Filme do Dia: Os Dois Mundos de Charly (1968), Ralph Nelson
Os Dois Mundos de Charly (Charly, EUA, 1968). Direção: Ralph Nelson. Rot. Adaptado: Stirling
Silliphant, a partir da peça Flowers for
Algernon. Fotografia: Arthur J. Ornitz. Música: Ravi Shankar. Montagem:
Fredric Steinkamp. Dir. de arte: John DeCuir&Charles Rosen. Figurinos:
Hazel Roy. Com: Cliff Robertson, Claire Bloom, Lilia Skala, Leon Janney, Ruth
White, Dick Van Patten, Edward McNally, Barney Martin.
Charly Gordon (Robertson), possui uma
deficiência mental que o transforma em vítima das pilhérias de seus colegas de
trabalho em uma panificadora. Sua educadora, Alice (Bloom), torna-se bastante
interessada em seu caso e acredita que ele possa ser utilizado nas experiências
que os cientistas, Dra. Anna Straus (Skala) e Dr. Nemur (Janney), a partir dos
primeiros resultados da ativação cerebral provocada em ratos de laboratório.
Charly se submete a cirurgia e desenvolve uma capacidade cerebral bastante
avançada e também se envolve emocionalmente com Alice. Porém, em pouco tempo, a
reação nos ratos foi fatídica, sendo que previamente a capacidade cerebral
havia retornado ao que era antes da cirurgia. É o que Charly tem certeza que
voltará a ocorrer com ele.
Esse filme de Nelson mescla, de certa forma,
duas tradições do cinema norte-americano. De um lado, o drama liberal
progressista, representado sobretudo pela personagem de Bloom, a faceta humana
e simpática em contraposição ao frio cientificismo do par de pesquisadores e,
de outro, mais fortemente, o drama de um personagem com problemas que o
transformam em algo à parte em relação ao grupo social com o qual convive –
representado com os maneirismos habituais desse gênero; quem o achar demasiado
exagerado, perceberá que não é muito distinto do apresentado por Dustin Hoffman
em Rain Man, décadas após, sendo que
não muito espantosamente ambos foram premiados com o Oscar de melhor ator. No
último caso, o filme se distingue daqueles produzidos em meados dos anos 40 em
Hollywood, por uma aproximação com uma abordagem neurológica e não
psicanalítica, ainda que o filme, em si, soe bem mais decepcionantemente
convencional do que aqueles, onde seus “perturbados” personagens serviam como
pretexto para inovações e excentricidades também no plano narrativo. Aqui, com
exceção de um breve flerte com a cultura psicodélica da época, na qual se
imprime uma certa ambiguidade no momento da “reviravolta mental” de seu
protagonista, como se não passasse de uma fantasia tresloucada do mesmo, dado a
rapidez e a intensidade com que tudo acontece, move-se em terreno bem mais
convencional e próximo de um modelo instaurado na década anterior. Seu final,
infeliz e cíclico, apresentando as imagens observadas nos créditos iniciais,
pode ser considerado como diferencial em relação à tradição anterior, mas acaba
soando quase como um detalhe diante do conjunto apresentado. Destaque para as
cenas pretensamente dramáticas, mas que provocam um humor quase involuntário,
nos quais Charly se vê às voltas de retornar ao que sempre fora, observando sua
própria imagem de deficiente mental assomando em todos os lugares que vai.
Shankar, compositor bissexto para o cinema, compõe a trilha. ABC
Pictures/Robertson & Associates/Selmur Prod. para Cinerama Releasing Corp.
103 minutos.
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