Filme do Dia: Como Era Gostoso o Meu Francês (1971), Nelson Pereira dos Santos
Como
Era Gostoso o Meu Francês (Brasil, 1971). Direção e Rot. Original: Nélson Pereira dos Santos. Fotografia: Dib Lutfi. Música: Guilherme Magalhães Vaz
& José Rodrix. Montagem: Carlos Alberto Camuyrano. Cenografia: Régis
Monteiro. Figurinos: Mara e Maria Chaves. Com: Arduíno Colassanti, Ana Maria
Magalhães, Manfredo Colassanti, Eduardo Imbassahy Filho, Gabriel Archanjo, José
Kleber, Ana Maria Miranda, Luiz Carlos Lacerda.
No Brasil em 1598, francês (Arduíno Colassanti) se torna
prisioneiro dos Tamoios. Tenta se passar por português, mas acaba
definitivamente sendo considerado como francês quando um outra francês,
mercador (Manfredo Colassanti), assim o reconhece. Uma das índias, Seboipepe
(Magalhães) se interessa por ele e passa a ser sua amante. Quando é ameaçado de
morte pelo chefe Cunhabebe (Filho), consegue se salvar por haver estocado
pólvora. Porém, mesmo tendo ajudado na vitória do grupo rival é condenado à
morte. Na véspera da cerimônia, Seboipepe lhe relata como deverá agir. No dia
seguinte o ritual se cumpre.
Essa livre adaptação de Hans
Staden meio que às avessas se beneficia tanto das liberdades que o cineasta
teve com relação ao texto original quanto da forma poética e desprendida com
que é narrado, demonstrando uma simpatia subliminar pelos indígenas. Aqui
inexiste a pureza de intenções e a força da Divina Providência como motor para
a exaltação do protagonista pelos nativos. Enquanto na narrativa de Staden se
trata de um equívoco com relação a sua nacionalidade, aqui é o francês que se
pretende fazer passar por português. Do mesmo modo o comerciante português
mesmo sabendo que depõe contra a integridade física do protagonista por motivos comerciais, termina sendo assassinado pelo
mesmo. Assim como seu crédito junto ao chefe da tribo se deve menos às
artimanhas da Divina Providência que as perpetradas pelo próprio francês. E,
por fim, ele é morto e não motivo de posse entre os nativos. Produzido ainda bem
próximo do auge do antropofagismo e suas expressões na cinematografia
brasileira, muito de seu sucesso se deve ao distanciamento emocional do que é
narrado, a belíssima trilha musical, um dos elementos mais importantes para sua
organicidade e a boa interpretação do elenco, incluindo Colassanti, bem mais
competente aqui que na sua sofrível estréia como ator em outro filme do
cineasta, El Justicero (1967).
Destaque para a bela seqüência próxima ao final, na qual Seboipepe apresenta ao
protagonista como deve se portar diante do ritual de morte que termina com a
sugestão do último encontro amoroso do casal, apesar da índia afirmar para o
francês que não deixará de comer uma parte de seu corpo. Nessa cena, fica
expressa a dignidade e honra que
representa para a nação indígena o ato de canibalismo, numa dimensão do Outro
completamente ausente obviamente do texto original e, igualmente, da sua versão
cinematográfica homônima dirigida por Luiz Alberto Pereira em 1999, que procura
ser mais fiel ao texto original, portanto sempre partindo do ponto de vista do
protagonista, além de mais preocupada com valores de produção que instigante
ideológica e cinematograficamente como o filme de Nélson Pereira. A narração é
pontuada por frases que expressam o ponto de vista dos europeus sobre os
indígenas que vão desde a demonização à santificação, a partir de textos de
Jean de Léry, Manoel da Nóbrega, Abade Thevet e outros. O prólogo inicial com
narração off possui um tom satírico
na composição das cenas evocativo dos filmes contemporâneos de Pasolini, sendo
seguido por créditos de ilustrações do livro de Staden. Os diálogos em
Tupi-Guarani foram escritos por Humberto Mauro. Condor Filmes/Luiz Carlos
Barreto Prod. Cinematográficas. 84 minutos.
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