Filme do Dia: Lampeão (1936), Benjamin Abrahão

 


Lampeão (Brasil, 1936). Fotografia: Benjamin Abrahão.

Utiliza-se o título original dessa produção, por muito tempo confiscada e esquecida nos porões do Estado Novo, após provocar breve clamor em suas exibições (serve como matriz para as breves imagens que até hoje, oito décadas e meia após seu lançamento) emergem nos programas de TV ou em filmes sobre a temática (tanto Corisco e Dada, quanto principalmente O Baile Perfumado fazem uso delas). Porém, é quase uma convenção, pois não se trata da versão original lançada nesse ano, nem tampouco a que surgiu na década de 50, partindo da descoberta do que havia restado da cópia original, já que nas cartelas ao início se adverte que quatro novos minutos foram acrescentados a essa, embora provavelmente seja dessa que mais se aproxime. Gestos do cotidiano emergem, como o próprio Abraão sorvendo água do cantil de um cangaceiro (cena que será incorporada à ficção da produção pernambucana) ou outras que mal se acredita que façam parte do mesmo, tal a textura da imagem e os movimentos de câmera demasiados distintos – algo a ser ocasionalmente revisto, inclusive. E ainda uma cangaceira trabalhando em sua máquina de costura em meio ao bastante improvisado acampamento – provavelmente Severina Dadá, que seria uma das poucas sobreviventes do massacre do grupo, e se tornaria figurinista da TV Globo. Observa-se um momento de culto, rezas e sinais das cruzes, seguidos pelo que parece ser o sacrifício de um cachorro, e um banquete com farta carne de um animal (porco?) sendo preparado e a carne sendo servida em generosas cuias de barro. Até então, nada faz-nos crer no protagonismo de Lampião no grupo, que surge sempre em meio aos companheiros, e ausente de diversos planos. Abraão parece engolir, ao lado do líder, um copo de bebida e uma das mais difundidas imagens é a da encenação de ataque do bando, inclusive com o que seria um deles sendo alvejado no tiroteio. As caras sorridentes da maior parte do grupo e o próprio ângulo em que tudo é filmado, oposto ao que se encontram, para os flagrar frontalmente, já atestaria a encenação por si só. Na verdade o que se torna mais difundido é um breve trecho (e o mais belo!) dessa sequencia em que o grupo caminha em passos comedidos rumo a câmera com Maria Bonita com um revólver direcionado à própria. O protagonismo do casal Lampião & Maria Bonita torna-se mais saliente por volta da metade do filme. Lampião é flagrado lendo e passando uma infinidade de correntes para Maria Bonita adornar seu peito, assim como seu sortido chapéu. E é essa parte do embelezamento mútuo do casal, com Maria Bonita também cuidando dos cabelos e da roupa de seu homem para o forró que se seguirá, outra imagem icônica, que dita a tônica final desse histórico curta-metragem, seguidas de um discurso à câmera, como se ela pudesse ouvi-lo e imagens do próprio Abrahão com os cangaceiros. E mais algumas imagens esparsas, que provavelmente fazem parte do material que foi encontrado mais recentemente. E um plano final, desnecessário, que inclui as cabeças dos cangaceiros exibidas como troféu, que obviamente não compõem parte do material do curta original. Aba Film/Instituto Chico Albuquerque. 14 minutos e 14 segundos.

 

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