Filme do Dia: Fogo na Planície (1959), Kon Ichikawa
Fogo na Planície (Nobi,
Japão, 1959). Direção: Kon Ichikawa. Rot. Adaptado: Natto Wada, baseado no
romance de Shohei Ooka. Fotografia: Setsuo Kobayashi & Setsuo Shibata.
Música: Yasushi Akutagawa. Montagem: Tatsuji Nakashizu. Dir. de arte: Atsuji
Shibata. Com: Eiji Funakoshi, Osamu Takizawa, Mickey Curtis, Mantarô Ushio, Kyu
Sazanaka, Yoshihiro Hamaguchi, Asao Sano, Masaya Tsukida.
Filipinas, 1945. Tamura (Funakoshi) é
um soldado japonês em um exército
completamente destituído de qualquer apoio moral ou material, que possui como
únicas opções se entregar ao exército americano ou enfrentá-los em uma luta
suicida. Diagnosticado como tuberculoso, ele passa a enfrentar a rejeição dos
colegas e se depara com inúmeras situações desesperantes e aterradores em sua
jornada. Entre os sobreviventes, alguns
enlouquecem, outros passam a consumir carne humana. Tamura procura resistir
preservando o máximo possível a sua dignidade.
Ichikawa constrói um dos retratos
mais cruéis da guerra já vistos no cinema e algo que deve ter provocado espécie
à época no Japão, ao retratar muitos de seus militares em situações limítrofes.
Uma leitura mais atenta do mesmo, no entanto, demonstrará que o cineasta trabalha
mais em cima de questões morais e universais do que propriamente faz um
retrospecto de qualquer batalha específica sob uma perspectiva eminentemente
realista ou nacional. Não que as situações vividas pelos personagens não sejam
realistas, porém somente ao final se fica a par de onde se sucederam as ações e
a presença das forças americanas torna-se um elemento de fundo. O foco central
do filme são as adversidades enfrentadas em situações de pressão extrema em que
a fome, a traição e a morte espreitam a todo momento. A leitura empregada por
Ichikawa dos eventos é a mais seca possível e longe de qualquer didatismo. Não
existe qualquer lição de moral de fácil apelo ao público, mas sim a tentativa
de reproduzir uma situação de brutalização do humano no qual não faltam
imprecações, ainda inéditas nos cinemas americano e europeu do período, assim
como rivalidades crescentes por mesquinharias que acabam gerando mortes, numa
demonstração de quão cruel o ser humano pode ser para levar adiante o seu
instinto de sobrevivência. Aos mortos não é dirigido qualquer atenção
sentimental, como habitualmente observado no gênero, mas antes se procura se
apropriar dos bens relevantes por eles carregados – exemplarmente demonstrado
na cena em que Tamura se apodera das botinas de um cadáver. Esse tampouco pode
ser considerado como herói nos moldes maniqueístas/melodramáticos do termo já
que, a certo momento, assassina um aldeão indefeso em uma vila semi-fantasma e
em outro, mata um dos companheiros que havia mal concluído o assassinato de um terceiro. Daiei Studios. 108 minutos.
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