Filme do Dia: Consciências Mortas (1943), William Wellman
Consciências Mortas (The Ox-Bow Incident, EUA, 1943). Direção: William Wellman. Rot. Adaptado: Lamar Trotti. Fotografia: Arthur C. Miller. Música: Cyril J. Mockridge. Montagem: Allen McNeil. Dir. de arte: James Basevi & Richard Dav. Cenografia: Frank E. Hughes & Thomas Little. Figurinos: Earl Luick. Com: Henry Fonda, Dana Andrews, Mary Beth Hughes, Anthony Quinn, William Eithe, Harry Morgan, Jane Darwell, Matt Brigs, Harry Davenport.
Nevada, por volta de 1885. Um grupo de homens acredita ter encontrado as pistas de quem seja o assassino de um xerife local. Eles partem atrás do grupo com intenção premeditada de linchá-los, sob a alegação contrária do juiz da cidade. Um dos que se junta ao grupo, mas não muito convicto da ação, é Gil Carter (Fonda) e seu parceiro Art (Morgan). Um grupo grande de justiceiros parte da cidade. No meio do caminho, Gil descobre que seu amor, Rose Mapen (Hughes), encontra-se casada com um almofadinha de San Francisco. O grupo de três homens é encontrado dormindo. Donald Martin (Andrews), afirma ter comprado gado do xerife e não possuir nenhuma nota da transação, mas afirma sua inocência e teme pelo futuro de suas crianças. O mexicano Juan Martínez (Quinn), que Donald afirma não saber falar inglês, finda por falar. Já o velho que compõe o grupo, que ele afirmara fazer parte do exército durante a Guerra Civil, não reage com reflexos de quem um dia foi do Exército. São várias evidências contra e um clamor de justiça a ser feita. E na liderança desse clamor se encontra o velho patriarca local, veterano de guerra, Major Tetley (Conroy), que desconsidera os modos pouco viris do filho, Gerald (Eythe), ao recusar participar da execução, batendo-lhe duramente. A execução é consumada, porém logo após se fica sabendo sobre os reais autores da ação criminosa e que o xerife, na verdade, encontra-se ainda vivo. O silêncio e o constrangimento geral se seguem, no saloon, quando Gil lê a carta de despedida que Donald escrevera a esposa.
É curioso o quanto esse filme antecipa, de forma bastante incisiva, mas não exatamente “didática”, como é o caso da maior parte daqueles, os dramas liberais dos anos 50 e 60, no estilo dos produzidos por Stanley Kramer, e, ao tomar essa posição, indo contra os clichês instituídos do western convencional, da maneira como haviam sido enraizados por realizadores canônicos do gênero tais como John Ford. Aqui, por exemplo, volta-se às costas para uma exploração gráfica das ações mais dramáticas – como o tiro contra o mexicano, no momento que esse tenta fugir ao cerco que o levará a morte, o próprio enforcamento ou o suicídio do líder dos linchadores – o que acaba provocando em cada ação uma densidade reflexiva pouco comum ao gênero, como já se pode perceber em sua tensa sequencia inicial. Mais precavidos e menos certos de suas ações, como pode se perceber nas próprias atitudes algo vacilantes mesmo daqueles favoráveis ao enforcamento, um peso da possibilidade de decisão parece pairar de forma muito pouco comum no western e também demarcar um momento de transição entre os valores tradicionais (deserto) e os modernos (jardim), sendo que curiosamente não existe uma exploração dos primeiros para apenas, ao final, apontar-se para o momento de imposição do segundo, que teoricamente apontaria para o esgotamento de todas as suas potencialidades míticas. Nesse sentido, até mesmo o que em um filme de tradicional do gênero poderia ser apontada como positivo, a valorização da virilidade, que uma geração mais velha passa para a mais jovem, aqui é radical e surpreendemente contestado. O filho, tal como alguns adolescentes das produções que tematizavam dramas contemporâneos da década seguinte, não deixa de enfrentar o pai e fazê-lo refletir sobre o que é covardia e o que é coragem, esse se suicidando logo após a conversa. Outra surpresa é que a mais que comum mescla entre duas linhas, a da ação e a do romance, não se concretiza aqui. Quando se imagina que literalmente elas se cruzam na estrada que levará aos pretensos criminosos, na figura da jovem que era motivo da paixão do herói, essa já se encontra casada e, ao contrário do que se imagina, nenhuma novidade surgirá daí. A cena de pretensa “posse” por parte do herói diante da humilhação pública de seu objeto de amor o ter preterido a alguém bem menos viril não ocorre. Resta a compreensão, por parte do herói, da injustiça perpetrada por um mundo social indigno daquele que escreveu a missiva de despedida para sua mulher. E a tentativa mínima de reparação do erro se encontra sinalizado na partida de Gil e Art para levar a carta às mãos da viúva. A diversidade de opiniões e o conflito, assim como a progressiva cooptação das opiniões do grupo é demarcado pela montagem, dinâmica em acentuar a contraposição rápida de falas. 20th Century Fox Film Corp. 75 minutos.
Postada originalmente em 31/07/2016
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