Filme do Dia: A Patriota (1979), Alexander Klüge

 


A Patriota (Die Patriotin, Al. Ocidental, 1979). Direção: Alexander Kluge. Rot. Original: Christel Buschmann, Alexander Kluge & Willi Segler. Fotografia: Guenter Hoermann, Werner Lüring, Thomas Mauch, Jörg Schmidt-Reitwein. Montagem: Beate Mainka-Jellinghaus. Com: Hannelore Hoger, Dieter Mainka, Alfred Edel, Alexander von Eschwege, Beate Hole, Kurt Jürgens, Willi Muench, Marius Müller-Westernhagen.

Leva-se não menos que uma hora e quarenta dois minutos, até que Kluge exponha a sua perspectiva (impossível) de história, aquela história que não se encontra nos livros de história das bibliotecas, mas que reside com os mortos. A história que se encontra nas bibliotecas é a dos vencedores, até mesmo porque os que a transmitiram necessitavam se encontrar vivos. E é sob a forma de colagem, através dos olhos de uma professora de história da escola secundária (vivida pela atriz Hannelore Hoger, recorrente em sua filmografia e lembrada sobretudo por Os Artistas no Centro do Picadeiro:Perplexos) que Kluge se detém sobre o passado e o presente da República Federal Alemã, num momento em que basicamente todos os nomes mais influentes do Novo Cinema Alemão também o fazem. Algo, em grande parte, decorrente dos eventos radicais que levaram a uma polarização crescente entre representantes da esquerda e direita no país, e com a qual Kluge e outros realizadores do movimento se detiveram no pouco didático Alemanha no Outono, realizado no ano anterior. Fassbinder havia iniciado a sua trilogia sobre a República Federal, Schlöndorff lança O Tambor no mesmo ano dessa produção e Helma Sanders-Brahms, Alemanha, Mãe Pálida, no ano seguinte. Como em Godard, as demarcações entre ficção e documentário tornam-se equívocas e se pode pensar na categoria ensaio para um cinema que vai da mais pura encenação com atores até a foto fixa, imagens de arquivo, narração over e intervenções musicais em dimensão complexa e nem sempre atreladas diretamente à imagem. Ao contrário de Godard, no entanto, aparentemente se faz bem mais uso de material iconográfico e dessa sobreposição de texturas que aquele, que parece incorpora-las grandemente em sua própria encenação. Aqui a encenação soa relativamente tímida, amadora, mesmo quando transborda para um universo factual, como nas cenas filmadas em pleno congresso social-democrata sob a então liderança de Helmut Schmidt. Em alguns poucos momentos a sua postura crítica soa quase didática, ao menos diante de um realizador que, como Godard, preza pela indefinição de uma postura crítica francamente estruturada, tal como quando contrapõe o lema otimista do partido social-democrata com a voz over com a afirmação sobre a extinção dos cursos de história e sociologia a serem acoplados sob a rubrica de “estudos sociais”, disciplina que parece particularmente consonante com os períodos de maior autoritarismo. Como em seu filme anterior, a atitude de Gabi Teichert é a da completa perplexidade e falta de articulação de um discurso coerente diante da avalanche de hipocrisia e descaso para com a história presente e passada do país – diante de uma manifestação organizada por jovens e fortemente reprimida pela polícia numa loja de departamentos sobra o comentário irônico de que “as ofertas devem continuar”. A presença da atriz do filme, observada como mera observadora da ação violenta lembra, mais que qualquer outro momento do filme, uma estratégia similar a utilizada por Haskell Wexler em seu Dias de Fogo. Sim, o filme já aponta para o recrudescimento crescente das forças econômicas liberais e maior conservadorismo na política e, ainda que insconcientemente, para o arrefecimento de uma resposta à altura por parte das esquerdas. No plano da imagem, texturas das mais diferenciadas, do rebuscamento de algumas imagens em cores a imagens em p&b que parecem prematuramente envelhecidas se alternam, gerando situações que no limite não mais se sabe tratar de ser imagem de arquivo ou realizada pela própria produção do filme.  Kairos Film/ZDF. 121 minutos.

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