O Dicionário Biográfico de Cinema#29: John Cleese

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John Cleese n. Weston-Super-Mare, Inglaterra, 1939

Com ubiquidade, e o grande sucesso de A Fish Called Wanda [Um Peixe Chamado Wanda], parece que John Cleese possa passar como alguém amável, eventual, decente e alegre. Ele está em tantos comerciais; e, para atores, essas empreitadas soam como um senso comum de alta voltagem. Ele é conhecido como o co-diretor de uma companhia que faz filmes de treinamento cômicos. Tornou-se relaxado nos programas de entrevistas - mesmo loquaz, e à época de Wanda, conseguia até mesmo manter um flerte galante com Jamie Lee Curtis. Ao todo, houve um esforço, de modo algum inexpressivo, de sugerir que Cleese é um sujeito bom e aborrecido.

Eu não fui tocado. Esse é um dos autênticos loucos que a imagem em movimento nos deu. Isso é desespero, o desejo crônico de matar; isso é a fúria com que tem tentado lidar com as mulheres; é a arrogância que entra no meio das brincadeiras. Esta é a mandíbula de ferro da ordem e da lei, que sabe que ele começará a falar sem sentido. Dificilmente se tem uma presença cinematográfica que tão instantaneamente evoque os urros  de gargalhadas que são conquistadas pela tortura diária. E, naturalmente, a grandeza de Cleese não está em Wanda, ou mesmo no Mont Phyton; e sim em Fawlty Towers, um inglês tão derrotado quanto Hastings, um hotel de humilhação e mortificação. Se alguém for tentado em ver humor nesse patético homenzinho, Cleese é o corretivo. Não há nada mais divertido que um homem grande, tentando inspirar ordem ao mundo. Basil Fawlty é a tragédia do fascismo, e Cleese é um dos grandes  clowns explosivos das telas.

Fawlty Towers não durou tanto assim, nem tampouco vai ao ar muito frequentemente. Foi abençoado com uma esposa, Sybil (Prunella Scales), de tão sublime sabedoria e estupidez que Basil sabia que os deuses apontavam para si. O hotel é repleto de garçons espanhóis, coronéis britânicos, espirais colossais de vinte e cinco minutos de mal entendidos e uma balaustrada severamente hábil em quebrar pescoços. Há também o subtexto de Polly (uma americana chamada Polly!), a empregada, vivida pela co-roteirista e ex-mulher de Cleese, Connie Booth, tão deliciosa que o enlouquecido e castrado Basil, não pode percebe-la. Sendo que sua presença é uma provocação a mais para matar a eterna Sybil. Esses episódios são algumas vezes tão lancinantes quanto as reportagens de horrores e desastres naturais. Até mesmo Buñuel pode perder o fôlego ao ver Cleese, a sua cabeça rígida, mas girando, seus olhos penetrando o crânio ao saberem quão astutamente tem certeza do desastre.

Cleese encontrou Booth e Terry Gilliam, enquanto excursionava pelos Estados Unidos com um show cômico reunido por estudantes de Cambridge ao início dos anos 60. Escreveu então para a TV, antes de se tornar o arrimo da barraca/ministro/Frankenstein para a linha de montagem do Mont Phyton. Esteve em todos os filmes do grupo, naturalmente, que são trabalhos menores quando comparados aos programas da TV. E atuou em diversos filmes que não são do grupo: The Bliss of Mrs. Blossom [Um Marido de Reserva] (68, Joe McGrath); The Magic Christian  [Um Beatle no Paraíso] (70, McGrath; The Statue [A Estátua] (71, Rod Amateau); Time Bandits [Os Bandidos do Tempo] (81, Gilliam); Privates on Parade (82, Michael Blakemore); Yellowbeard [O Pirata da Barba Amarela] (83, Mel Damski); Silverado (85, Lawrence Kasdan); Clockwise [Uma Corrida Contra o Tempo] (86, Cristopher Morahan); e Splitting Heirs [Quem Não Herda Fica na Mesma] (93, Robert Young).

A maior parte desses filmes são tão tediosos e inconsequentes, que Wanda surgiu como uma especial surpresa. Foi como se Cleese tivesse se dado conta que há uma expectativa nos filmes, trabalhando no roteiro e como produtor-executivo, assim como ator principal. De toda forma, é difícil que encontre um papel que se case com Basil Fawlty - talvez o Príncipe Charles pudesse tentar.

O Cleese dos anos recentes tem parecido perdido. Ele nunca foi verdadeiramente um ator sem o aparato de Fawlty Towers ou do zoo Python. Por vezes tem se tornado muito solene em seus vídeos auto-ajuda, e de uma forma geral  ele tem aparecido como um homem alto, com uma postura sem graça, vagando: Frankenstein [Frankenstein de Mary Shelley] (94, Kenneth Branagh); The Jungle Book [O Livro da Selva] (94, Stephen Sommers); Fierce Creatures [Ferocidade Máxima] (97, Robert Young e Fred Schepisi), uma sequencia de Wanda, porém muito ruim; Parting Shots (98, Michael Winner); The Out-of-Towners [Perdidos em Nova York]  (99, Sam Weissman); como "R" em The World Is Not Enough [007 - O Mundo Não é o Bastante] (99, Michael Apted); Isn't She Great? [Ela é Inesquecível] (00, Andrew Bergman); Quantum Project (00, Eugenio Zanetti); Rat Race [Tá Todo Mundo Louco! Uma Corrida por Milhõe$] (01, Jerry Zucker); Harry Potter and the Sorcer's Stone [Harry Potter e a Pedra Filosofal] (01, Chris Columbus).

Ele trabalha bastante nos dias de hoje, mas a triste verdade pesa mais profundamente - esse grande homem não é mais divertido: em um curta, Taking the Wheel (02, David Ackerman); Scorched [Quem Vai Pagar o Pato?] (02, Gavin Grazer); The Adventures of Pluto Nash [Pluto Nash] (02, Ron Underwood); Harry Potter and the Chamber of Secrets [Harry Potter e a Câmara Secreta] (02, Chris Columbus); Q em Die Another Day [007 - Um Novo Dia Para Morrer] (02, Lee Tamahori); Charlie"s Angels: Full Throttle [As Panteras: Detonando] (03, McG); Around the World in 80 Days [Volta ao Mundo em 80 Dias: Uma Aposta Muito Louca] (04, Frank Coraci).

Emprestou sua voz para animações: Valiant [Valiant, um Herói que Vale a Pena] (05, Gary Chapman); Charlotte's Web [A Menina e o Porquinho] (06, Gary Winicki); Man About Town [Um Cara Quase Perfeito] (06, Mike Binder); Shrek the Third  [Shrek Terceiro] (07, Chris Miller e Raman Hui); Igor (08, Anthony Leondis); mas ele foi ele mesmo e dolorosamente honesto como um vencedor de Prêmio Nobel em The Day the Earth Stood Still [O Dia em que a Terra Parou] (08, Scott Derickson); The Pink Panther 2 [A Pantera Cor de Rosa 2] (09, Harald Zwart); Planet 51 [Planeta 51] (09, Jorge Blanco).

Texto: Thomson, David. The Biographical Dictionary of Film. Londres: Knopf, 2010, pp. 1845-1853.


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