Filme do Dia: Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) (2014), Alejandro González Iñarritu
Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)
(Birdman, EUA/Canadá, 2014). Direção:
Alejandro González Iñárritu. Rot. Original: Alejandro González Iñárritu,
Nicolás Giacobone, Alexander Dinelares & Armando Bo. Fotografia: Emmanuel
Lubezki. Música: Antonio Sanchez. Montagem: Douglas Crise & Stephen
Mirrione. Dir. de arte: Kevin Thompson & Steven H. Carter. Cenografia:
George DeTitta Jr. Figurinos: Albert Wolsky. Com: Michael Keaton, Emma Stone,
Edward Norton, Naomi Watts, Zach Galifianakis, Lindsay Duncan, Katherine
O’Sullivan, Andrea Riseborough.
Riggan (Keaton) é um ator decadente
que obteve grande sucesso no cinema com Birdman
tempos atrás e procura emplacar um sucesso na Broadway com uma adaptação de Raymond Carver. Para substituir o ator
originalmente escalado, ele conta com o vaidoso e pernóstico Mike (Norton) que
abandona as indicações em um dos ensaios com público, esculhambando com tudo e
todos, para o desespero de Riggan. A tensão se torna crescente quando a estreia
se aproxima, principalmente após uma crítica influente, Tabitha (Duncan),
anunciar que irá destruir a peça. Uma das assistentes de Riggan é sua filha,
Sam (Stone), que se envolve com Mike, enquanto uma amante de Riggan, Laura
(Riseborough), que também participa da produção, diz-se grávida. Ainda compõe
o elenco uma amiga de longa data, Lesley (Watts), que fica abalada com a
tentativa inusitada de Mike de fazer sexo de fato quando se encontram em uma
cena na cama.
Extremamente virtuoso na fluidez com
que se desloca entre seus personagens, através de longos planos-sequencias que
também prestam seu tributo ao universo do teatro e da interpretação em geral, o
filme revisita e igualmente atualiza o conflito entre interpretação e vida real,
mais pontualmente através do embate em que Riggan simula desabar emocionalmente
através de dolorosas recordações da infância que provocam a comiseração de
Mike, para logo a seguir afirmar que havia inventado tudo aquilo, mas
distribuído ao longo de todo o filme, onde realidade e imaginário se tornam
grandemente fluidos. Talvez esse seja um dos achados do filme, a partir de uma
perspectiva realista apresentar a força mental que faz com que Riggan movimente
objetos ou os faça cair – ou ao menos assim pense fazer – levitar, etc., sem
necessariamente explicá-lo a partir de qualquer postura abertamente vinculada
ao sobrenatural. Ou, de forma mais radical, trazer elementos dos filmes de ação
de super-heróis para sempre associadas a persona
do ator para a imagem inesperadamente, provocando um evidente contraste. Que há
uma inteligência pulsante no filme não resta dúvida, refletida igualmente nos
engenhosos diálogos, na banda sonora, com a original utilização da voz over
que representa o Id do protagonista, seus solos de bateria, que torna ainda
mais absurdamente claustrofóbico o ambiente filmado – boa parte da ação se
passa no interior do teatro St. James em Nova York e reatuliza temas que haviam
sido abordado em filmes tão importantes e/ou diversos quanto Ridi, Pagliacci! (1928) ou as várias
versões de O Fantasma da Ópera,
fazendo-o de forma interessante como encenação/realidade e realidade enquanto
encenação, ainda mais acentuada quando se fala de uma trupe teatral que por si só
já chama a atenção. Porém, se atualizar aqui não possui uma conotação
pejorativa, tampouco se pode acreditar que o filme é tudo que pretende ser.
Demasiado preocupado certamente com sua complexa engenharia de movimentação de
câmera, que provoca cenas de forte impacto, como a que o ator subitamente se vê
no olho da rua somente de cueca em plena Times Square, provocando uma mudança
de registro, a seu modo, tão impactante quanto a presença súbita dos típicos
monstros de filmes centrados em efeitos especiais, ao romper com o micro-cosmo
onde se passa praticamente tudo o que há de mais interessante no filme, talvez fique
a dever, no entanto, na composição de seus personagens, demasiado arquetípicos
e superficiais para soarem como verdadeiramente interessantes em seus dramas;
em última instância, tão artificiosos quanto a própria máscara de maquiagem que
envelhece a pele de Keaton. Talvez de fato falte ao filme a ousadia de não
apenas descobrir as várias “máscaras” que acompanham o personagem (perucas no
teatro, máscara que personifica seu personagem mais famoso, que dá título ao
filme ou ataduras que cobrem o rosto após atirar contra si próprio) como
extrair igualmente a própria maquiagem pesada que cobre a criação do Riggan de
Keaton. Ao contrário, num movimento mais tipicamente hollywoodiano, prefere a
saída mais fácil de apelar para o
onirismo auto-complacente da fantasia sem peias. New Regency Pictures/M
Prods/Le Grisbi Prod. para Fox Searchlight Pictures. 119 minutos.
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