Filme do Dia: Cinzas e Diamantes (1958), Andrzej Wajda
Cinzas e Diamantes (Popiól i Diamant, Polônia, 1958).
Direção: Andrzej Wajda. Rot. Adaptado: Jerzy Andrzejewski & Andrzej Wajda,
a partir do romance do primeiro. Fotografia: Jerzy Wójcik. Música: Filip Nowak.
Montagem: Halina Nawrocka. Dir. de arte: Roman Mann. Figurinos: Katarzyna
Chodorowicz. Com: Zbiginew Cybulski, Ewa Krzyzewska, Waclaw Zastrzezynski, Adam
Pawlikowski, Bogumil Kobiela, Jan Ciecierski, Stanislaw Milski, Artur Mldonic,
Ignacy Machowski, Barbara Krafttówna, Zofia Czerwinska.
Durante a
Ocupação Alemã na Segunda Guerra, os grupos rivais que viviam em relativa
tranquilidade se arvoram subitamente em inimigos após a decretação da rendição
da Alemanha. Maciek (Cybulski) participa de uma ação terrorista que mata
equivocadamente dois homens. Ele se refugia no hotel da autoridade russa,
Szszuka (Zastrzezynski), a quem foi incubido de matar, porém se torna cada vez
menos encorajado, após oferecer fogo mais de uma vez para sua pretense vítima e
se enamorar fortemente da atendente do bar, Krystyna (Krzyzewska). Porém as
responsabilidades vem à tona quando se vê face a face com seu parceiro, Andrzej
(Pawlikowski).
Terceiro filme de
uma vaga trilogia ambientada na Segunda Guerra que inclui Kanal (1957) e Geração
(1955). Ainda que as formigas que teimam em subir na arma do “herói” justamente em um dos
momentos que ele mais precisa dela traiam uma pretensão de traçar um retrato
dos combatentes da Resistência distante do convencional, enfatizando sua
insegurança e certo amadorismo, o filme visualmente envereda por algo bem
distante do que uma postura supostamente herdeira do neorrealismo poderia
sugerir inicialmente. De fato, torna-se mais que enfático, e rapidamente, as
alusões ao universo pictórico de um Cidadão Kane, nos tetos rebaixados e composições em profundidade, muitas das quais
igualmente de mesas – ainda que nem sempre o foco se encontre nítido em toda
sua extensão – assim como a artimanha de enquadrar personagens muito próximos
da camera enquanto outros motivos (e/ou personagens) se encontram bem para
trás, recurso que viraria coqueluche por volta do início da década seguinte.
Com suas portas e entradas secretas, assim como encontros fortuitos – em um
deles, o personagrem literalmente se vê entre os dois motivos que o dividem,
sua amada e o objeto de sua ação terrorista – certamente deve muito ao cinema
norte-americano, sendo sua fotografia igualmente evocative do noir e seu herói, que se tornaria ícone
do cinema polonês e também teria morte trágica como o James Dean no qual foi
inspirado, algo blasée e atormentado, e com seus indefectíveis óculos
esculos – aqui utilizados mesmo à noite, segundo seu personagem, pelo longo
período em que ficou vivendo nos subterrâneos, o que remete a um momento
anterior da Resistência e igualmente a Kanal.
Tudo isso, no entanto, finda por depor contra a dimensão trivial e
anti-heroica, ao menos se se pensar o heroísmo convencional vigente nas telas
então, em sua empostação que parece ter envelhecido pior que o caso de filmes
menos pretensiosos do realizador (a exemplo do posterior Os Inocentes Charmosos). Algumas cenas tomam partido de belos
motivos visuais, tal qual o Cristo dependurado em uma capela em ruínas e a
corrida suicida, ao final, de Maciek, passível de sugerir a antecipação de uma
poética quase tão antirrealista quanto a de Terra em Transe e sua morte nada heróica em um lixão o mesmo em
relação a O Demônio das Onze Horas
(e consequentemente O Bandido da Luz
Vermelha). Predomina, no entanto, o
ambiente trespassado de claros-escuros
do hotel e fantasmágoricos veículos que lançam as sombras gigantes dos
soldados sobre as edificações que predominam. E tampouco se pode esquecer o
caráter alegórico, que voltaria recorrentemente na filmografia do realizador,
até como forma de driblar a crescente censura, observado aqui em um pomposo
jantar às autoridades russas que é perturbado inicialmente por um velho polônes
incomodamente alcoolizado em demasia e o jovem que ajuda a tornar igualmente
incômodo e que vai crescentemente tomando conta do ambiente como um todo, algo
evocativo do que se faria, de forma mais sofisticada e consequente, em
produções posteriores do Leste Europeu tais como as de Forman. Por tudo isso, o
filme demonstra o seu valor, embora observar sua narrativa, concentrada em dois
dias, possa igualmente ser um exercício parcialmente libertador de sua aclamada
glória internacional, sendo que a sutileza que Ewa Krzyzewska empresta a sua
Krystyna mais interessante ao olhar olhar contemporâneo de seis décadas após
que a afetação de Cybulski. Existe uma versão alguns minutos mais longa. Zespów Filmowy “Kadr”. 98 minutos.
Comentários
Postar um comentário