Filme do Dia: La Parmigiana (1963), Antonio Pietrangeli

 


La Parmigiana (Itália, 1963). Direção: Antonio Pietrangeli. Rot. Adaptado: Ruggero Maccari, Ettore Scola, Stefano Strucchi, Antonio Pietrangeli & Bruna Piatti, a partir do romance de Bruna Piatti. Fotografia: Armando Nannuzzi. Música: Piero Piccioni. Montagem: Eraldo Da Roma. Dir. de arte: Luigi Scaccianoce. Cenografia: Andrea Fantacci. Figurinos: Marisa Crimi. Com: Catherina Spaak, Nino Manfredi, Didi Perego, Lando Buzzanca, Vanni De Maigret, Umberto D’Orsi, Rosalia Maggio, Ugo Fangareggi, Salvo Randone.

Fugindo de sua cidade natal após os boatos de seu envolvimento com um seminarista, Giacomo (De Maigret), Dora (Spaak) vai viver com o casal Amneris (Perego) e Scipio (Randone). Enquanto a mulher o trai quase abertamente com outros homens, Scipio possui uma obsessão pela jovem Dora, que dorme despida. Embora Dora desperte a paixão do policial Michele Pantanò (Buzzanca), seu interesse maior é pelo publicitário atormentado Nino (Manfredi) que, após ser preso, procura refazer sua vida com uma amante mais velha e dona de uma pizzaria, que se transforma em sua esposa.

Com elegantes transições de sequencias, Pietrangeli, falecido precocemente antes do final da década, realiza uma saborosa sátira de costumes que apresenta uma Itália pequeno-burguesa provinciana, obcecada por sexo e por símbolos de distinção social, e o faz sem descambar para os excessos da comédia erótica contemporânea – a qual o próprio Pietrangeli aderiu em filmes como O Marido Traído, no ano seguinte -   e com uma inteligência que ameniza seu cinismo, deixando evidente os lugares-comuns um tanto deslocados emitidos, por exemplo, sobre um homem mais velho, por Michele, um dos pretendentes de uma das versões de Dora, quando a imagem vem logo a seguir a desmentir sua visão idealizada do mesmo. Dora é observada talvez com a malícia enganadora que um olhar misógino poderia lançar, mas igualmente com uma empatia digna de nota, que a torna muito menos vítima que figura plenamente ativa de suas escolhas e, inclusive, do sofrimento que impõe aos homens que desperta paixão. E o faz literalmente se desdobrando em duas figuras com visual distinto, quase um comentário enigmático e muito pessoal a Um Corpo que Cai, uma trajando peruca preta e de modos pretensamente puros que é a versão que lhe cabe construída pela hipócrita e fofoqueira Amneris, figura vivida com bravura por Perego que, numa das cenas mais divertidas do filme, após fazer comentários simpáticos a mãe e a filha, descasca-as com intenso gosto para Dora, assim como boa parte dos presentes na festa; a outra é uma mulher mais abertamente descolada, de cabelos descoloridos, que tenta se tornar uma modelo de sucesso, mesmo que algo contra sua vontade. A determinado momento, cansada do repertório que lhe é posto em seu casamento próximo com o medíocre Pantanó, abre o jogo com o noivo, por vezes com requintes de crueldade, como quando reencontra Giacomo, em outro momento hilário do filme, e deixa-o transtornado ao afirmar, após a saída desse, que ele a desvirginara. Ou ainda quando indaga de Amneris, em meio a sonsice auto-imposta, se esta trai o marido, após ouvi-la sendo assediada abertamente por um dos homens para quem trabalha. Se as lágrimas que se seguem a sua mordacidade de seu encontro com um Nino já casado, afirmando que ela sempre soubera que ele iria acabar se refugiando em uma figura materna, demonstram um lado humano para além do que habitualmente se admite em personagens similares (Eva, Susana), logo elas serão substituídas por um sorriso e um retoque nas sobrancelhas que sinalizam para a continuidade da vida. Com estocadas certeiras sobre a sociedade italiana de sua época sem necessitar da gravidade para tanto – como a presente no universo nada cômico de Antonioni – apresenta um humor invulgarmente não conservador, inteligente e efetivo, sendo o brilho de Spaak, no auge de sua carreira, de não menos importância.  Documento Filme para Dino de Laurentiis Distribuizone. 111 minutos. 

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