Filme do Dia: Rebelião (1967), Masaki Kobayashi
Rebelião
(Jôi-uchi: Hairô Tsuma Shimatsu,
Japão, 1967). Direção: Masaki Kobayashi. Rot. Adaptado: Shinobu Hashimoto,
baseado no romance Hairyozuma Shimatsu,
de Yasuhiko Takigushi. Fotografia: Kazuo Yamada. Música: Tôru Takemitsu.
Montagem: Hisashi Sagara. Dir. de arte: Yoshirô Muraki. Com: Toshirô Mifune,
Yôko Tsukasa, Takeshi Katô, Tatsuyoshi Ehara, Etsuko Ichihara, Isao Yagamata,
Tatsuya Nakadai, Tatsuo Matsumura.
Século XVII. Ichi
(Tsukasa) teve uma filha com um senhor feudal, porém quando voltou do
seu descanso percebe que o senhor feudal se encontrava com outra mulher,
agredindo a ambos. Como punição foi designada para viver na casa de Isaburo
Sasahara (Mifune), sendo acolhida por seu filho, Yogoro (Katô), de quem passa a
ser esposa. Apesar das reclamações da mãe de Yoguro, a vida se desenrola de
modo tranqüilo até que a morte de um dos filhos do senhor feudal provoca uma
situação crescente de tensão. Por conta de não possuir outros herdeiros, o
Senhor Masakata (Matsumura) ordena que Ichi retorne ao palácio com a filha, o
que provoca a ira do casal e de Isaburo, temido pela sua perícia com a espada.
Mesmo com todas as negociações, um conflito violento ocorre, após Ichi,
pressionada a tomar uma decisão entre voltar ou não ao castelo, sob pena de
assinar a própria sentença de morte do marido e de sua família, optar por uma saída inesperada.
Kobayashi, mesmo longe de ter tido o mesmo reconhecimento e
popularidade de seu contemporâneo Kurosawa, com quem também compartilhava o
apreço pela representação de dramas históricos envolvendo um Japão feudal de
rígida hierarquia, talvez consiga ser mais contundente e crítico e menos
espetacularizante em suas abordagens da época que o mesmo. Vai nesse sentido ao
menos o modo relativamente distanciado com que
representa seu drama, grandemente apoiado por uma montagem seca e uma
trilha musical de instrumentação japonesa no qual os acordes espaçados
praticamente se detém a comentar alguns momentos de maior tensão. Há uma
evidente simpatia de Kobayashi pelos personagens que descreve e se seu teor
anti-institucional parece refletir igualmente o próprio momento no qual foi
produzido, tal hipótese pode ser contrastada com o fato de também se encontrar
em seu filme mais conhecido, Harakiri
(1962) ou na obra anterior de Mizoguchi. Mais dramaticamente rigoroso que seu
filme anterior, Kobayashi faz um uso aqui ainda mais intenso de elementos
associados a um cinema moderno, porém chamando pouca atenção
para si (a exceção talvez das breves fotos fixas na seqüência da revolta de
Ichi contra o senhor feudal e sua nova mulher). Dentre as opções estilísticas
selecionadas por Kobayashi que, mesmo com a forte presença de uma montagem de
corte seco tampouco exclui um uso intenso dos movimentos de câmera, somente uma
parece não se agregar de modo mais orgânico e era uma coqueluche quase
inevitável do período em todas as cinematografias e estilos: o zoom. Como em Harakiri
não existe resistência que consiga driblar a opressão de uma apropriação de
determinada tradição que é apresentada como vil e falsa – se no filme anterior
os códigos de ética vinculados ao ritual que dá nome ao filme já foram
devidamente suavizados para soarem tão autênticos quanto retratados
habitualmente pelo próprio cinema, aqui as tentativas de acordo entre o senhor
feudal e seu servo rebelde também apontam para um poder vacilante e não de todo
confiante em sua superioridade e que acabam ferindo os princípios éticos dos
que se encontram certos de seus princípios morais. O cinema de Kobayashi, algo
típico da cinematografia autoral de seu período em distintos locais, pretende
certamente ser um meio privilegiado que desvela o que havia sido escamoteado
por conta da lógica do espetáculo de um cinema de maior apelo comercial, fazendo justamente o papel de testemunha da
história pela perspectiva dos marginalizados, algo que Isaburo não poderia almejar de sua neta, ainda recém-nascida.
Prêmio FIPRESCI em Veneza. Toho. 128 minutos.
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