Filme do Dia: Eros (2024), Rachel Daisy Ellis

 


Eros (Brasil, 2024). Direção Rachel Daisy Ellis. Montagem Matheus Farias.

Ao início a diretora,  afirma ter feito uso do motel para sexo com um novo parceiro e ter ficado esperando por ele,  enquanto isso imaginando quem seriam as pessoas de quem ouve gemidos e murmúrios abafados nos quartos vizinhos. Porém, espertamente não se põe no mesmo nível de exibição ao que os outros se doam, em maior ou menor grau, diante da câmera. Seja em termos de exposição dos corpos, ou dos sentimentos, ou de ambos – os dois últimos “personagens” trazem um nível maior de entrega emocional que os restantes; apenas como uma espécie de "carta de intenções" do que a teria induzido a realizar o documentário. Quanto à dimensão do sexo, o distanciamento entre o que se está sentindo ao praticá-lo ou se visualizá-lo é quase tão problemática quanto, por vezes, a fala de entrega emocional em determinados momentos filmados – como o de Jane Fonda diante do túmulo de sua mãe em Jane Fonda em Cinco Atos. E o documentário pretende ser uma tentativa de se fazer presente, neste universo fechado da sexualidade – que poderia também ser um clube de swing, uma sauna gay ou um cinema pornô – na tentativa de desvela-lo. O que se torna uma balela em mais de um sentido. Sim, pode estar fazendo uso de certo sensacionalismo em relação a este trespassar um “mural” que pretende ser privativo, embora o deleite com a exposição do eu contemporânea, o direcione em sentido oposto. E, igualmente, o fato das pessoas estarem se filmando a si próprias (em um dispositivo similar ao realizado por Gabriel Mascaro em Doméstica) para terceiros assistirem já intrinsecamente transforma o que seria sua experiência sem a presença-pacto deste dispositivo. Há uma recorrência talvez surpreendente (ou não) de menções à religiosidade, seja como engrenagem à própria fantasia, caso da “confissão” sacana a um "padre", tema presente desde o início do erotismo explícito no cinema, como demonstra filmes pornográficos franceses da década de 1920. Ou ainda no casal que se auto identifica não apenas enquanto “crente”, mas que automaticamente “santifica” os locais nos quais se encontram, simplesmente por estarem lá presentes. Ou o casal gay, do qual um dos dois decide falar sobre o quão luminoso Jesus é, ao contrário do cristianismo. As mulheres costumam ser bem mais comunicativas e desembaraçadas que os homens. E as posturas que cada um tem diante do dispositivo são bastante distintas. Alguns apresentam de forma mais explícitas os atos sexuais praticados, outros não. Em alguns, como na fantasia da “confissão” se parece direcionar praticamente toda a ação para a câmera, inclusive se comentando o que não deveria ter sido filmado – e que, ao menos parcialmente, sobreviveu na fatura final do documentário. Em outros a explicitação da consciência de estarem sendo filmados se dilui em parte aprontado o mecanismo de filmagem com celular. Ou se torna o foco maior de uma fala sobre si, como no caso do último personagem, a ir sozinho ao motel, e exclamar, a determinado momento, entre poemas e divagações sobre o amor, se se masturbará até o final da vida. |Desvia Prod. 108 minutos.

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