Filme do Dia: Apaixonados (1949), Douglas Sirk



Apaixonados (Shockproof, EUA, 1949). Direção: Douglas Sirk. Rot. Adaptado: Samuel Fuller & Helen Deutsch. Fotografia: Charles Lawton Jr. Música: George Duning. Montagem: Gene Havlick. Dir. de arte: Carl Anderson. Cenografia: Louis Diage. Figurinos: Jean-Louis. Com: Cornell Wilde, Patricia Knight, John Baragrey, Esther Minciotti, Howard St. John, Russell Collins, Charles Bates, Argentina Brunetti.
       Marat (Wilde) é o agente responsável pela liberdade condicional de Jenny Marsh (Knight), que sofreu pena por assassinato, ao se encontrar apaixonada pelo rufião Harry Wesson (Baragrey). Embora se interesse fortemente por todos os seus casos, o envolvimento de Marat com Jenny é sem precedentes. Tentando mante-la longe da influência de Wesson, ele a leva a morar em sua própria casa, com sua velha mãe cega (Minciotti) e o irmão ainda criança Tommy (Bates).  Jenny se vê dividida entre as atenções recebidas por Marat e o sentimento de dívida para com Wesson. Quando sabe de tudo, e que Marat se encontra apaixonado por ela, Wesson afirma que isso servirá para os planos futuros dele. Porém, Jenny se encontra cada vez mais envolvida pelo afeto de Marat. Esse a faz casar-se secretamente com ele, burlando as regras da condicional,mas Wesson fica a par de tudo e tenta chantagear Marat, levando um tiro de Jenny. O casal passa a viver então como foragidos. Quando finalmente resolvem se entregar à polícia, Wesson afirma que o episódio no qual foi ferido foi acidental.
       Muitos são os elementos que trazem esse “falso noir” a berlinda do olhar de um espectador contemporâneo: as mudanças de traços da personalidade de Jenny, por exemplo, quase com a mesma facilidade com que troca a cor de seus cabelos ou a demonstração descabidamente generosa de um Wesson ao final, a selar um final feliz para aquilo que se encaminhava como sendo mais um final trágico embalado por um amour fou ao estilo de uma tradição que tem entre seus títulos mais célebres Mortalmente Perigosa (1950) e Bonnie & Clyde (1967). Porém, observado sob uma perspectiva menos friamente racional e mais próxima da lógica fabular, o filme cresce ao apresentar o perfil de alguém que representa a incorruptibilidade da justiça ser seduzido ao ponto de infringir a lei com menos escrúpulos que sua própria agenciada. Apresenta um perfil de mulher que mesmo inicialmente flertando com certa misoginia típica do noir, demonstra depois ser uma personalidade “frágil”. E o filme trabalha bem visualmente essa ambiguidade, não deixando nenhuma “brecha” de imagem onde se possa supor a sinceridade ou não de Jenny. Transpõe para um perfil auricular o que quase sempre é expresso visualmente, ou seja se observar secretamente determinada cena, quando Marat e seu assecla escuta o diálogo entre Jenny e a psiquiatra – confissões que Jenny efetua abertamente sabendo ser ouvida. O filme parece ser um meio termo entre o noir e aqueles que investem mais nos sentimentos envolvidos entre os personagens que caracterizam seus filmes mais lembrados, os melodramas da década seguinte. Um dos trunfos do filme é matizar o que parecia ser uma aderência irrestrita à moral social convencional personificada em Marat quando esse se depara com situações que lhe tiram da sua zona de conforto. A paixão do investigador por seu "objeto de investigação" é recorrente, incluindo clássicos como Laura (1944) e Um Corpo que Cai (1958). Cornel Wilde, distante de ser um grande ator dramático, torna-se-ia cineasta bissexto a partir de meados dos anos 50 (dirigindo, dentre outros, o relativamente conhecido A Prova do Leão). Columbia Pictures. 71 minutos.

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