vinterberg, interpretações vigorosas, com destaque para o desespero de Jeep quando Josephine é levada pelo pai e a melancolia autista de Karen. Outra vez também, um certo vazio de conteúdo que procura se amparar em uma estética visual pouco ortodoxa, que mesmo podendo provocar um choque em um primeiro momento, logo se apresenta como familiar – principalmente prá quem já viu o filme anterior de Vinterberg. Um dos questionamentos que se pode acompanhar com interesse, mesmo que óbvio, é como esse frágil mundo inventado pela comunidade de amigos rapidamente se despedaça quando esbarra seja com a realidade dos verdadeiros doentes mentais, seja com o mundo exterior, representado pela família e o papel desempenhado por cada um anteriormente. O elo que une as diversas pequenas histórias que são contadas a posteriori pelos membros da “família”  diretamente para uma câmera que se posiciona como o ponto de vista de um misterioso interrogador (cuja voz é do próprio cineasta) é o suicídio de Karen, que não chega a ser completamente explicitado. Em seus melhores momentos consegue cenas de grande intensidade, como o do retorno de Karen para sua casa. Em seus piores, e não são poucos, o mesmo senso cômico voyeurístico de situações forjadas para enganar as pessoas que não se encontram interadas da situação dos programas televisivos no estilo candid eye.  Como o filme de Vinterberg, aqui a narrativa parece também se distanciar de qualquer reflexão mais aprofundada sobre a sociedade em que se inserem os personagens, ou será que o anarquismo anti-elitista de Stoffer, enquanto um tosco e confuso arremedo dos vestígios de ideologia que soçobraram, possui alguma pretensão crítica? VPRO Television/   Zentropa Entertainments/  Le Studio Canal+ / 3 Emme Cinematografica/ZDF/DR/ La Sept Cinéma/ SVT Drama/ Liberator Productions/  Argus Film/Arte/  Rai.117 minutos.

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