Filme do Dia: A Noite Nupcial (1935), King Vidor
A Noite Nupcial (The
Wedding Night, EUA, 1935). Direção: King Vidor. Rot. Original: Edith
Fitzegerald, baseado em argumento de Edwin H. Knopf. Fotografia: Gregg Toland.
Montagem: Stuart Heisler. Dir. de arte: Richard Day. Figurinos: Omar Kiam. Com:
Gary Cooper, Anna Sten, Ralph Bellamy, Helen Vinson, Sig Ruman, Esther Dale,
Leonid Snegoff, Milla Davenport, Walter Brennan, Otto Yamaoka
Tony Barett (Cooper) é um escritor em
Nova York que decide voltar a sua Connecticut natal buscando inspiração para
seu novo romance. Sua mulher, Dora (Vinson), vai para Nova York, assim como o
ajudante Taka (Yamaoka). Barrett sente-se cada vez mais envolvido por Manya
Novak (Sten), descendente de uma rude família de poloneses, que mantém os seus
hábitos tradicionais, como a escolha do noivo por arranjo, Fredrick (Bellamy).
O que era inicialmente mera atração para Tony lhe inspira para compor a
protagonista de seu novo romance, Sonya, assim como todo o enredo e Manya,
inicialmente arredia aos encantos de Tony, é seduzida quando escuta ele contar
sua história. Numa noite de nevasca intensa, o pai de Manya, Jan (Ruman), vai
buscá-la na casa de Tony e decide que ela irá casar na próxima segunda.
Enquanto isso, Dora retorna e fica a par das novidades. Disposto a se separar
de Dora, Tony recebe a notícia do casamento de Manya como um golpe e vai até a
comemoração. Desprezada pelo recém-noivo, Frederick, que acredita que ela se
entregou a ele, Frederick decide se vingar de Tony. Manya tenta alertar Tony,
mas em meio a briga dos dois é ferida mortalmente.
Vidor retorna ao tema do amour fou temperado por uma boa dose de
atração por um Outro puro e libertador – que já havia demonstrado em Pássaro do Paraíso, ainda que aqui já
demonstre um nível de complexificação psicológica que talvez o aproxime um
pouco mais de seu melodrama clássico, Stella
Dallas, realizado dois anos depois. A salvação de um entediado e
sofisticado escritor de um círculo social refinado de Nova York será
redescobrir a “espontaneidade” de uma vida sem maiores preocupações no campo,
onde a natureza parece comandar até mesmo as relações sociais. Porém, se Tony
se encanta pela ausência de malícia se sente constrangido com o outro lado da
moeda de tal vida provinciana, a dos papéis sociais e de gênero muito bem
delimitados, assim como hábitos que são quase que abertamente ridicularizados.
Há, sem dúvida, uma forte carga de “ensinamento” civilizador no modo como Tony
passa a agir e influenciar Manya, que passa a questionar os códigos morais da
geração de seus pais, como que desejando abraçar de vez a sua identidade
“americana”. Porém, talvez devido a um outro código moral que diz menos
respeito a narrativa do filme do que o que regulava a indústria cinematográfica
de então, o intento liberal de Tony terá seus limites e não chegará a se
concretizar a não ser (tal como em O Morro dos Ventos Uivantes, igualmente fotografado por Toland e produzido
pela mesma companhia alguns anos após) enquanto suspiro romântico tardio. Nesse
sentido, a transcendência do amor aqui não possui a intensidade corpórea ou a
criatividade estética de Jean Vigo, em L´Atalante,
aproximando-se mais de semelhantes descrições em filmes anteriores seus como Aleluia! (1929). Sobra, evidentemente, para o lado mais frágil da balança,
que nem possui mais as mesmas convicções tradicionais dos pais e avós, mas
tampouco conseguiu ainda se firmar com segurança diante dos novos códigos
“aprendidos” a tal grande custo e que acabarão lhe valendo a própria vida. E,
para o virtuoso protagonista – afinal o filme faz questão de frisar que seu
oportunismo ocorreu apenas no primeiro contato com Manya, logo seus sentimentos
irão demonstrar-se os mais “autênticos possíveis” por mais doloroso e tedioso
que possa parecer - ainda restará um ombro (e aqui sinceramente) amigo, tal como
em As Chuvas de Ranchipur (1955), de
Jean Negulesco. Aliás, essa contraposição clássica entre a espontaneidade de um
mundo tradicional, ainda que oprimido x
cultura mais cosmopolita seria material para realizadores como Jean
Negulesco operar em diversos filmes de intenso colorido e Cinemascope, tendo
sempre a Europa Ocidental (não a Oriental, como aqui) como Outro. Cumpre
indagar, se a cultura ocidental é tão mais liberta e democrática assim, por
qual motivo seus protagonistas estão
buscando seus amores justamente nas sociedades ainda fortemente marcadas pela
tradição? O argumento original de Knopf foi inspirado na relação entre Zelda e
Scott Fitzgerald, amigos próximos do escritor. The Samuel Goldwyn Co. para
United Artists. 88 minutos.
Comentários
Postar um comentário