Filme do Dia: Quando Só o Coração Vê (1965), Guy Green


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Quando Só o Coração Vê (A Patch of Blue, EUA, 1965). Direção: Guy Green. Rot. Adaptado: Guy Green, a partir do romance Be Ready With Bells and Drums, de Elizabeth Kata. Fotografia: Robert Burks. Música: Jerry Goldsmith. Montagem: Rita Roland & Hal G. Davis. Dir. de arte: George W. Davis & Urie McCleary. Cenografia: Henry Grace & Charles S.Thompson. Com: Sidney Poitier, Elizabeth Hartman, Shelley Winters, Wallace Ford, Ivan Dixon, Elisabeth Fraser, John Qualen, Kelly Flynn.
Garota pobre e cega explorada pela mãe Rose-Ann (Winters) e pelo avô alcoólatra (Ford), Selina (Hartman) consegue o apoio de um homem negro que se interessa e se aproxima dela, Gordon Ralfe (Poitier). Ela se apaixona por ele, que reage de forma ambígua. Seu irmão, Mark (Dixon), desaprova os cuidados que Gordon dispensa a uma garota branca. Rose-Ann possui planos de abandonar o pai e ir morar com Sadie (Fraser), sua melhor amiga e que também destrata a garota.
Demasiado óbvio na composição de seus personagens e situações, seja sua ingênua e impressionável heroína, seja a figura vilanesca de mãe vivida por Winters, ou ainda o paternalismo com que Gordon trata a mesma enquanto retardada e também a personagem do irmão de Gordon, que apresenta, de forma um tanto esquemática, o que seria a postura negra engajada do período. Porém o que de longe soa mais embaraçoso no filme é sua possibilidade de amor inter-racial somente a partir da perspectiva de uma garota branca e cega. Trata-se de uma tradição inglória de sentimentalismo que remete, mesmo que evidentemente sem incluir a questão racial, ao  Luzes da Cidade (1931), de Chaplin. A inoperância e fragilidade da garota cega chega a ser patética, quando ela apenas chora e se desespera durante um temporal que a flagra no parque, mesmo tendo o costume de por lá andar com seu protetor.  Lembra,  guardadas as devidas proporções, as vítimas de bom coração em ambientes completamente hostis dos melodramas de Griffith ou Frank Borzage. Poitier e Hartmann protagonizaram o que aparentemente foi o primeiro beijo inter-racial da história do cinema norte-americano. Shelley Winters comenta, a determinado momento, que nem ela nem sua amiga são Marilyn Monroe o que não deixa de ser curioso, demonstrando que Monroe continua a ser uma referência de beleza mesmo depois de morta, assim como pelo fato  de Winters ter sido próxima de Monroe no início da carreira de ambas, tendo inclusive chegado a dividir quarto. Noutro momento Winters chama ironicamente seu velho pai de Ligeirinho, o rato hiper-veloz dos desenhos da Warner. Se o seu final, parcialmente inconclusivo, inclusive em relação a explicitação dos sentimentos de Gordon por Selina, pode ser considerado uma saída verossímil e razoável, algo que acompanha quase todos os personagens vividos por Poitier até então, também se torna um bom escape para a negação de um comprometimento de um casal inter-racial de fato, tendo a cena do beijo sido excluída quando da apresentação do filme nos estados sulistas. E o racismo implícito de várias saídas do roteiro, inclusive uma humilhante afirmação de Gordon/Poitier que quase chega a refutar quando ela afirma ele ser bonito, dizendo que a maior parte das pessoas pensam o contrário, encontra-se presente, talvez de forma involuntariamente condizente com a proposta do filme, na opção do péssimo título brasileiro. Ford morreria no ano seguinte ao do lançamento do filme, e Hartman, aqui em sua estreia no cinema, suicidaria-se aos 43 anos em 1987. A insegurança da personagem ao se movimentar, verossímil dada a forma como foi criada pela família, foi acentuada pela interpretação da atriz usando lentes de contato que a impediam de fato de ver. MGM. 105 minutos.


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