Filme do Dia: Farewell Amor (2020), Ekwa Msangi
Farewell Amor (EUA, 2020). Direção e
Rot. Original Ekwa Msangi. Fotografia Bruce Francis Cole. Música Osei Essed.
Montagem Joanna Applegate & Justin Chan. Dir. de arte: Virginia Hastings,
Lance Mitchell & Christine Morris. Figurinos Evren Catlin. Com Ntare Guma
Mbaho Mwine, Zainab Jah, Jayme Lawson, Joie Lee, Nana Mensah, Marcus Scribner,
Brandon Lamar, Felipe Almonte.
Esther
(Jah) e sua filha Sylvia (Lawson) reencontram o marido/pai Walter (Mwine)
dezessete anos após este ter emigrado para os Estados Unidos, no aeroporto John
Kennedy, em Nova York. Enquanto a mulher se transformou numa fervorosa
evangélica, a filha se mantém distante de um pai que lhe era desconhecido da
memória que não a de fotos e relatos. As tensões em relação aos dois mundos se
manifestam sobretudo em Esther, enquanto a filha consegue manter vínculos
sociais sobretudo devido a dança.
É como uma
lufada de constipação que o bom trabalho desenvolvido pelo elenco dessa
produção se veja soterrado por um mal que atinge boa parte do cinema
norte-americano, independente ou não, ou quiçá mesmo mundial: sua desapontadora
gentrificação. Aqui, por exemplo, não apenas o espaço em que os personagens se movem
desde o início é o de uma das cidades mais gentrificadas do mundo, Nova York,
mas igualmente a própria trama, desenvolvida por uma realizadora de ascendência
africana, também o é, elaborando personagens um tanto unidimensionais, como o
da mãe fervorosamente evangélica e fazendo com que os personagens angolanos
falem em inglês a todo momento, e quando
se arrisque algo em português, a emenda seja pior que o soneto (um “vem cá,
minha querida” quase irreconhecível ou um “feliz noite” como boa noite, bastante
sofrido). Nada muito distante dos barbarismos praticados pelo cinema
hollywoodiano clássico com praticamente o resto do mundo. Isso acaba por
contaminar o proselitismo do filme, da maneira menos desejável possível, longe
da verve e espirituosidade de um filme que lida, por exemplo, com preconceitos
similares na sociedade francesa da segunda geração de estrangeiros (A Esquiva). E aí, a articulação da montagem, através do recorte dos
personagens principais, entre idas e vindas no tempo, muito bem realizado,
torna-se o que é, algo talentoso mas destituído de vida. E o que era ruim,
piora. Os lugares-comuns dramáticos mostram de vez sua face. E ela é tão
honesta quanto a novela latina. E faz uso de expedientes similares em termos de
populismo. Como um banho de charme que Esther recebe de sua vizinha para o
jantar com o marido. E o nó górdio dessa produção é justamente a figura de Esther,
pois o drama depende dela, e ela é uma caricatura, e continua a sê-lo, quando
começa a inverter o sinal. Ela justifica, por exemplo, que se toque brevemente
na questão do preconceito racial vivido pelos negros no país, sobretudo quando
estrangeiros, mas que o foco, em último grau, seja o de país que acolhe e pode
redimir as tensões encroadas de uma sociedade tradicional, sobretudo quando
essa é identificada com o evangelismo. De forma paternalista e rasteira. E que
a renitente evangélica de anos se solte e dance, basta uma evangelização rápida
nos códigos mundanos em voga. E os personagens são meras marionetes açoitados
pelos ventos triviais do roteiro, tão pouco naturais quando a imagem que se
cria do esforço incrível do elenco pronunciar suas palavras em português de uma
forma tão completamente ausente de sentido diante das palavras estranhas (para
si) que pronunciam. Outra facilidade típica é a rápida conversão da filha que
rejeitava o pai que aos poucos consegue quebrar o gelo e serve como reflexão,
embora um dado realista, que a dança seja a única forma na qual Walter diz
conseguir se expressar no país, e que a filha igualmente assume como bandeira
de sobrevivência, o que não deixa de se filiar a uma tradição de gueto que
negros conseguem algum destaque social, portanto de uma auto-afirmação que não
se defronta mais diretamente com o establishment branco. Como tantos filmes
recentes, houve previamente um curta com a mesma temática. Park Pictures/Department of
Motion Pictures/Jhumka Films/Lucky 13 Prod./MACRO/MUBI/Outrageous
Pictures/Wavelenght Prod. 95 minutos.
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