Filme do Dia: Sebastiane (1976), Derek Jarman
Sebastiane
(Reino Unido, 1976). Direção: Derek Jarman & Paul Humfress. Rot. Original:
Derek Jarman, Paul Humfress & James Whaley. Fotografia: Peter Middleton.
Música: Brian Eno. Montagem: Paul Humfress. Com: Leonard Treviglio, Barney
James, Neil Kennedy, Richard Warwick, Donald Dunham, Daevid Finbar, Ken Hicks,
Lindsay Kemp.
No ano de 300 D.C, o romano Sebastiane (Treviglio) é exilado
em um remoto povoado habitado somente por homens. A inexistência de mulheres
faz com que muitos homens sucumbam ao desejo de seus pares. Um deles, o capitão
Severus (James), apaixona-se por Sebastiane. Como esse resiste aos seus
avanços, acaba sofrendo as torturas mais
cruéis em suas mãos. Compadecido com sua sorte, Justin (Warwick), torna-se cada
vez mais próximo de Sebastiane, escutando dele a confissão de que na verdade
ele ama seu carrasco, pois o acredita enviado por Deus para prová-lo. Defendendo
Sebastiane em várias situaçõe nem Justin, e nem mesmo Severus, consegue
reverter a ordem de que Sebastiane deve ser executado.
Menos importa a narrativa do que o talentoso estilo visual e
a aberta opção por temáticas de cunho homo-erótico – apresentadas aqui de modo
mais explicito do que em qualquer outro filme posterior – que se tornariam
marca registrada de Jarman. E, de certa forma, explicitando um
gênero, o épico, que já havia apresentado tal homo-erotismo de modo mais velado
em filmes como Ben-Hur (1959) ou Spartacus (1960).Sua precariedade
técnica e evidente baixo orçamento, assim como interpretações semi-amadoras,
locações pitorescas e gosto pelos tableaux
evocativos de pinturas, para não falar da recorrente nudez, sugere uma
aproximação com Pasolini, ainda que seu grotesco início e a recorrente
escatologia nos gestos despudorados de seus romanos também sugiram uma
aproximação com o Satyricon (1967),
de Fellini (sendo a peça mencionada a determinado momento). A explicitação do
teor sado-masoquista que impregna a mística cristã ganha contornos em um
ambiente que remete tanto a misoginia medieval ou antiga quanto a ambientes
exclusivamente masculinos contemporâneos
como o exército ou a sauna, ambos por sinal evocados pela própria
narrativa. Em certos momentos o uso da câmera lenta, que recentemente havia
ganho destaque na apresentação de novos parâmetros de violência pelo cinema
norte-americano em filmes como Bonnie & Clyde ou os de Sam Peckinpah, aqui serve para apresentar uma longa
seqüência de carícias entre dois soldados no banho que trafega entre o poético
e o soft porn, dada a insistência
voyeurística com que se detém nos corpos nus, presente em vários outros
momentos do filme. Até então, certamente se configura como a talvez mais ousada
produção a ganhar relativa distribuição apresentando de modo tão explícito
contatos homossexuais. Trata-se do único filme inglês com legendas em inglês, já
que é originalmente falado em latim, que mesmo buscando certa verossimilhança,
tampouco deixa de soar empostado, quando pronunciado na boca de atores
anglo-saxões com seu estilo visual perigosamente próximo do momento da produção
do próprio filme. Destaque para a bela cena,
na qual tal e qual Narciso, Sebastiane mira sua própria imagem no lago,
e a imagem mescla, como numa sobreposição, o céu, uma pedra e sua sombra, sendo
a dimensão física secundarizada e perdendo força diante da espiritual. Assim como para o forte azul que impregna os
créditos iniciais desse seu primeiro longa-metragem e que serão exatamente
a única matéria-prima visual de seu
filme-testamento, Blue (1993).
Cinegate/DiscTac/Megavision. 90 minutos.
Veja aqui: https://archive.org/details/Sebastiane
ResponderExcluirObrigado, Francismar!
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