Dicionário Histórico de Cinema Sul-Americano#124: Valéria Sarmiento
SARMIENTO, VALÉRIA. (Chile 1948). Mais conhecida como esposa (agora viúva) de Raúl Ruiz e montadora de mais de 30 de seus filmes, Valéria Sarmiento é uma destacada diretora feminista ela própria. Nascida em Valparaíso, estudou filosofia e cinema na Universidad de Chile nos anos 60. Seu primeiro trabalho foi como assistente de produção em ¡Que Hacer!, co-dirigido por Saul Landau, Nina Serrano e Ruiz. Dirigiu seu primeiro curta documental sobre uma artista de striptease, Un Sueño como de Colores, em 1972, e no mesmo ano montou e co-dirigiu dois outros curtas, Poesía Popular: la Teoría y la Práctica e Los Minuteros, com Ruiz. Após o golpe do general Pinochet, partiu para a França com Ruiz, onde permaneceu a maior parte do seu tempo, até recentemente.
Nos primeiros anos do exílio, Sarmiento montou filmes para seu marido, assim como para Luc Moullet e Robert Kramer, e chegou a atuar em um dos curtas de Ruiz, Colloque de Chiens (Colóquio de Cães, 1977). Em 1979, ela dirigiu seu primeiro filme europeu, Gens de Nulle Part, Gens de Toutes Parts, na Bélgica, depois do que embarcou em uma série de importantes projetos de longas feministas. El Hombre Cuando es Hombre (1982), uma co-produção franco-alemã ocidental, foi na realidade filmado na Costa Rica. Neste documentário, Sarmiento entrevistou uma série de pessoas, em sua investigação do machismo, tentando descobrir porque as tradições culturais (por exemplo, a música mexicana), continuam a promover a dominação das mulheres pelos homens nas sociedades latino-americanas contemporâenas. Este foi seguido por um longa ficcional, Notre Mariage (França/Portugal, 1984), baseado em um romance de um escritor hispânico bastante popular de novellas rosas, Corín Tellado. Sarmiento, que co-escreveu o roteiro com Ruiz, interpreta o material melodramático diretamente, sem ironias, esperando que o público, como o de um filme dirigido por Luis Buñuel ou Douglas Sirk, compreenda as intenções irônicas do diretor - neste caso, expor os desejos incestuosos de figuras patriarcais latinas. Notre Mariage conquistou o prêmio de melhor direção no Festival de San Sebastián.
Para seu próximo longa ficcional, Amélia Lópes O'Neill (1990), outra co-produção francesa, desta vez com a Suíça, Espanha e Chile, Sarmiento retornou a filmar em sua cidade natal, Valparaíso. Um trabalho bastante próximo do realismo mágico, Amelia Lópes O'Neill conta a história de duas irmãs, Amelia (Laura del Sol) e a enferma Anna (Laura Benson), apaixonadas pelo mesmo homem, Fernando (Franco Nero). A história é recontada por um elegante malandro, Igor (Sergio Hernández), que roda numa bicicleta sem usar as mãos, ao início do filme, enquanto a câmera o enquadra e o segue de um modo a tornar seus movimentos ainda mais mágicos ou surreais. A casa da família é de um azul vivo, e o cenário da antiga e labiríntica cidade portuária de Valparaiso se combina com ela, para aumentar a sensação de fantasia. Mais uma vez Sarmiento apresenta um personagem masculino dominador e decepcionante, Fernando, contra quem a personagem principal feminina luta sem sucesso. Apesar de não ter ganho nenhum prêmio, Amélia Lópes O'Neill competiu pelo Urso de Ouro no Festival de Berlim de 1991.
Baseada sobretudo na França, Valéria Sarmiento continua a ser uma realizadora bastante internacional, com um interesse específico em mulheres latinas. Em 1992, realizou um documentário para o Channel 4 britânico, Latin Women Beat in California, e filmou outro documentário televisivo, para as tvs francesa e alemã ocidental, em Cuba, El Planeta de los Niños. Depois deste trabalho seguiu para a Bulgária, para dirigir Elle (1995), baseado em uma novela de Mercedes Pinto, na verdade uma refilmagem do filme mexicano de Buñuel El. Agora estava dirigindo filmes regularmente. Le Inconnu de Strasburg [O Desconhecido de Estrasburgo] (França, 1998) foi incluído na competição do Festival Mundial de Cinema de Montreal, e Rose la China (França, 2002) estreou em Veneza. Secretos (2008) marca o retorno completo ao seu país. Escrito por Ruiz e baseado no próprio conceito de Sarmiento, este filme digital ataca comicamente a estigmatização de chilenos exilados como eles. Tendo um recorde de 22 longas lançados em 2008 no Chile, estreou em outubro e depois exibido no BAFICI em Buenos Aires, em março de 2009. Desde então, ela montou os três longas finais de Ruiz e dirigiu uma série de TV chilena em 2010, assim como uma minissérie em 2012 e um longa português, co-produzido com a França, Linhas de Wellington (2012), que estreou no Festival de Veneza, e foi exibido nos prestigiados festivais de Toronto, Nova York e Londres.
Rist, Peter H. Historical Dictionary of South American Film. Plymouth: Rowman & Littlefield, 2014, pp. 513-15.
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