Filme do Dia: Dos Tipos de Cuidado (1953), Ismael Rodríguez

 


Dos Tipos de Cuidado (México, 1953). Direção Ismael Rodríguez. Rot. Original Ismael Rodríguez & Carlos Orellana. Fotografia Ignacio Torres. Música Manuel Esperón. Montagem Gloria Schoemann. Dir. de arte José Rodríguez Granada. Com Jorge Negrete, Pedro Infante, Carmelita González, Yolanda Varela, Carlos Orellana, José Elías Moreno, Queta Lavat, Arturo Soto Rangel, Mìmi Derba.

A amizade que parece inseparável entre Jorge (Negrete) e Pedro (Infante) se rompe quando Pedro decide noivar com a amada de Jorge, Rosario (González), prima dele, e não se casar com a irmã de Jorge, María (Varela). O ressentimento provocado em Jorge é tão forte que, após um ano, quando fica sabendo de tudo,  imiscui-se nos negócios de Pedro, arruinando-os, além de humilhá-lo em público e projeta se casar com Genoveva (Lavat), filha de um General (Moreno), e cujo noivado Pedro, que é o cantor, acompanhado por um grupo de mariachis, provoca um duelo musical, cantando músicas que desfazem um ao outro. Mesmo já sendo o pai de uma criança com Rosario, Pedro continua sua vida de mulherengo, para o desgosto de seu sogro, Don Elías (Orellana). Os dois se trancam em um recinto, e as pessoas ao redor temem que ocorra morte, pois Jorge observou Pedro a flertar com sua irmã, e ameaço-o de morte. Jorge faz uma serenata para a atual mulher do amigo, e sua antiga paixão, enquanto Pedro canta para a irmã do amigo. No dia seguinte, os amigos se atracam, mas decidem não ferir ou mesmo matar um ao outro. Jorge pede a Pedro que possa ter uma conversa com Rosario. Quando retorna a sua casa Pedro é abordado pelo General que, como todo o povoado, sabe da dupla serenata da noite anterior, e exige que Pedro mate o amigo, por tê-lo feito de trouxa diante de todos. Pedro inventa uma história que o amigo é paciente terminal de uma enfermidade, coincidindo com a carta de amor que Jorge escreve a Rosario, e fazendo com que o General demova de seu plano de casar sua filha com este. Pedro leva Don Elías e Rosario a festa de Jorge. Lá, Jorge dança com Rosario e Jorge com María. Genoveva flagra a cena e saí chorando da festa. O General, já sabedor de que Jorge não se encontra enfermo, decide matar os dois na praça, porém a população quer mais é que os dois cantem. No ínterim, o General fica sabendo da verdadeira história do casamento de Pedro – Rosario fora violada e Pedro decidiu casar com a prima apenas para que não enfrentasse a realidade sozinha, embora vivessem como irmãos. Pedro e Rosario se divorciam, Pedro casando-se com María e Jorge com Rosario, sendo celebrado o duplo casamento com canção que apresenta algumas delícias dentre as bebidas mexicanas.

É um tanto curioso que nessa aborrecida comédia ranchera, uma das mais populares de um gênero já em seu ocaso, dentro dos interstícios do conservadorismo da sociedade patriarcal mexicana, também se percebam rasgos de ousadia talvez impensáveis de se concretizar no cinema norte-americano ou brasileiro da época, como a questão do filho de um estupro, e da aceitação por parte de ambos os homens que se casam com Rosario, e da “troca-troca” de casais. Tudo isso dentro da moldura mais explícita no qual Pedro afirma a seu sogro que irá comemorar o nascimento do filho em um bar repleto de mulheres (retrospectivamente seu ato e a compreensão da esposa passam a fazer um sentido que transcende o pretenso conformismo) e de uma homofilia que faz com a relação entre os charros cantantes, figuras masculinas vestidas em trajes típicos, ganhem protagonismo para figuras femininas que passivamente sofrem seus sentimentos recolhidos em suas camas – cena que é o observada em tela dividida, e que torna os dois amigos praticamente juntos outra vez. E há achados muito bons no roteiro, além da revelação de um casamento não concretizado,  como o da doença de Jorge inventada por Pedro, em meio a uma enxurrada de canções, nos quais os dois astros mais populares do cinema mexicano de então, com personagens homônimos seus (e ambos, como Armendariz, com mortes precoces e trágicas, Negrete no mesmo ano de lançamento do filme, Infante poucos anos após em um desastre de avião) apresentam seus dotes vocais distintos. O homoerotismo latente, recorrente nos filmes de Rodríguez (a exemplo de A.T.M – A Toda Máquina, também com Infante). O realizador faria uma referência jocosa ao seu próprio filme com Dos Tipas de Cuidado, no final dos anos oitenta, em um perfil similar de decadência do gênero que no cinema brasileiro acompanhou a trajetória da chanchada à pornochanchada (ainda que no caso brasileiro, já houvesse mais malícia no primeiro gênero).| Cinematográfica Atlántida para Cinematográfica Televoz. 109 minutos.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Filme do Dia: Der Traum des Bildhauers (1907), Johann Schwarzer

Filme do Dia: El Despojo (1960), Antonio Reynoso

Filme do Dia: Quem é a Bruxa? (1949), Friz Freleng