Filme do Dia: As Aventuras de Pedro Malazartes (1960), Amácio Mazzaropi

 


As Aventuras de Pedro Malazartes (Brasil, 1960). Direção: Amácio Mazzaropi. Rot. Original: Marcos César, Galileu Garcia, Amácio Mazzaropi & Osmar Porto. Fotografia: Rudolf Icsey. Música: Fietta & Hector Lagna. Montagem: Máximo Barro. Com: Amácio Mazzaropi, Geni Prado, Genésio Arruda, Dorinha Duval, Benedito Liendo, Nena Vianna, Alvin Fernandes, Kleber Afonso, Nicolau Guzzardi, Hermes Câmara.

Pedro Malazartes (Mazzaropi) é caipira, mas não bobo. Após perder o pai e ver a herança do mesmo ser dividida entre os dois irmãos, ficando ele somente com um ganso e um tacho, por sua própria vontade. Ele decide correr o mundo, fugindo da eterna noiva Maria (Prado). Um grupo de quatro crianças se junta a ele, inicialmente contra sua vontade. Para sustenta-los, Pedro utiliza seu arsenal de lorotas. Engana um gordo fazendeiro (Liendo), afirmando que o tacho que faz uso cozinha sem necessitar de fogo; um casal (Fernandes e Duval) com a história de um ganso que adivinha as coisas e faz aparece-las e sumi-las; uma mulher, Marcolina (Vianna), de quem aprisionou no chapéu um pássaro do qual existe apenas 3 espécimes no país, roubando-lhe a carroça. O grupo passa a persegui-lo e o aprisiona dentro de um saco. Enquanto contam suas histórias ao delegado, Pedro consegue fazer uma nova vítima (Arruda), que entra no saco esperando pela filha do rei. E também um fazendeiro italiano (Guzzardi), com uma árvore que dá dinheiro. Um quinto membro, ainda bebê, une-se à “família”.  Levado a julgamento, enquanto as crianças são levadas ao orfanato, Pedro é inocentado pelo júri popular. Ele finalmente aceita Maria, e juntos vão atrás das crianças no orfanato, conseguindo ficar com a guarda delas se se casarem e arrumarem um emprego. Ambos pedem o mesmo a Frei Antônio (Câmara), responsável pelo próprio internato.

Um nicho à parte na história do cinema brasileiro, os filmes de Mazzaropi e sua longeva popularidade, não apenas eram um produto completamente à parte da então popular chanchada, como produzidos em São Paulo, tornando-se precedentes para outros fenômenos cômicos posteriores como o quarteto Os Trapalhões. E também um raro caso de diretor que acumulava igualmente as funções de co-roteirista e ator principal.  Mais interessantes enquanto diálogo com um público fiel e também enquanto termômetro do que eram alguns dos interesses do público com o passar dos anos (como boa parte dos realizadores independentes, Mazzaropi não deixou de flertar com a pornochanchada em Jecão...Um Fofoqueiro no Céu, de 1977). A partir de motivos de contos populares, o filme apresenta um humor populista que parece se antecipar a qualquer desentendimento com a censura, ou seja, apesar de enganar a todos, Malazartes o faz por uma boa causa, a das crianças abandonadas, e automaticamente já se espera um final com direito a boas doses de pieguice (buscando aqui quintuplicar o efeito da separação entre o garoto e Carlitos no clássico O Garoto, de Chaplin, pretensão impossível, dado os limites de seus atores mirins e do próprio Mazzaropi, para resumir). Da mesma forma, embora uma das poucas tiradas realmente boas do personagem, quando se afirma vivo, ao contrário dos irmãos que trabalham, ao final seu personagem parece capitular diante do trabalho e pouco após ouvir um sermão um tanto ufano – e quase tão desvinculado do enredo quanto a maior parte dos números musicais apresentados, com exceção de um que ocorre numa festa – do frei, que mais parece ter saído de uma produção de propaganda dos tempos do Estado Novo. Igualmente ocorre uma capitulação diante da noiva, após uma fuga tipicamente misógina que o reencontro e “conciliação” não chegam a ser um desmentido, no sentido de que o próprio personagem afirma que o faz pelo bem das crianças. O interesse, portanto, tem muito menos a ver em ter uma companheira que uma mãe para seus filhos, todos sintomaticamente meninos, e como que pequenas reproduções dele próprio, à exceção evidentemente do bebê. Mesmo não exatamente bem conseguida, sua dimensão fabular (e sua cartela inicial, que assume que “quando conta um conto, acrescenta um ponto”, apresentando uma engenhosidade que, na maior parte das vezes falta em termos de timing na interpretação e excessiva dependência dos diálogos) antecipa, de certa forma, a observada posteriormente em filmes como Macunaíma (1969). Dentre algumas das incongruências do filme está o aparente contrassenso entre a esperteza marota de seu protagonista e o quão tão facilmente cede em ser trapaceado pelos irmãos, que não demonstram serem exatamente um poço de inteligência ou se encontrarem distantes dos personagens em que o malandro passa a perna. Pouco depois, Mazzaropi encontraria seu personagem recorrente, Jeca Tatu, ainda que pouca possa se perceber de mudanças dignas de nota, pois o tipo que o ator encarna parece ser sempre o mesmo. PAM Filmes. 90 minutos.

 

 

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