Filme do Dia: Os Ladrões (1971), Henri Verneuil

 


Os Ladrões (Le Casse/França/Itália, 1971). Direção: Henri Verneuil. Rot. Adaptado: Henri Verneuil & Vahé Katch, a partir do romance The Burglar de David Goodis. Fotografia: Claude Renoir. Música: Ennio Morricone. Montagem: Pierre Gillette. Dir. de arte: Jacques Saulnier. Cenografia: Charles Merangel. Figurinos: Hélène Nourry. Com: Jean-Paul Belmondo, Omar Shariff, Dyan Cannon, Robert Hossein, Nicole Calfan, Myrian Colombi, Raoul Delfosse, Renato Salvatori.

Um grupo, após assaltar a mansão de um milionário, tenta escapar das mãos de um policial grandemente corrupto, Abel Zacharia (Shariff). O líder do bando é o charmoso Azad (Belmondo).

É curioso equipará-lo à adaptação francófila mais famosa de um texto de David Goodis, Atirem no Pianista, de Truffaut, quase como uma forma de distinguir, em termos praticamente didáticos, o que diferencia uma adaptação por um cinema de viés mais convencional-comercial, de outro, de pretensões estilísticas-autorais bem demarcadas. Aqui, é a ação física que domina, seja em termos da meticulosidade com que descrita a forma “científica” com que o bando faz o uso para conseguir abrir um cofre logo ao início, seja em termos das habituais perseguições motorizadas, na esteira evidentemente do sucesso estrondoso de Bullit alguns anos antes. Boa parte de sua metragem se traduz em acompanharmos tal perseguição em meio aos equipamentos urbanos e fazendo uso, inclusive, que foge à rotina, como é o caso dos carros descendo uma escadaria exclusiva para pedestres ou tomando as faixas de sentido contrário, no que mais parece ser uma prova de stock car.  O único sentido aqui buscado é o da adrenalina. Diálogos são supérfluos, lembrando que os primeiros surgem já quase dez minutos após iniciado o filme. Em meio a perseguição, que por sinal não possui qualquer sentido que transcenda a mera trama, tal qual o emprestado por filmes como Encurralado, de Spielberg ou Comboio, de Sam Peckinpah, existe uma cena que mais parece um meta-comentário com relação a disposição do filme sobre o cinema enquanto pretensão artística. Ele simplesmente rouba a cena de uma apresentação tradicional de dança, com todo o público preferindo em massa correr para acompanhar a perseguição, algo que, se levada em conta a dimensão acima apontada, inclui o que seria a escolha do público – ao invés de assistir passivamente a um aborrecido ritual, vibrar e interagir com um universo de sensações imediatas. Ou ainda momentos de respiro pretensamente humorístico, como quando a dupla acaba fazendo dispersar um grupo que participa de um funeral.  E mescla as possibilidades de tornar a sequencia de perseguição mais “atrativas” ao espectador, fazendo uso de câmeras coladas próxima ao pneu dos carros com imperativos que já haviam caído em desuso a muito no cinema norte-americano, como as sequencias internas nos carros, que fazem uso notório de projeção de fundo. Em termos de gênero o filme é tipicamente produto dirigido para espectadores masculinos. O protagonista-bandido, é também um admirador de mulheres que parecem não existir para além de sua fantasia erótica, numa dimensão que mais parece uma paródia que sai pela culatra do Lola (1960), de Demy. E nos jogos de rivalidade entre Belmondo e Shariff, cada qual o mais canastrão, é o primeiro evidentemente, que parece ter uma moral mais digna, não agindo como covarde. O trágico final do último é reminiscente de O Preço do Trigo (1909), de Griffith, com a ganância sendo motivo para o soterramento em grãos, lá um motivo automaticamente colado na moralidade da história, aqui um recurso visual conveniente. Na verdade, os grandes heróis do filme deveriam ser os dublês. Eles fazem um pouco de tudo. Filmado em francês e inglês com a mesma equipe, afirma-se ter sido o filme de recorde de estreia nas bilheterias francesas. A obra de Goodis já havia se prestado a uma adaptação norte-americana em 1957 com a presença de Jayne Mansfield no elenco. Dentre as sequencias mais impressionantes encontram-se as da agilidade do herói por entre o tráfego da cidade, inclusive subindo em ônibus em movimento com bem maior risco que em cenas semelhantes nos filmes de Hitchcock (e aparentemente efetivadas, salvo engano, pelo próprio Belmondo) e uma queda espetacular de uma colina juntamente com as pedras despejadas pela carroceria de um caminhão. Columbia Films/Vides Cinematografica para Columbia Films. 120 minutos.

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