Filme do Dia: Um Candango na Belacap (1961), Roberto Farias
Um Candango na Belacap (Brasil, 1961).
Direção: Roberto Farias. Rot. Original: Roberto Farias & Meira Guimarães, a
partir do argumento de Farias & Herbert Richers. Fotografia: Amleto Daissé.
Música: Lyrio Panicalli. Montagem: Rafael Justo Valverde. Cenografia: Alexandre
Horvat. Com: Ankito, Grande Otelo, Marina Marcel, Vera Regina, Milton Carneiro,
Maria Cristina, Mozael Silveira, José Policena.
Em Brasília, o reconhecido Emanuel
Davis Jr. (Otelo) se encanta pela dançarina Odete (Regina) levando-a consigo ao
Rio, onde se casam, porém sem que Odete deixe de levar também seu parceiro
artístico, Tonico (Ankito), para o desgosto do marido. O par artístico de Emanuel
na boate de Jacó (Carneiro) é a gringa Gilda (Marcel). Quando Odete improvisa e
se intromete em um número musical da dupla, a reação entusiástica do público
cresce os olhos do ganancioso Jacó, que consegue afastar Tonico de Odete,
afirmando que no máximo poderia manter Gilda com os dois. Essa, agora
apaixonada por Tonico, amarga a falta de oportunidades, sobrevivendo de um
número sensacionalista de Tonico, como faquir. Com a consciência pesada, após a
revolta inicial provocada pelas mentiras de Jacó, Odete e Emanuel reencontram
os seus antigos parceiros e juntos pretendem montar sua própria boate, contando
contra si a vilania do sempre inescrupuloso Jacó.
Salta aos olhos o quanto Ankito é uma
tentativa de substituição nada original ao parceiro anterior de Otelo, Oscarito
– e como se não bastasse ainda existe uma referência ao momento mais célebre da
dupla, a paródia da cena do balcão de Romeu
e Julieta em Carnaval de Fogo
(1954), inserida aqui em um número musical, assistida pelo próprio personagem
de Otelo, no qual a versatilidade da
troca de cenários e figurinos no palco é feita com o recurso imperativamente
cinematográfico da montagem; cena essa que, por sua vez, terá trechos
apresentados quando personagens que vão ao cinema à época, justamente em Brasília,
em O Outro Lado do Paraíso (2014).
Ao se fazer passar por madame, a negra Odete de Vera Regina inclui entre seus
apetrechos (piteira, casaco, jóias) uma peruca loura. Porém, sua pose de
elitizada logo sucumbe aos reclames de seu parceiro – aqui são os dois que
invariavelmente sofrem com o deboche de não fazerem parte daquele universo
elitizado, enquanto Otelo se aproxima mais de uma encarnação de si próprio,
reconhecido e vivendo em um belo apartamento no Rio. Com todas as suas
precariedades, não poucas, o filme marotamente lida com clichês da tradição
musical – e, por tabela, com a questão racial, com duas novas duplas surgindo,
em que ao invés de um negro e uma branca como antes, tem-se agora de um lado
dois negros bem sucedidos e do outro dois brancos sem conseguir emprego, sendo
de longe mais bem interpretado que o pretensioso primeiro “filme sério” do
realizador, Cidade Ameaçada, do ano
anterior. Com um roteiro repleto de
achados e facilidades toscas, tanto quanto a a maior parte dos cenários, destaca-se
no elenco Ankito, que vivencia com afinco as diversas facetas de seu personagem
e que, infelizmente, sofreria um grave acidente de trabalho durante a produção
que lhe provocaria sérios reveses na carreira. Embora o filme tente capitalizar
em cima da nova capital, sua participação nele é bastante modesta, e
praticamente se restringindo a um cenário de número musical ao início e a forma
preconcentuosa com que o personagem de Ankito é tratado até próximo do final,
candango, alcunha criada para os profissionais que ergueram a cidade. Tudo isso
em um período no qual o cinema, como a música, tirava partido da nova capital
federal (Samba em Brasília, de Watson
Macedo, é do mesmo ano). Herbert Richers Prod. Cinematográficas. 102 minutos.
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