O Dicionário Biográfico de Cinema#290: Ann Sothern

 


Ann Sothern (Harriette Lake) (1909-2001), n. Valley City, North Dakota

Diversos meses após o lançamento de Trade Winds [Os Segredos de um D. Juan], de Tay Garnett, ele nos conta em suas memórias: 

Eu estava trabalhando na minha mesa, quando um borrão loiro irrompeu pela porta aberta, surfou pelo meu escritório e pousou no meu colo, nos derrubando no chão. Estava com os braços repletos de uma garota gloriosa, mas ela estava rindo, o que me deixou nervoso. "Que diabos está acontecendo?" Beijo na testa. Beijo na bochecha. Beijo no queixo. "Oh Tay, você nunca adivinhará! Você conseguiu desta vez - realmente conseguiu. A MGM roubou seu personagem de Jeanie de Os Segredos de D. Juan e irão fazer uma série para MIM. Vão chamá-la de Maizie", riu Miss Sothern.

Quando se assiste a Os Segredos de D. Juan hoje, saber-se-á o porque. O ponto principal do filme parecem ser os planos de combinação de imagens feitas em laboratório, todos realizados por Garnett e seus amigos, quando vagavam pelo Extremo Oriente em seu barco, o Athene. Este filme amalucado começa como noir, desvia-se para o drama romântico e flerta com a "comédia maluca". Fredric March é pálido e irritante enquanto herói, Joan Bennett possui um momento decisório, quando as exigências destrambelhadas do enredo exigem que mude seu cabelo do louro de toda uma vida para preto - a aparência que carregará durante todo o seu glorioso período noir; Ralph Bellamy como um tira desajeitado é insuportável; e Sothern, como a secretária de March, rouba o espetáculo, desfilando para cima e para baixo, mascando chiclete, fazendo piadas inteligentes e deixando seu coração de ouro brilhar através de sua aparência durona. Não é de se admirar que a MGM a tenha escolhido. 

Houveram dez filmes da Meisie (não Meizie), incluindo o próprio Meisie [Teimosa e Bonita] (1939), Congo Maisie [Mmle. Maisie] e Gold Rush Maisie [Peripécias de Maisie] (1940), Maisie was a Lady [Maisie na Alta Roda] e Ringside Maisie [Perigo Louro], Maisie Gets Her Man [Amor à Segunda Vista], Swing Shift Maisie [Sabotadora Romântica] (43), Maisie Goes to Reno [Por Conta de Cupido] (1944), Up Goes Maisie [Por Fim Mulher] - seu slogan era "É Maisie voando...lutando...apaixonando-se - por um rapaz. Você vai ter um helicóptero de cada vez" - e fechando, por fim, com Undercover Maisie [A Loura Detetive]. Sothern, como Maisie, teve nove diferentes galãs (George foi voluntariamente duas vezes), incluindo Robert Young no original, Lew Ayres, Lee Bowman (pobre Maisie), e Red Skelton. As Maisies foram provavelmente, após os Andy Hardys, a série B mais bem sucedida de sua época, portanto foi certamente um triunfo para Ann Sothern, mas igualmente um fardo: ela foi Maisie, então como poderia ser algo mais?

Sothern tinha subido na vida, trilhando o caminho de Betty Grable/Lucille Ball - coristas e pontas nos musicais dos idos dos anos 30 - até que em 1934 foi a primeira creditada, a frente de Ethel Merman, em Kid Millions [Abafando a Banca] (Roy del Ruth), um dos veículos de Goldwyn para Eddie Cantor. Mas foi somnte uma convencional comediante romântica dos anos 30, presa em um romance com George Murphy (este foi seu primeiro filme) e, em um número musical, numa saia de aro maior que a Austrália. Pelo punhado de anos seguintes ela foi a segunda corda para Joan Blondell - a mesma adorável face ovalada, o mesmo charme atrevido, não apenas enquanto pessoa. Quando Blondell foi indagada por John Kobal, anos depois, o que a trazia de volta às telas, ela sorriu e disse: "Meus amigos me contaram que Ann Sothern tem esquecido de como fazer eu". Sothern foi a rainha dos filmes-B e dos programadores; se necessitar de provas, ela o emprestou a Gene Raymond uma meia-dúzia de vezes como sua co-estrela - e ela sequer gostava dele. Então veio Os Segredos de D. Juan.

Finalmente teve acesso a material de mais classe: o musical Lady Be Good [Se Você Fosse Sincera] (41, Norman Z. McLeod, no qual substitui Eleanor Powell; Panama Hattie [Lourinha do Panamá] (42, McLeod); uma enfermeira em Bataan em Cry Havoc [Aurora Sangrenta] (43, Richard Thorpe) - ironicamente, elencada acima de Blondell, ainda que abaixo de Margaret Sullavan; o melhor de todos foi Letter to Three Wives [Quem é o Infiel?] (49), do vencedor do Oscar Joe Mankiewicz, onde mais do que se destaca em comparação a Linda Darnell e Jeanne Crain. A partir daí foi ladeira abaixo, apesar de papeis interessantes em Blue Gardenia [A Gardênia Azul] (53, Fritz Lang) e The Best Man [Vassalos da Ambição] (Franklin J. Schaffner) e Lady in a Cage [A Dama Enjaulada] (Walter Grauman), ambos em 1964. Umas poucas aparições dispersas findaram em 1980, um hiato de mais de meia dúzia de anos, e então um incrível retorno: indicada como melhor atriz coadjuvante para Bette Davis e Lilian Gish em The Whales of August [Baleias de Agosto] (Lindsay Anderson). E que grand finale - e na companhia de quem - para Congo Maisie!

Texto: Thomson, David. The New Biographical Dictionary of Film. N. York: Alfred A. Knopf, 2014, pp. 2497-99. 

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