Filme do Dia: O Retrato de Jennie (1948), William Dieterle

O Retrato de Jennie (Portrait of Jennie,EUA, 1948). Direção: William Dieterle. Rot. Adaptado: Paul Osborne, Peter Berneis & Leonard Bercovici, a partir do romance de Robert Nathan. Fotografia: Joseph H. August. Música: Dimitri Tiomkin. Montagem: William Gordon. Dir. de arte: J. McMillan Johnson. Cenografia: Claude E. Carpenter. Figurinos: Lucinda Ballard. Com: Joseph Cotten, Jennifer Jones, Ethel Barrymore, Lilian Gish, Cecil Kellaway, David Wayne, Albert Sharp, Henry Hull.
Nova York, 1934. Eben Adams (Cotton) é um artista idealista no inverno nova-iorquino sem dinheiro sequer para quitar seu aluguel. A situação muda de figura quando conhece a jovem Jeennie (Jones), que desenha o retrato e apresenta a Srta. Spinney (Barrymore), comerciante de arte, que percebe nos traços do desenhista algo ausente no que apresentara anterioremente a ela, demasiado destituído de vida e clichê. Ele volta a encontrar Jennie em várias ocasiões. Aos poucos Adams fica sabendo que Jennie é uma garota que vivera em outra época e de uma de suas professoras do internato de freiras, Mary of Mercy (Gish) onde foi morar após a morte de ambos os pais trapezistas em um acidente de circo, que se encontra morta.  Ao saber que ela morrera poucos dias após e alguns anos antes na Nova Inglaterra, Adams vai até o local de seu desaparecimento em meio a uma tempestade e volta a vê-la uma última vez, porém ninguém do vilarejo afirma ter havido qualquer outro aluguel de barca naquela noite também tempestuosa.
Essa segunda incursão da dupla Cotten-Jones sob a batuta de Dieterle, produzido de forma mais extravagante (não por acaso por Selznick) que o mais modesto Um Amor em Cada Vida, pode ser considerado como um canto de cisne dos filmes “góticos” do período, repletos de amour fou, sombrios como o cinema noir, mas destituídos do cinismo e realismo desses. Mais ambicioso que o anterior sob todos os aspectos, o filme surpreendentemente não necessita de uma referência europeia para apresentar charnecas esfumaçadas. Contenta-se com a Nova Inglaterra ao final e centra a maior parte de sua atmosfera sombria e enevoada numa insuspeita Nova York quase contemporânea. O que nas mãos deDieterle consegue afastar o fantasma da fantasia delirante, ou melhor, assumi-la sem medo em um momento no qual o cinema de maior reconhecimento crítico se aproximava de um crescente realismo e crítica social podendo ser considerado como distante precursor dos mind games do século XXI. Aqui, no entanto, investe-se menos na alternância ou complexa interação entre realidade objetiva e subjetiva que na compreensão da genuína arte como produto de uma vivência intensa do artista que transcende o virtuosismo e o cotidiano, e que bem poderia se aplicar ao próprio Dieterle, incubido de se deslocar entre esses dois papéis. Há algo de macabro e sinistro no movimento de descoberta do passado de sua amada que sugere uma proximidade com o universo do horror. Ao contrário do filme anterior, não se procura justificar de forma realista o mistério envolvendo a mulher amada e, ainda mais que o anterior, próximo de incursões de um cineasta como Lewin por temas semelhantes como em seu Pandora (1951). Destaque para o seu prólogo grandiloquente e completamente destituído de créditos e seu desfecho em sépia e cores (para destacar o quadro de Jeannie em um museu). E, mais que isso, para uma construção de uma Nova York bem distante de suas representações habituais contemporâneas, seja através das cores alegres e do viço do musical (Um Dia em Nova York) ou da paranoia do noir (Cidade Negra, do próprio Dieterle).Vanguard Films/Selznick Int. Pictures para Selznick Releasing Org. 86 minutos.

Postado originalmente em 22/01/2015

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