Filme do Dia: Munique (2005), Steven Spielberg
Munique (Munich, EUA/Canadá/França, 2005). Direção: Steven Spielberg. Rot. Adaptado: Eric
Roth & Tony Kushner, baseado no livro Vengeance:
The True Story of an Israeli Counter-Terrorist Team. Fotografia: Janusz
Kaminski. Música: John Williams. Montagem: Michael Kahn. Dir. de arte: Rick
Carter, Ino Bonnello, Andrew Menzies, David Swayze, János Szabolcs & Karen
Wakefield. Cenografia: John Bush. Figurinos: Joanna Johnston. Com: Eric Bana,
Daniel Craig, Ciáran Hinds, Matthieu Kassovitz, Hans Zinschler, Ayelet Zorer,
Geoffrey Rush, Michael Lonsdale, Lynn Cohen, Matthieu Amalric, Valeria Bruni
Tadeschi.
Avner (Bana), ex-guarda costas da primeira dama Golda Meir
(Cohen) é designado pelo alto escalão das lideranças político-militares
israelenses, na presença da primeira-ministra, a assumir um grupo de
contra-terroristas que irá revidar os 11 atletas massacrados nas Olimpíadas de
Munique, em 1972, liderados pelo lacônico Ephraim (Rush). Também fazem parte do
grupo o fazedor de bombas Robert (Kassovitz), o irascível, impulsivo e radical
Steve (Craig), o especialista em forjar documentos Hans (Zischler) e o
removedor de provas e líder do grupo, frio e mais ponderado Carl (Hinds).
Juntos eles conseguem eliminar 7 dos alvos, seguindo as pistas deixadas pelo
mercenário informante francês Louis (Amalric). Alguns deles pagam com suas
próprias vidas. Carl é morto pela atrente espiã holandesa Sylvie (Tedeschi).
Hans, grandemente pressionado pelas ações do grupo e aterrorizado com a
vingança cometida contra Sylbir, após sair para um passeio ao ar livre. Robert,
vítima de suas próprias engenhocas explosivas. Ainda que agora contando somente
com Avner e Steve, o grupo realiza sua última operação. Avner parte então para
os Estados Unidos ao encontro de Daphna (Zorer), sua mulher e da filha do
casal. Inseguro por se sentir vigiado, ele enfrenta boa parte do alto escalão
diplomático israelense para que o deixem em paz.
Primeiro filme “sério” do cineasta desde O Resgate do Soldado Ryan (1998),
Spielberg parece aqui se esquivar das acusações de maniqueísmo que acompanharam
sua produção dramática anterior. Nesse sentido, pode-se argumentar que o
retrato traçado da alta cúpula do poder israelense não se afasta muito das
atrocidades cometidas pelos grupos terroristas, já que permeados igualmente por
um senso de vingança e o grupo contra-terrorista progressivamente perde qualquer
escrúpulo em assassinar civis. Porém é bastante significativo que elementos na
narrativa não apontem para semelhante postura crítica em relação aos
israelenses. Não apenas se observa toda a ação sob a perspectiva do grupo
contraterrorista, assim como fortes mecanismos de identificação são criados com
o grupo, notadamente na figura de seu protagonista. Tampouco nenhum palestino
ganha alguma vitalidade dramática enquanto personagem ou é acompanhado em suas
ações e motivos de forma mais detida. Da mesma forma que os índios massacrados
pelos filmes de faroeste de décadas passadas, os palestinos são ruins de
pontaria. Para que a imagem do “herói” não seja maculada seja pelo jogo sujo
da política israelense que o transforma em seu fantoche, seja pelo terrorismo
insano palestino, cumpre frisar sua postura gradativamente autônoma e sua
ingenuidade inicial com relação a qual será sua missão. Enquanto mero cumpridor
de ordens de modo quase automático, Avner não será portanto atingido na sua
essência, podendo sofrer uma crise de consciência que o reabilite moralmente e
faça restituir seus valores morais e sua crença na família – já alertada por
sua mãe – em solo americano. No fundo, retorna-se a uma celebração tradicional
do típico herói liberal, manifestando sua autonomia diante da corrupção maior
que rege a sociedade seja quando decide se devotar à família ou quando enfrenta
galhardamente seus superiores. Tal imagem é selada em um cenário no qual do skyline nova-iorquino se enfatiza a
presença das torres gêmeas. O resultado final do filme nada fica a dever às
produções anteriores do cineasta, em que os motivos histórico-ideológicos
tratados se tornam servos dos clichês dos filmes de gênero, aqui notadamente do
filme de ação e de suspense. Sua tentativa de complexificação ao abandonar o
maniqueísmo incisivo esbarra nos limites impostos pelo filme de gênero dramático,
repleto de efeitos sensacionais melodramáticos ou através do suspense. Com
relação ao suspense é digna de nota sua arcaica utilização da montagem paralela
com a ida de uma criança que retorna ao apartamento no momento em que seu pai
embaixador será assassinado pelo grupo – ou da forma espetacularizante em que
os palestinos são mortos, dimensão ausente na morte dos membros do grupo de
israelenses que já são encontrados mortos ou do qual apenas se observa a
explosão mas nenhum cadáver ou sangue. A aparente maturidade com relação à
elipse que inicialmente prefere não descrever detalhadamente o massacre dos
atletas e as ações sanguinolentas que o precederam será desfeita bem mais
adiante quando, à guisa de representar os pesadelos de um protagonista agora atormentado,
acaba-se por expor tudo o que fora ocultado. Sem dúvida alguma, o pior momento
do filme é a seqüência que igualmente faz uso da montagem paralela para
retratar uma relação sexual em que Avner procura descarregar na esposa a fúria
que sente do grupo de terroristas de Munique, no justo momento em que pensa no
massacre dos atletas israelenses. Dreamworks SKG/Universal Pictures/Amblin Ent./The
Kennedy-Marshall Co./Barry Mendel Prod./Alliance Atlantis
Communications/Flashback Prod./Peninsula Films para Universal. 164 minutos.
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