Filme do Dia: Walden (Diaries, Notes and Sketches) (1969), Jonas Mekas
Walden (Diaries, Notes and Sketches)
(EUA, 1969). Direção, Fotografia e Montagem: Jonas Mekas.
Quem atravessar esse tour de force do cinema de Mekas, um
estilo aparentemente criado na própria falta de estilo mais específico (ao
menos quando comparado a alguns de seus companheiros ou congêneres de New
American Cinema como Brakhage ou Warhol) será brindado com alguns momentos
tocantes, como o tributo efetivado a recém-falecida cineasta Marie Menken ou
simplesmente a fúria de diversão infantil transformada em um momento de criação de imagens através da montagem,
ainda que sob o peso de certa aridez da autocondescedência com que filma
apaixonadamente o próprio cotidiano que vivencia, assim como o de seus próximos
ou não (caso do cineasta Carl Th. Dreyer) célebres. A referência ao universo
mais próximo está sempre ao alcance da mão, com relances do cineasta Gregory
Markopoulos ou da estréia do Velvet Underground com a presença de Warhol, mas
sobretudo de Stan Brakhage, com que Mekas compartilha por alguns dias a
residência da família, isolada em meio a neve, observando, por exemplo, esse
com um exemplar de Film Culture, a
revista editada por Mekas, destinada sobretudo a divulgação do cinema
experimental. Ocasionalmente a música se torna aliada numa relação que reforça
a ironia sugerida por suas cartelas, tal e qual a melodia épica que acompanha
as imagens que seguem os filhos de Brakhage, no que havia sido nomeado como
“Visita a terra dos castores” e se observa por exemplo, em meio a brancura da
neve, pequenos círculos pretos de cocô de coelho. Tudo é observado através de
uma forte tremedeira da câmera, assim como aceleração das imagens, que mal
divisa o rosto de quem filma. Em muitas raras passagens a voz de Mekas,
bastante carregada por seu sotaque lituano, indaga-se de forma interessante se
aos poucos não estaria perdendo tudo que havia trazido consigo do exterior. Na
sequencia da visita ao cineasta Hans Richter, numa casa de campo relativamente
próxima a uma estrada, observa-se com muita intensidade a colagem de imagem e
sons que embora captados todos durante a visita, não obedecem a uma sincronia,
complexificando a relação de fragmentação já demasiada das imagens. Pouco
depois a voz de Mekas se direciona diretamente a seu espectador, como numa
espécie de carta de intenções de seu cinema, um cinema sem suspense, tragédia
ou drama, realizado apenas da observação de pequenos gestos do cotidiano que
logo não mais ali estarão. E também já demonstra uma antecipação da possível
recusa desse espectador por essas imagens que afirma ter feito para si próprio
e alguns outros e, desnecessário dizer, que ele poderá observa-las igualmente
se assim pretender. E, de forma algo antecipadoramente apocalíptica, Mekas
comenta que no futuro não haverá pequenas cidades próximas do Oceano e talvez
nem mesmo árvores, ao menos na quantidade hoje existente enquanto acompanha
brincadeiras triviais no Central Park. Noutros momentos, a relação entre seus
comentários e a imagem partem de uma perspectiva anacrônica, observando de
forma algo derrisória o passeio que haviam empreendido, ele, o irmão Adolfas e
algumas pessoas próximas a Nova Jersey, com uma televisão alemã os
acompanhando. Pelo menos três cerimônias de casamento são registradas, duas
delas com maior intensidade – uma de um grupo bastante elitizado e com rituais bem
convencionais, outro que termina em uma alucinada festa pop e uma terceira,
mais vislumbrada que de fato detalhada, do crítico que escreveu bastante sobre
o New American Cinema, P. Adams Sitney. É visível que Mekas incorpora elementos
de curtas seus como Hare Krsna, Notes on the Circus e Cassis,
todos de 1966. Próximo ao final do filme, que é dividido em seis rolos, sendo
que ao início de cada um se observa novamente o título do mesmo, há um segmento
“para John & Yoko”, em que se observam cenas do célebre bed-in realizado
pelo casal em 1969 em Montreal, ao som de Give
Peace a Chance, no estilo de Mekas, com câmera tremida e por uma câmera não profissional, embora
apresentando situações observadas em outros registros do evento. 167 minutos.
Jonas Mekas é tão delicado... amo muito
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