Filme do Dia: Ala-Arriba (1942), José Leitão de Barros
Ala-Arriba! (Portugal, 1942). Direção:
José Leitão de Barros. Rot. Adaptado: Alfredo Cortez, baseado nos poemas de
Augusto de Santa-Rita. Fotografia: Octávio Bobone, Tavares da Fonseca &
Salazar Dinis. Música: Ruy Coelho. Montagem: Jacques Saint-Leonard. Cenografia:
Raul Faria da Fonseca & Leite Rosa. Com: João Moço, Elsa Bea-Flor, Luís Pinto, Ilídio Rocha Silvestre, Maria
Olguim, Nicolau, Madalena Vilaça.
Numa aldeia de pescadores, a jovem Julha
(Bea-Flor), filha do velho pescador de alto-mar Ti Saramago (Silvestre) se encontra apaixonada pelo sardinheiro João
Moço (Moço), considerado de categoria inferior. Seu noivado é oficializado. Um
jovem também deseja Julha e acaba flagrando João Moço nos braços de uma cigana
(Vilaça). Ele arranja testemunhas e logo João Moço cai em desgraça, sendo
expulso de casa pelo pai e destituído da pesca em alto-mar por seu ex-futuro
sogro. Julha não dessiste de seu amor. O
pároco local (Pinto) lhe dá animo para continuar a viver e lutar pelo que quer.
Ela decide ir ao encontro de João Moço e eles juram amor entre si. Num dia de
temporal, Ti Saramago e um grupo de pescadores se encontram em perigo de vida.
Com risco de morrer, João Moço lidera um grupo de salvamento e se torna herói,
sendo recebido novamente em casa e perdoado por seu pai. O jovem casal
finalmente se casa.
Talvez o que mais chame atenção nesse
filme seja o papel ambíguo do padre que surge em seu prólogo, tanto como narrador
do que se seguirá, como igualmente comentador sobre a própria produção do
filme, alertando sobre as limitações dramáticas dos atores amadores do povoado
que foram recrutados para a produção. O que não deixa de ser relativamente
descabido, já que mesmo com as atuações marcadamente diferenciadas entre
amadores e profissionais, a sua reunião ao final das contas torna-se relativamente orgânica. Ainda que as filmagens em locação em uma vila pesqueira
possam sugerir uma antecipação de A
Terra Treme (1948), de Visconti, o registro fortemente dramático, o modo
que os cenários naturais são utilizados e a própria fonte de inspiração para o
roteiro sugerem algo bastante distinto. O que poderia haver de espontâneo nos
amadores é drenado ao lhes pedir o que não poderiam oferecer, que é justamente
a dramaticidade comum à sua época; que lhes façam viver personagens que, apesar
de terem ocasionamente o próprio nome deles, deveriam se encontrar muito
distante de si mesmos e das situações de seu cotidiano. Porém. a interpretação
exagerada da reação da aldeia ao
acidente com seus entes amados soa simpática, ao provocar um efeito
involuntariamente anti-naturalista. A influência do cinema de montagem
soviético, curiosamente, faz-se presente em boa parte da cinematografia
portuguesa da época, aqui sobretudo numa seqüência de planos que não duram mais
que frações de segundos. Ainda mais curioso é se perceber que mesmo produzido
no auge do salazarismo, o filme retrata já de início a rivalidade entre
pescadores do alto e os que pescam sardinhas, portanto apresentando um povo
português dividido em suas próprias hierarquias, algo longe do efeito
simplesmente anedótico de tais rinhas, assim como dos momentos de bucólica harmonia presentes no bem mais fraco
As Pupilas do Sr. Reitor. Aliás o
personagem do padre aqui tem uma função bem semelhante a do padre naquele. Além
de ser o narrador é ao mesmo tempo
discreto instrumento – aqui mais do que lá – que estimula o desenlace do
qüiproquó do casal apaixonado. Tal momento se dá quando o padre visita Júlia e
ao escutar os gritos dos pescadores de ala-arriba, traça um paralelo entre as
dificuldades da vida e o da comunidade em subir com o barco ladeira acima,
momento esse retratado anteriormente no filme. Tóbis Portuguesa. 94 minutos
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