Filme do Dia: Arábia (2017), João Dumans & Affonso Uchoa

 


Arábia (Brasil, 2017). Direção e Rot. Original: João Dumans & Affonso Uchoa. Fotografia: Leonardo Feliciano. Música: Francisco César. Montagem: Rodrigo Lima & Luiz Pretti. Dir. de arte: Priscila Amoni. Com: Aristides de Sousa, Murilo Caliari, Renata Cabral, Renan Rovida, Gláucia Vandeveld, Wederson Neguinho, Adriano Araújo, Renato Novaes.

André (Caliari) é um jovem que mora perto de um grande complexo industrial em Ouro Preto. Como os pais viajam com frequência, quem lhes dá assistência é uma tia (Vandeveld), que também presta auxílio a moradores enfermos da região. Certo dia a tia dá uma carona a Cristiano (Sousa), operário da fábrica. Pouco tempo depois, ele é encontrado subitamente desacordado e ela presta primeiros socorros até que a ambulância chegue. Ela então pede que André vá buscar uma muda de roupas do rapaz. Inicialmente parecendo algo simples, ele se mantém desacordado. André, que vira um caderno de notas quando lá estivera, retorna e percebe que Cristiano escrevera sobre sua vida estimulado por um grupo teatral que fizera parte. Nesses escritos, revela sua trajetória errante, passagem pela prisão, vida como andarilho e trabalhador em diversos cantos,  como construtor de uma rodovia, posteriormente numa fábrica que lhe dá maior estabilidade e conhecendo quem acredita ter sido o amor de sua vida, Ana (Cabral), sendo que a relação se torna desestruturada após ela perder um filho em um aborto involuntário. Cristiano então parte outra vez, agora para Ouro Preto, onde consegue graças a um grande amigo do passado, voltar a trabalhar numa grande indústria. Porém o amigo é despedido pouco tempo depois. Cristiano se refere a sequelas de saúde que vem sentindo no emprego e de falta de energia física.

Trabalhar com a subjetividade de algum personagem em proximidade é um exercício de alto risco e esse filme não é uma exceção. Construído através desse sinal de “vida interior” que é uma escrita de si, o filme, no entanto, derrapa em lugares cada vez mais comuns do que seria uma poética do cotidiano, poética essa marcada pela exclusão social e certa marginalidade. O resultado, além de não sair de certa perspectiva lugar comum, é ainda mais prejudicada pela adoção desse formato de narrativa dentro da outra, em que as relações tênues e pouco trabalhadas de ambas, sonegadas em termos de imagens, após a entrada na narrativa lida por André, tampouco é bem resolvida. Sobra sensibilismo e falta uma elaboração mais rica dos personagens justamente no que é o calcanhar de aquiles do filme, a subjetividade. E aí a voz over faz o papel de tradicional guia pelo passado do personagem, eivado de certa pureza que raia o paternalismo, tornando o filme arrastado e pouco interessante, apesar da interpretação sensível e correta de seu elenco, particularmente de Aristides de Sousa. A utilização de Blues Run the Game, do cantor folk Jackson C. Frank, em mais de um momento (inclusive nos créditos iniciais) ressoa mais como uma intervenção autoral dos realizadores, cuja aproximação do retratado se dá pelo caráter da errância, que propriamente aparentemente fazer parte do univereso de Cristiano.  Katásia Filmes/Vasto Mundo. 97 minutos.

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