Filme do Dia: Domicílio Conjugal (1970), François Truffaut

 



Domicílio Conjugal (Domicile Conjugal, França/Itália,1970). Direção:  François Truffaut. Rot. Original:  François Truffaut,  Claude de Givray &  Bernard Revon. Fotografia: Néstor almendros. Música: Antoine Duhamel. Montagem: Agnès Guillemot. Dir. de Arte: Jean Mandaroux. Cenografia: Jean Mandaroux. Figurinos: Françoise Tournafond. Com: Jean-Pierre Léaud,  Claude Jade,   Daniel Ceccaldi, Claire Duhamel,  Hiroko Berghauer, Daniel Boulanger,   Sylvana Blasi, Barbara Laage,  Danièle Girard,   Claude Véga.

Antoine (Léaud), leva o doce cotidiano da vida de recém-casado com Christine (Jade). Ele, como florista, ela como dona de casa, vivendo em um subúrbio parisiense. Sua rotina inclui ainda visitas ocasionais aos pais de Christine e o convívio com os tipos populares que vivem nas cercanias. O único a destoar, pela estranheza, é o misterioso vizinho que todos chamam de estrangulador (Véga), embora posteriormente se torne popular, quando aparece fazendo fazendo imitações na TV. Logo, no entanto, o cotidiano do jovem casal será abalado com a gravidez de Christine. Nasce o filho do casal, a quem  Antoine põe o nome de Alphonse, a contragosto da mulher.  Antoine acaba tendo que procurar emprego em uma firma, onde passa a ser manobrista  de navios em uma maquete que representa a construção de um porto. O novo emprego leva Antoine a sentir-se atraído pela sobrinha de um dos homens de negócios que visita a maquete, a japonesa Kyoko (Berghauer). Logo passa a mentir sistematicamente para a mulher quando chega atrasado. Para seu azar, no entanto, recebe flores da amante no trabalho e as joga no lixo do apartamento. Um garoto recolhe e a traz. Antoine afirma que eram rosas para a mulher, mas que achara  a idéia tola e desistira no meio do caminho. Porém logo aparecem as mensagens que Kyoko pusera dentro. Indignada, Christine pretende se separar, embora logo perceba que não deixa de amá-lo. Antoine assume sua relação com Kyoko e passam a viver separados. Brevemente, no entanto, Antoine se sentirá enfastiado da amante e, uma noite que vão ao restaurante, passa a ligar sistematicamente para a mulher, até que Kyoko perde a paciência e vai embora. O casal volta a viver ainda mais intensamente o cotidiano que antes do relacionamento extra-conjugal, despertando o comentário de um casal de meia-idade vizinho que só agora se encontram verdadeiramente casados.  

Quarto filme do ciclo Doinel. Aqui, Truffaut já se afasta da aguda, dolorosa e sincera reconstituição de sua adolescência efetivada em Os Incompreendidos (1959) e realiza um filme mais próximo de uma comédia dramática de costumes, ao mesmo tempo não deixando de lado elementos biográficos. Estes últimos surgem tanto na relação ambígua entre a esposa e a amante, quanto no comentário da companheira de Doinel, quando afirma que arte não se mistura com um ajuste de contas, ao saber que Doinel está escrevendo seu primeiro livro com fortes tinturas autobiográficas (como o próprio Truffaut fizera em seu primeiro filme, despertando uma reação negativa dos familiares). Também flerta, ainda que em bem menor grau, com um certo non-sense romanesco, que será melhor trabalhado em Uma Jovem Tão Bela Como Eu (1972). As referências ao mundo do cinema, assimiladas à narrativa do filme em Os Incompreendidos, aqui já parecem mais gratuitas e próximas de Noite Americana (1973), como na homenagem a Jacques Tati - Doinel espera o metrô, enquanto um atrapalhado Sr. Hulot procura entrar no trem. Ou ainda nas máscaras que destacam do quadro apenas Doinel e Kyoko, representando a atração física que ambos sentem um pelo outro, evocativa dos filmes do começo do século. Mesmo procurando um efeito cômico mais sutil e irônico que o de provocar gargalhadas, muitas dos leitmotifs para tal se tornam desinteressantes de tão utilizados, como o do amigo de Doinel que vez por outra lhe pede emprestado dinheiro, sempre aumentando sua dívida, com a desculpa de que lhe pagará um número fechado, a presença do vizinho misterioso que sempre desperta comentários ou ainda o porteiro maníaco por mulheres, esse bem mais hilário - interpretado pelo mesmo ator - em Uma Jovem Tão Bela Como Eu. Bela fotografia de Almendros. No geral, tanto em termos de forma quanto de conteúdo, um cinema bem mais convencional e menos idiossincrático que o que outros realizadores da Nouvelle Vague continuariam insistindo em realizar como Jean-Luc Godard e Eric Rohmer. Valoria Films/ Fida Cinematografica/  Les Films du Carrosse. 100 minutos.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Filme do Dia: Der Traum des Bildhauers (1907), Johann Schwarzer

Filme do Dia: Quem é a Bruxa? (1949), Friz Freleng

A Thousand Days for Mokhtar