Filme do Dia: Quo Vadis? (1924), Gabriellino D'Annunzio & Georgy Jacoby

 


Quo Vadis? (Itália, 1924). Direção Gabriellino D’Annunzio & Georgy Jacoby. Rot. Adaptado D’Annunzio & Jacoby, a partir do romance de Henryk Sienkiewicz. Fotografia Curt Courant, Alfredo Donelli & Giovanni Vitrotti. Cenografia R. Ferro & G. Spellani. Figurinos Armando Brasini. Com Emil Jannings, Elena Sangro, Rina De Ligouro, Lillian Hall-Davis, Andrea Habay, Raimondo Van Riel, Gildo Bocci, Gino Viotti, Alphons Fryland, Bruno Castellani.

Nero (Jennings), circundado por um grupo de bajuladores, refastela-se com o banquete de pessoas jogadas em uma fonte repleta de moreias. Nero fica a par da lei que promulga que quem se declarar cristão ou praticar essa religião seja punido com a morte. Nas catacumbas, os cristãos preparavam a queda do Império Romano. A nova ordem é tornada pública. Licia (Hall-Davis) é ordenada a ir ao Palácio do César, encontrar-se com o general Marcus Vinicius (Fryland). A escrava etíope que cuidava do filho de Nero, Livio, e da imperatriz Poppea (Sangro), descuida-se e o perde de vista. Quando observa a brutalidade com que Vinicius corteja Licia, Nero a toma para si. Licia foge do bacanal. E, nos jardins do palácio, reencontra um dos seus, Ursus (Castellani), que combina como irá tirá-la de lá. Nero acorda assustado com as alucinações que teve. Uma adivinha avisa a Nero que os cristãos estão lhe preparando uma cruz. Nero descobre onde Licia se encontra refugiada e lhe oferece todos os tesouros do mundo. Ela recusa a oferta  e quando esse lhe indaga de onde vem sua força, Licia alega que é de Deus. O pequeno Livio é acometido por um mal. Enquanto isso, Vinicius desespera-se por não ter Licia para si. E Cilone (Viotti), sendo muito bem pago, diz que sabe como leva-lo até ela. Vinicius ganha a contenda, mas fica ferido no embate, sendo tratado por Licia. Nero executa sua lira, enquanto Roma arde em chamas. A multidão enfurecida enfrenta os guardas do palácio para executar Nero. Nero pretende entregar Tigellinus a plebe enfurecida. Cilone aconselha Nero a por a culpa nos cristãos. Esses são crucificados e incinerados. E Cilone enlouquece diante do espetáculo. No cárcere, Licia reencontra seu amor. Outro grupo de cristãos é levado a arena romana, para gladiar contra os leões. Cilone surge em meio ao espetáculo, em arena lotada, e fala que a culpa toda é de Nero. Nero flecha-o fatalmente. No último espetáculo do coliseu, Licia consegue escapar viva. Uma revolta explode e Galba é aclamado imperador. Ursus consegue salvar Licia de um novo martírio que Nero pretende lhe impor, segurando o touro pelo chifre. Tropas de Galba invadem o coliseu, e o público se revolta contra Nero. Nero é salvo por Vinicius, que o leva às catacumbas. Nero se suicida antes que as tropas cheguem até ele.

Poupado de ter tido igualmente sua versão contemporânea por Hollywood (teria que esperar o renascimento do gênero em cores e tela larga na década de 50) pelas mãos de um DeMille, aqui se tem uma que é originária do país que herdou essa história e a traduziu pioneiramente em termos de imagens cinematográficas desde a segunda década do meio. Como a sua contraparte do outro lado do Atlântico, tais épicos eram um espetáculo propício para que se explorasse a sensualidade,  na brutalidade da concupiscência da corte, o sacrifício da mulher jogada nua às moreias ou a sombra desnuda de uma mulher a dançar. E, é claro, também de figurinos e extras. E cai como uma luva ao histrioinismo da crescente fama internacional de Jannings. E, sem dúvida, no caso italiano, tais filmes também alimentavam a sede de empoderamento histórico que o regime fascista pretendia reviver no passado, embora tal relação se encontre bastante distante de automática e cada caso seja um caso. Inclusive nos gestos de saudação ao povo, vez por outra aqui enfatizados. E, claro, não deixará passar ao largo o momento mesmo em que Nero, influenciado poro um verso de Homero que lhe é lido, tem a sua ideia para os versos, que criará inspirado pelo  fogo sobre Roma. Fogo esse que ele próprio mandou que Tigellinus executasse.  A luta entre Ursus e Cretone deveria ser uma das atrações para o público italiano, já familiarizado e devoto do personagem de Maciste. Já a figura de Cilone é como o pequeno diabo a articular situações e personagens e esse filósofo irá inclusive incutir ideias em Nero. Destaque para o plano de frações de segundo, que apresenta o que seria os ossos e pedaços de carne de um corpo humano devorado pelos felinos. E que bem poderia ser um flerte macabro para os espectadores que sabiam do acidente fatal envolvendo um dos extras e os leões na versão de 1913. O seio desnudo de Licia faria escola em ao menos duas produções de um fascismo dos tempos sonoros. E Nero escapará de ser trucidado como sua encarnação moderna italiana de líder o será. Provavelmente deve ter sobrevivido incompleto, o que talvez parcialmente explique sua confusa narrativa – talvez mais confusa que a do filme de 1913, inclusive! Jacoby como co-diretor foi uma imposição alemã, diante da necessidade de verbas para complementar o orçamento dessa grandiloquente produção.|Unione Cinematografica Italiana. 89 minutos.

 

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