Filme do Dia: Jurado Nº2 (2024), Clint Eastwood
Jurado Nº 2 (Juror#2, EUA,
2024). Direção Clint Eastwood. Rot. Original Jonathan A. Abrahms. Fotografia
Yves Bélanger. Música Mark Mancina. Montagem David S. Cox & Joel Cox. Dir.
De arte Ronald R. Reiss & Gregory G. Sandoval. Cenografia Christopher
Carlson & Kristie Suffield. Maquiagem e Cabelos Kimberley Felix &
Patricia Dehaney. Com Nicholas Hoult, Toni Collette, Chris Messina, Gabriel
Basso, J.K. Simmons, Amy Aquino, Cedric Yarbrough, Francesca Eastwood, Chikako
Fukuyuma.
Grupo de
jurados se depara com o que parece ser um típico caso de feminicídio. Jovem
casal briga em um bar, briga esta testemunhada por muita gente que lá se
encontrava. No meio da discussão, a garota, Kendall Carter (Eastwood), abandona
o rapaz, James Michael Sythe (Basso) que após quebrar uma garrafa no balcão,
troca sopapos com ela. A promotora, conhecida defensora de casos semelhantes,
Faith Killebrew (Collette) não tem dúvidas a respeito do assassinato passional
ter ocorrido após uma perseguição posterior. O acusado, no entanto, nega
veementemente, assim como seu advogado, Eric Resnick (Messina). E quando o júri
já se encontra disposto a condenar Sythe, uma tímida voz se indispõe contra o
propósito geral. Que vem a ser a de Justin Kemp (Hoult), um dos jurados, que já
sabe de antemão a possibilidade enorme de ter sido ele próprio o autor da
morte, pois bebera, rompendo com um período de anos a seguir as prédicas do AA,
e tendo trombado com o que imaginara ser um veado. A partir das primeiras
dúvidas, um policial aposentado, Harold (Simmons), consegue levantar uma lista
de carros que passaram por algum tipo de acidente naquele dia, já que a tese
levantada por outra jurada, Keiko (Fukuyuma), é das lesões observadas no corpo
da vítima poderem ter ocorrido por conta de um impacto com veículo em
velocidade. As investigações independentes de Harold esbarram no deslize
proposital de Justin, ao deixar cair os papeis para que a policial os
denunciasse à juíza (Aquino).
Trata-se
de mais um filme sobre bastidores de um tribunal e o dito cujo, e neste aspecto
retornando à motivos tanto da literatura estadunidense (os interesses políticos
envolvidos na promotora, como em A Tragédia Americana, de Dreiser)
quanto do cinema (o nível de arbitrariedade e falta de compromisso de muitos
dos jurados, assim como o primeiro a discordar do consenso remontando ao
clássico 12 Homens e uma Sentença). Há um elemento díspar, peça
intricada a complexificar a situação básica, para além da definição do veredito
proposta a nós espectadores e apenas um dos personagens, o jurado a
protagonizar o filme, o sabe. Na verdade, ele e o seu advogado-conselheiro.
Envolvente e bem realizado ao que se propõe, e com um protagonista a nos criar
suspense e empatia, embora haja boas chances dele ser culpado (tal como
efetivara a adaptação cinematográfica do livro de Dreiser décadas após, com Um Lugar ao Sol), e também encarnado por um jovem e belo como Clift nos dias
do filme de Stevens. Em alguns momentos, cai em um didatismo meio tosco, como
quando o Justin de Hoult faz com que um dos jurados se projete não apenas sobre
a vítima, enquanto possível filha mas de uma acusação injusta contra um
possível filho. Outra investida talvez não muito verossímil seja a da promotora
começar a investigar ela mesma após ter sido alertada da possibilidade de
equívoco de sua posição. E tão ou mais que isso, de Harold não ter desconfiado
de Justin após ter observado que ele o seguiu e, depois, que seu carro era um
dos possíveis suspeitos. Porém, nada disso soaria completamente estranho à
tradição deste gênero de filmes, e não deixa de ser impressionante ter sido
dirigido por um Eastwood já nonagenário. Pensado em termos estritamente
ideológicos não se poderia ser igualmente mais elusivo quanto a maior parte do
cinema estadunidense mainstream de qualquer época; ao mesmo tempo a
apontar para a irresponsabilidade de julgamentos precipitados a partir de
vieses como o de gênero mas, por outro lado, colocando como vítima um sujeito
de traços machistas em um caso ao qual poderia ser facilmente enquadrado como
um feminicídio, inclusive por conta dos antecedentes do personagem. Porém, nos
ficamos a indagar, a partir de determinado momento menos sobre isso, e sim se
aparecerá algo a dirimir a hipótese do criminoso ser o próprio jurado a
inicialmente por em dúvida a alegação do acusado ser de fato o assassino. Seu
último plano é a confirmação de um pressentimento de que sua saída não poderia
ser tão anti-canônica em relação à justiça estadunidense. E tão pouco catártica
em seu mal-estar. Ainda mais quando havíamos observado a promotora, figura
aliás muito mais proba que seu equivalente literário dreiseriano de um século
atrás, fitar com vontade em um momento no tribunal a frase arquetípica da república
americana: in God we trust. O cinema americano, como alguém já escreveu
alhures, é menos sobre pessoas ou lugares de fato, que sobre ideias sobre
pessoas e lugares. |Dichotomy Films/Gotham Group/Malpaso Prod. Para Warner
Bros. 104 minutos.![]()

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