Filme do Dia: Futuro Junho (2015), Maria Augusta Ramos
Futuro Junho (Brasil, 2015).
Direção: Maria Augusta Ramos. Fotografia: Lucas Barbi & Camila Freitas.
Montagem: Karen Akerman.
Na iminência da Copa do Mundo de
2014 e com manifestações pipocando pelo país esse documentário segue a
trajetória de um operário da indústria automobilística, um motoboy, um
sindicalista dos metroviários e um economista. Cada um, a seu modo, vivencia os
efeitos de uma sociedade em mutação. Numa das falas mais interessantes do
filme, o economista, André Perfeito, afirma que se chegou a uma verdadeira
encruzilhada no país: ou se avança e se quebra os paradigmas do que já está
posto ou se regride a uma posição em que as camadas menos favorecidas que
ascenderam a classe C nos últimos anos retornarão as D e E e, numa inspirada
fala ilustrativa, ele faz referência a “alguém que usava sabão de coco e passou
a usar Dove, não vai querer voltar a usar sabão de coco.” No outro extremo do
espectro, existe o operário da Volkswagen, de quem pouco se ouve e sim mais
ações como a de levar o filho a escola ou trocar alguns murmúrios com colegas
de trabalho. Há um perigo iminente da demissão com a marca inédita de 94 mil
veículos estocados. Há ainda um carismático líder sindical que se vê demitido,
juntamente com duas dezenas de funcionários do Metrô, após as manifestações que
resultaram numa paralisação de quase uma semana e reações ostensivas de
violência policial contra os manifestantes
- numa das poucas imagens não filmadas pela própria equipe do
documentário de Ramos, observa-se imagens filmadas pela Mídia Ninja da
repressão ocorrida na Estação Ana Rosa. O motoboy, por sua vez, escuta um
bizarro plano funerário quando todas as suas economias estão empatadas na
hipoteca da casa. Se as contraposições se tornam evidentes, com o motoboy e
seus amigos afirmando que teriam que deixar de comer para poder pagar o valor
do ingresso de um dos jogos da Copa e, por outro lado, observando-se pouco
depois o economista indo para o jogo do Brasil e cantando o hino nacional, de forma
algo ambígua e sarcástica no metrô, não se cai no discurso panfletário ou em
oposições fáceis. As incongruências de uma sociedade que sofre os desatinos de
um sistema econômico perverso e cujos mecanismos se encontram muito além dos
limites da cidade de São Paulo, onde tudo isso se torna mais marcado, já que a
cidade que ilustra melhor que nenhuma outra no Brasil o mesmo, começam a ganhar
rosto e nome. Essa relação entre macro e micro-histórias é uma das forças da
obra de Ramos que se aproxima mais de um viés do cinema direto-observacional de
forte pulso estilístico – enquadramentos sempre que possíveis impecáveis e sem
câmera tremida – e, mais importante, por um respeito em relação a quem filma
erigido no relativo distanciamento em que são filmados. Nofoco Filmes. 100
minutos.
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