Filme do Dia: O Moinho do Pó (1949), Alberto Lattuada


O Moinho do Pó Poster


O Moinho do Pó (Il Mulino del Po, Itália, 1949). Direção: Alberto Lattuada. Rot. Adaptado: Federico Fellini, Tulio Pinelli, Riccardo Bacchelli, Mario Bonfantini, Luigi Comencini, Alberto Lattuada, Carlo Musso & Sergio Romano, baseado no romance de Riccardo Bacchelli. Fotografia: Aldo Tonti. Música: Aldo Tonti. Montagem: Mario Bonotti. Dir. de arte: Aldo Buzzi. Cenografia: Luigi Gervasi. Figurinos: Maria De Matteis. Com: Carla Del Poggio, Jacques Sernas, Mario Besesti, Giulio Calì, Anna Carena, Giacomo Giuradei, Leda Gloria, Nino Pavese, Isabelle Riva.
Final do século XIX, às margens do Rio Pó, uma comunidade se encontra dividida. Por um lado surgem as idéias socialistas e de outro um patrão inflexível Clapassòn (Besesti). A família Scacerni se encontra no centro desse conflito. Pretendendo casar a filha Berta (Del Poggio) com Orbino(Sernas), seus planos se encontram adiados com o incêndio do moinho, que é fonte de renda da família, e posterior prisão do irmão de Berta, Princivalle (Giuradei). Princivalle provocou o incêndio para que os fiscais do governo não surpreendessem mais uma vez a fraude no registro mecânico do moinho. Berta passa então a trabalhar para a família do marido, o que provoca vergonha para sua altiva, ainda que humilde,  família. Uma greve geral é iniciada entre os trabalhadores. Orbino, inicialmente feliz como capataz de Clapassón, abdica de trabalhar para ele, quando sabe que a polícia irá colher o trigo. As mulheres se intrometem na ação policial e conseguem vencer, conseguindo se manter diante dos homens armados que possuem ordem para atirar contra elas e algumas crianças que se posicionam diante deles. Elas partem para a agressão dos policiais e são levadas a delegacia. Para serem soltas, tem que ser negociado o final da greve. Princivalle, que já havia sido solto da prisão, após o episódio do incêndio, ganha o ódio da comunidade e é considerado traidor por continuar trabalhando para Clapassón durante a greve, assim como toda sua família. Ao saber que Berta havia sido insultada na cidade, ele vai tomar satisfações e, enganado, agride e acidentalmente mata Orbino. O corpo é jogado no rio, pois se acredita que sua alma somente será salva se o corpo for recuperado pela pessoa amada. Berta e mãe esperam toda a noite e ao amanhecer o corpo surge. Princivalle se dirige para se entregar espontaneamente à polícia.
Essa tentativa de diálogo com um público mais amplo de um filme neo-realista efetivamente político é bem melhor sucedida que a do mais engajado Guiseppe De Santis e seu Trágica Perseguição (1947) ou ainda de seu mais próximo temática e temporalmente Arroz Amargo, inclusive em termos de interpretação do elenco e da própria qualidade dessa produção, consideravelmente mais bem cuidada e provavelmente dotada de maior orçamento. Mesmo que exista um caso de amor trágico no estilo shakespeariano ele tampouco oculta a forte dimensão social que não deixa de se tornar bastante presente ao longo de todo o filme, em boa parte obscurecendo a questão do casal amoroso, um dos vínculos evidentes que foi incluído para tentar dialogar com um público mais amplo. Se o filme pode ser tido como influenciado pelo cinema soviético dos anos 1920, sobretudo Dovjenko e sua descrição pastoral e mítica das relações do homem do campo, além da evidente carga política, essa última é que o diferencia de outro painel histórico ao qual o próprio Lattuada colaborou como co-roteirista, Piccolo Mondo Antico (1941), de Soldati. O pathos mais intenso aqui se dirige menos para a história de amor convencional como naquele do que para a situação de opressão e divisão da comunidade, numa verdadeira inversão de foco. Por outro lado, antecipa em sua expressão quase didática dos interesses contrários, cinematografias posteriores como a do Cinema Novo brasileiro. Curiosamente, no entanto, a saída encontrada ao final, seja por motivos externos como a censura ou por implicações que dizem respeito ao fato de ser uma adaptação, seja por imperícia de seus realizadores, vai contra toda a pretensão de análise social mais ampla  e se limita a observar a resolução trágica do caso amoroso da dupla principal, não mais envolvendo o conflito entre classes e sim membros não só da mesma classe, como do que seria a mesma família, não mais se detendo sobre qual fim teria se dado com relação ao conflito social. Destaque para a cena grandemente ousada, em seu aberto erotismo, entre Princivalle e uma mulher com quem possui furtivos encontros, que os flagra meio que na malemolência pós-coito, nada evocativa do modo como o cinema hollywoodiano trabalhava cenas semelhantes então. Lux Films. 97 minutos.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Filme do Dia: Der Traum des Bildhauers (1907), Johann Schwarzer

Filme do Dia: Quem é a Bruxa? (1949), Friz Freleng

A Thousand Days for Mokhtar