Filme do Dia: Cinderela (1922), Lotte Reiniger

 



Cinderella (Aschenputtel, Alemanha, 1922). Direção: Lotte Reiniger. Rot. Adaptado: a partir dos irmãos Grimm. Fotografia: Carl Koch.

A pioneira em animação em silhuetas Reiniger, já inicia com cartelas que não fazem questão de esconder a dimensão fabular de sua narrativa, não apenas enquanto adaptação do célebre conto de Cinderella quanto de uma criação anmada, com a primeira cartela já fazendo menção ao fato de que a história seria contada através de um par de tesouras, que são observadas recortando e dando forma às figuras e até mesmo inicialmente espetando por breves instantes a cabeça de sua protagonista. Como se trata de uma narrativa por demais conhecida, Reiniger, não se escusa em fazer uso de uma elíptica tela escura, através de cujos “rasgos” observamos cenas comumente associadas com o conto dos Grimm,  esses mesmos rasgos demonstrando ser a segmentação do espaço da casa em que Cinderella trabalha e é constantemente vítima de humilhações. As bordas que separam o fundo negro da imagem branca não apenas realçam os contrastes que provocam grande efeito expressivo, como também mimetizam o que seriam pontas de uma cartolina recortada por tesoura, evocando a própria técnica utilizada pela animação. A sexualidade, longe de ser exatamente algo tabu como se transformaria cada vez mais para a animação comercial clássica, é aqui evocada em diversos momentos com engenhosidade, como o que Cinderella procura contornar a ausência de busto de uma das solteironas filhas de sua patroa, jogando diversos objetos dentro de seu sutiã. Com toda sua intimidade com a natureza, aqui aparentemente a magia que faz com que Cinderella ganhe seu coche e cavaleiro para leva-la ao baile parece advir menos de uma fada (ao menos na sua corporificação convencional) que de um pássaro que surge de uma árvore onde a heroína chorava suas mágoas. A mesma árvore que proporciona a folhagem que se tornará um adornado vestido de baile. A construção visual que destaca pontas e objetos retorcidos provavelmente sofreu influência do expressionismo cinematográfico contemporâneo e conterrâneo. Embora sem se descolar dos protocolos do conto, Reiniger sutilmente brinca com eles, não apenas nos detalhes invocados que muitas vezes remetem a anatomia “equivocada” das personagens de má índole, como é o caso do contraste brutal entre os pés da feia filha da madame e os delicados, miúdos e bem cuidados pés de Cinderella, chegando ao extremo da filha cortar do seu próprio pé para que esse coubesse no sapatinho de cristal deixado no baile pela heroína. Novamente, é a natureza quem salvará a última, com um pássaro vindo a contar literalmente ao ouvido do príncipe que essa se encontra aprisionada no porão e são esses que não apenas apontarão onde se encontra a entrada para o mesmo como ainda levantarão sua tampa para o tonto príncipe. Institut für Kulturforschung. 12 minutos e 55 segundos.

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