Filme do Dia: O Solar dos Dragonwyck (1946), Joseph L. Mankiewicz
O Solar dos Dragonwyck (Dragonwick,
EUA, 1946). Direção: Joseph L.Mankiewicz. Rot. Adaptado: J.L. Mankiewicz,
baseado no romance de Anya Seton. Fotografia: Arthur C. Miller. Música: Alfred
Newman. Montagem: Dorothy Spencer. Dir. de arte: J. Russell Spencer & Lyle
R. Wheeler. Cenografia: Paul S. Fox & Thomas Little. Figurinos:
René Hubert. Com: Gene Tierney, Vincent Price, Walter Huston, Glenn Langan,
Anne Revere, Spring Byington, Connie Marshall, Harry Morgan, Vivienne Osborne.
Na provinciana Connecticut de 1844, A jovem e
ingênua Miranda Wells (Tierney) vê a chance de fugir da estreita visão de mundo
de sua família de colonos pobres liderada pelo patriarca Ephraim (Huston) com o
convite de um primo rico que mora “do outro lado do Hudson”, Nicholas Van Ryn
(Price) para ser perceptora de sua filha, Katrine (Marshall). Van Ryn, que
parece interessado em Miranda, vê a chance de vir a casar com ela quando sua
mulher, Johanna (Osborne) falece misteriosamente. O casamento rapidamente se
transforma em uma tortura para Miranda, que vê em breve tempo o seu doce
cavalheiro se transformar num rude e cruel viciado em drogas, que a rejeita de
vez com a morte do filho de ambos no parto.
Esse filme compartilha de praticamente todos os
cacoetes do romance gótico e de sua versão cinematográfica mais célebre e
influente, Rebecca (1940), de
Hitchcock. Nesse sentido, há desde uma sombria mansão vitoriana passando por um
quarto misterioso, uma pintura evocativa de algum mistério e uma mulher de uma
estirpe social bem mais acanhada tendo seu tratamento de choque diante de um
mundo de valores morais e sociais bem distintos, entre muitos outros motivos.
Desde muito cedo no filme fica patente que os valores morais que o narrador
compartilha são os que se associam a democracia americana contra as espúrias
tradições remanescentes do velho mundo representadas pela família de Van Ryn.
Embora isso já tenha ficado evidente na postura de Van Ryn como um esnobe
pomposo e afetado, ainda se faz questão de apresentar uma cena em que os
trabalhadores se rebelam contra a arrogância desse senhor feudal temporão e
outra na qual Miranda se recusa a ser tratada como Van Wells e afirma seu
orgulho diante de sua origem humilde mas de uma família que “possui a sua
própria terra”. Por outro lado Miranda não deixa de afirmar constantemente sua
crença em Deus, contra o ceticismo cínico de seu marido. Essa contraposição que
reafirma os valores da América Profunda tampouco deixa de estar plenamente
vinculada com os valores do romance gótico e aqui se torna uma das dimensões
subliminares mais importantes, algo que não chega a ser explorado mais
explicitamente pelo filme de Hitchcock e o romance que o gerou. É curiosa como
a “personificação do mal” vivida por Prince (cuja fama de vilão se tornará sua
marca registrada a partir das adaptações de Poe efetivadas por Roger Corman na
década de 1960) se deve tanto a reelaboração dramática do vilão medieval que é
herdeira de sua tradição literária quanto de uma alusão aos movimentos
totalitários na Europa contemporânea à produção do filme. Assim, Van Ryn gosta
de demonstrar seu desprezo pela deficiente física que é empregada por Miranda,
numa nada sutil alusão ao elitismo racial e físico que impregnava a estética
fascista professada por Hitler. Primorosa direção de arte e fotografia. Tierney e Price também se encontram no elenco do clássico noir Laura. 20th
Century-Fox. 103 minutos.
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