Filme do Dia: Um Louro (2019), Marco Berger

 


Um Louro (Um Rubío, Argentina, 2019). Direção e Rot. Original: Marco Berger. Fotografia: Nahuel Berger. Música: Pedro Irusta. Montagem: Marco Berger. Dir. de arte: Natalia Krieger. Com: Gaston Re, Alfonso Barón,  Malena Irusta,  Ailín Salas, Charly Velasco, Justo Calabria, Antonio De Michelis, Melissa Falter.

Gabriel (Re) vai morar com outro operário que trabalha na mesma empresa, Juan (Barón), nos subúrbios de Buenos Aires. De comportamento introspectivo, apenas observa, na maior parte das vezes, as interações sociais do companheiro de moradia com seus amigos e mulheres, dentre elas a que mais se encontra presente, Julia (Salas). Duas vezes por semana, Gabriel se desloca para encontrar-se com a filha pequena, Ornella (Irusta), que mora com a mãe dele (De Michelis), desde a morte de sua jovem esposa. Uma atração começa a ser sentida entre Gabriel e Juan. Os dois chegam as vias de fato com o desejo mas, para a decepção e sofrimento de Gabriel, Juan não se encontra disposto a abandonar a vida com Julia, e a presença de seus amigos do bairro, os jogos de futebol e tudo que o mundo heterossexual lhe proporciona. Pouco após essa conversa com Gabriel, Julia lhe diz para que ele comece a procurar outro lugar, pois ela se encontra grávida de Juan, e o quarto no qual se encontra será o do bebê.

Berger tem já criado uma filmografia relativamente consistente até o momento dessa produção (com sete longas lançados e um esperando pelo lançamento), além de um punhado de curtas, todos lidando com a questão do desejo sexual entre homens que não se enquadrariam dentro de um perfil gay mais óbvio. Por sorte, mesmo que exista proximidades entre todos, há também diferenças. Aqui, por exemplo, trata-se de um ambiente menos economicamente afluente que o habitual, ainda que a dupla de atores não se torne exatamente a expressão da verossimilitude no trabalho, que não chega a ser comentado mais que um punhado de vezes – seja qual for a classe social de seus personagens, fica bastante claro o foco que interessa a Berger. E se, ao contrário de outros (Taekwondo, Hawaii) em que a tensão sexual faz as vezes de tensão dramática, a situação aqui se resolve, em termos de concretização do desejo sexual, de forma relativamente precoce na narrativa, outros obstáculos serão encontrados para uma situação que, ao contrário das duas produções citadas, não se resolvem em um final feliz, ao menos da perspectiva convencional, embora exista um gesto final de abertura do habitualmente monossilábico Gabriel rumo a aceitação de seu próprio desejo, para além das arestas da intimidade homo e heterossocial vivenciadas por Juan. Poder-se-ia, ao compará-lo com as produções anteriores, sobretudo Hawaii,  imaginar que se saiu do esquadro de uma tomada de decisão em que existe primordialmente apenas os dois personagens, havendo, inclusive, relações outras com mulheres por parte de ambos os personagens. Mas, ao final de contas, o que fica praticamente exposto de forma quase didática, é que o passo para se vivenciar ou não publicamente a relação de desejo é que conta e aí, uma vez mais, e com seu habitual laconismo, Gabriel o dá, antes mesmo da cena final, quando rompe com sua namorada que encontra aos sábados. A homofobia social se reproduz em Juan, que não pretende ser apontado como diferente, embora o próprio Berger não poupe esforços em sempre apresentar atores atraentes, destituídos de maneirismos em suas construções ficcionais, em que há sempre como que um olhar gay retraído em dissonância com o ambiente exclusivamente hétero, no qual inexiste qualquer tipo de personagem gay assumido visível nesse tensionamento. Menos voyeurístico que os anteriores, ainda assim nos brinda com algumas recorrências emblemáticas, como o retorno dos amigos no trem, em que seus corpos parecem se encontrar a um ponto de se beijarem, ou na cena do primeiro contato sexual entre ambos e uma ou outra antes dessa, em situações de troca de roupas, presentes com maior assiduidade antes. Os planos de apoio, também recorrentes, que trazem um que de rotina (e algo de Ozu) e da passagem implacável do tempo, em que continuidade e diferença coexistem, o uso contido da trilha musical, e uma coerência na maturidade com que expõe os perfis psicológicos de cada um, sem concessões sentimentais (como no final de Hawaii) são bem vindos, assim como um habitual tato na escolha do elenco, e de como tirar melhor proveito do mesmo. Universidad del Cine. 108 minutos.

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