Filme do Dia: México de Mis Recuerdos (1944), Juan Bustillo Oro

México de Mis Recuerdos (México, 1944). Direção e Rot. Original: Juan Bustillo Oro, a partir de seu próprio argumento. Fotografia: Jack Draper. Música: Federico Ruyz. Montagem: Mario Gonzalez. Dir. de arte: Luiz Moya. Figurinos: Armando Valdés Peza. Com: Fernando Soler, Sofía Álvarez, Joaquín Pardavé, Luis Aldás, Antonio R. Frausto, Tana, Virginia Zuri, Mimí Derba.
No México da belle époque e do porfiriato, Don Porfírio Diaz (Frausto) faz com que seu assistente, Don Susanito (Pardavé) presenteie o autor da bela composição dedicada a sua esposa, Don Jesus Flores, mais conhecido como Chucho (Soler). Quando Susanito vai atrás de seu paradeiro, suas irmãs falam que ele morreu já faz uns vinte anos. A verdade, no entanto, confidencia uma delas é bem outra. Ele encontra-se vivo, mas entregue a bebida e a boêmia e elas não querem que seu filho, Pablo (Aldás), veja o pai nessa situação. Rosario (Álvarez), apaixonada por Pablo, somente tem desse desprezo, por ser demasiado correta e ele ter uma fascinação por mulheres mundanas, para o horror do trio de tias carolas que detém o restante da fortuna da família que não foi esbanjado pelo pai. Don Jesus tem então a ideia de que Rosario se faça passar por uma cantora galante para impressionar Pablo. E de fato ele se apaixona pela cantora, que passa a esnobá-lo seguidamente. Após torna-lo ciente de quem é, ainda assim Pablo continua interessado por ela. Resta agora dobrar os interesses contrários das tias, que acham que a Rosario que conheciam não mais existe. O trunfo vem mais uma vez de Don Jesus, que afirma que mudarão de ideia quando souberem que Don Porfírio Diaz será o padrinho do casamento. O que eles pensam é em convocar um homem que se faz passar pelo presidente mexicano, porém no dia do casamento, após ter sido sutilmente persuadido por Don Susanito e para espanto desse próprio, Don Porfírio vai ao evento.
Com sua narrativa ficcional emoldurada por uma narração situada no tempo contemporâneo à sua produção o que certamente mais chama a atenção nessa produção é o quanto, conscientemente ou não, os valores pós-revolucionários continuaram a alimentar uma sociedade ainda eminentemente tradicional e conservadora, buscando através do estratégico recuo ao passado, tornar vibrante o seleto universo justamente da elite e o ethos social ao qual a revolução irá se contrapor. Algo que fica patente, ao final, com a partida do ditador a quem são jogadas flores no percurso que o levará ao navio e exílio na França e a quem todos os personagens observam comovidos, com o narrador a afirmar que “começava a agonizar lentamente o México de minhas lembranças”. Um cartela ao início admoesta que os personagens históricos surgem, “com todo respeito”, apenas enquanto  “símbolos de sua época”. Porém, mais que símbolo de sua época, Díaz encarna a imagem de um homem de postura moral inquestionável, protetor e condescedente, apenas tangencialmente captado pela ótica melodramática que rege essa comédia – ao observar ao final que admira o quanto Rosario fez para conquistar seu amado. Aliás a questão de gênero nessa produção até pode sinalizar em certo tom progressista com a mudança de postura de Rosario porém, em última instância, não apenas a divisão entre mulher virtuosa e mundana permanece indelével como essa encarnação é feita apenas tendo como objetivo conquistar e se submeter ao homem amado – portanto se trata de uma interpretação em falsete, com tempo certo para findar e para o rearranjo convencional dos papéis típicos de gênero. No elenco destacam-se duas figuras icônicas dos anos de ouro do cinema mexicano, Joaquín Pardavé, habitualmente, como aqui, vivendo papéis de bufão de bom coração (El Ropavejero, Primero Soy Mexicano), independente da classe social a qual pertença e Fernando Soler, excelente ator que é utilizado de forma astutamente irônica em relação a sua persona tradicional por Buñuel em Susana (1951). Destaque para a habitual elegia a modernidade do México contemporâneo, com suas ruas, trânsito e edificações, presentes tanto ao início como aqui, ao longo (Corazon de Niño) ou ao final (Memorias de um Mexicano) de produções da época e que também será ironizada por Buñuel no prólogo de seu Os Esquecidos (1950).  Filmex. 129 minutos.


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