Filme do Dia: O Que Terá Acontecido a Baby Jane (1962), Robert Aldrich


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O Que Terá Acontecido a Baby Jane? (What Ever Happened to Baby Jane, EUA, 1962). Direção: Robert Aldrich. Rot. Adaptado: Lukas Heller, a partir do romance de Henry Farrell. Fotografia: Ernest Haller. Música: Frank De Vol. Montagem: Michael Luciano. Dir. de arte: William Glasgow. Cenografia: George Sawley. Figurinos: Norma Koch. Com: Bette Davis, Joan Crawford, Victor Buono, Marjorie Bennett, Anna Lee, Maidie Norman, Wesley Addy, Julie Allred, Dave Willock.
Jane Hudson (Davis) teve na infância (Allred) o estrelato no vaudeville, acompanhada pelo pai (Willock). Sua irmã, Blanche (Crawford), que teve carreira promissora no cinema dos anos 20, hoje vive com ela na mansão decadente que lhes restou da época da fama e dinheiro, aleijada e sendo maltratada por Jane. A situação se torna ainda mais crítica quando Jane tem sonhos de retornar ao estrelato, contando com a ajuda do músico frustrado Edwin (Buono). Porém,  a diarista que as visita semanalmente, Elvira (Norman), desconfia que há algo errado na casa.
Seu feliz título prenuncia com notável precisão o caráter sensacionalista de uma interrogação mórbida sobre o momento presente de estrelas que há muito tempo sumiram do interesse midiático. O uso eloquente do zoom – que começava a viver seus dias de glória no cinema – pôde ser um equivalente visual à altura do extravagante drama no estilo Grand Guignol que Aldrich conscientemente trabalhou em chave exageradamente patética, radicalizando o que havia sugerido em filmes como o mais sutil e interessante Folhas Mortas (1956), com a mesma Crawford. É verdade que esse filme não poderia ter existido sem que antes viesse não apenas essa produção mas, sobretudo, Crepúsculo dos Deuses (1950), de Billy WilderPsicose (1960), de Hitchcock. A personagem histriônica vivida por Davis, que teria sua carreira marcada por essa produção de enorme sucesso e, a partir de então, invariavelmente realizaria papéis similares, chegando a ser convidada pela Hammer britânica para dois filmes (Nas Garras do ÓdioO Aniversário), é uma mescla de estrela no ostracismo à espera de um reverso em sua carreira como a Norma Desmond de Wilder e psicopata crescentemente violenta, zelosa e obsessiva em manter sua vida paralela longe de tudo e de todos como o Norman Bates de Hitchcock. Para além do que o filme provavelmente nem sequer teria sido elaborado se não houvesse tido como precursor a iconoclastia que traz o exagero da perversão aos limites do cômico do mestre do suspense. E a súbita “intromissão” de Edwin na residência das ex-estrelas, mesmo que através de um convite de jornal de Jane, é evocativa da do roteirista fracassado de Crepúsculo dos Deuses, assim como o interesse dessa pelo homem mais jovem que também lhe parece ser um aceno de passaporte ao retorno de sua carreira. Mesmo nem de longe tão perverso em explorar o passado e as ligações das próprias divas em questão com o mundo do cinema quanto o filme de Wilder, Aldrich partiu da premissa bastante conhecida nos bastidores da rivalidade mútua existente entre Davis e Crawford, sendo que a última não repetiria a dose no menos interessante e derivativo Com a Maldade na Alma, sendo substituída por Olivia De Havilland. Diga-se de passagem que apesar dos holofotes terem sido direcionados sobretudo para Davis, Crawford, que não era exatamente conhecida por sutilezas na interpretação, consegue se sair bem melhor, evitando os excessos e se tornando apenas um instrumento de reação de sua algoz. Ao final, com o auxílio de uma maquiagem relativamente equilibrada, novamente em oposição a Davis, tem-se o crescente direcionamento dela à morte, embora se jogue sabiamente com a inconclusão – não se sabe se de fato ela morreu, já que se finda  com as atenções ainda voltadas somente para a Jane de Davis. Com todos os méritos que o filme possua, a construção algo chapada das personagens e a visão excessivamente naturalista e caricata dos mesmos, como é o caso igualmente de Edwin e sua mãe, faz com que praticamente todas as personagens de maior destaque no filme possuam uma aura freak, sendo a compreensão nuançada dos desejos e frustrações humanas relegada a segundo plano, ao inverso de Folhas Mortas, diminuindo consequentemente o grau de empatia potencial que venhamos a sentir por eles. Em oposição, os personagens mais secundários ganham tinturas de normalidade e bonomia, quase como se Aldrich sugerisse que assim são percebidos justamente por não adentrarmos em sua intimidade. O elenco de apoio, aliás, é um dos grandes trunfos do filme, com destaque para a obstinada empregada vivida por Maidie Norman e pelo interessante personagem de Buono, que consegue impregnar o seu Edwin de algo além da unidimensionalidade das personagens principais e também daquela vivida por sua irritadiça e super-protetora mãe. Se a cena em que Crawford descobre uma ratazana morta como prato principal de seu almoço se tornou célebre em antologias do gênero, a talvez mais surpreendentemente brutal seja a que a irmã a espanca, inclusive chutando-a várias vezes. National Film Registry em 2021. The Associates & Aldrich Co.-Seven Arts Pictures-Warner Bros. Para Warner Bros. 134 minutos.

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