Filme do Dia: Nada Será Como Antes: A Música do Clube da Esquina (2024), Ana Rieper
Nada Será Como Antes: A Música do Clube da Esquina (Brasil, 2024).
Direção e Rot. Original Ana Rieper. Fotografia Jacques Cheuiche. Montagem Pedro
Asbeg & André Sampaio.
Documentário que apresenta a gênese do movimento musical mineiro que
explodiria criativamente com o álbum Clube da Esquina. Desconfia-se que o termo vá além do
próprio álbum, pois não se encontra restrito a ele, e a denominação remetia a
um clube que não era o Oasis, clube para o qual os jovens haviam sido chamados,
mas não tinham dinheiro para ir, e teria sido criado em resposta por Lô Borges.
E um Clube da Esquina, ampliado literalmente ou não, deve levar em conta, além
de Lô e Milton Nascimento, igualmente Beto Guedes, Tavinho Moura, Ronaldo
Bastos, Toninho Horta, Márcio Borges e o restante do clã Borges, Wagner Tiso,
Robertinho Silva, Novelli e outros. Como músicos em geral, e os do Clube da
Esquina em particular, não são as figuras mais eloquentemente articuladas, o
protagonismo – e este é um ponto positivo – finda por ser das próprias músicas.
Como se estivesse defendendo a tese do artista já ter se expresso na própria
música, e tudo o mais ser supérfluo diante delas. E não apenas isso, seleciona de
fato as mais belas composições do álbum Clube da Esquina e outras gemas dispersas
interpretadas por Milton (Travessia, Clube da Esquina, a composição com letra que não consta do
álbum homônimo, Para Lennon e McCartney) ou Lô (a belíssima Equatorial). São fartos os trechos
das composições a se entrecortarem sobretudo com a fala de Lô Borges, quem de
certa forma protagoniza a narrativa, com relativamente pouca participação de
Milton. E o mais articulado deles é Toninho Horta, e que não poderia ser, dado
sua relativa coadjuvância no álbum, além de tampouco ser um dos nomes mais
populares. Há até uma explicação teórico-estética para as variações melódicas
no conjunto da obra musical que Horta encontra com exclusividade na música
mineira e que ele identifica com as curvas das montanhas do estado. Há ainda
imagens de arquivo, algumas de arquivo pessoal, outras como a do programa
Ensaio da TV Cultura, que apresenta já a canção-título do documentário,
dedilhada no violão e na voz de Bituca. O caldo de influências é outro ponto
forte do filme. Há os Beatles, descobertos por Lô, mas apropriados com mais
intensidade por Beto Guedes. John Coltrane, Miles Davis e o jazz, influências
marcantes, dentre outros, do próprio Milton, e sinceramente observadas como
estranhas, embora respeitadas, por Guedes. Uma influência cigana do Leste
Europeu, que quando viajando por lá, Toninho Horta, diz reconhecer em locais
por onde passou, em músicos de rua. E o rock que surge pós-Beatles, como o
progressivo (Genesis – o nome do filho para quem tem uma música famosa, dado
por Beto Guedes, é advindo de Peter Gabriel – Yes, etc.). O afro surge na fala
de Robertinho Silva. Milton, ele próprio, pouco fala neste quesito. E, talvez
não sem espanto, pouco se fala da MPB, ou de influências brasileiras. O cinema
surge como influência grandiosa e imagens onde o cinema brasileiro emerge como
motivação em meio a outros (a Nouvelle Vague, quando citado Jules e Jim).
E a militância política, abraçada por alguns membros da família Borges, como
Márcio, associado ao movimento estudantil e a oposição à ditadura militar no
qual o movimento emergiu. Embora dirigido por uma mulher, as mulheres ficam
ainda mais escanteadas que em sua participação musical, demonstrando ser um
movimento de rapazes e para rapazes, verdadeiro Clube do Bolinha, o que não era
nada incomum. O caso mais gritante é o de Solange Borges, não apenas ausente
das entrevistas, ou filmada, como sequer citada, embora sua voz seja ouvida em
trecho de Equatorial. E Alaíde Costa, cuja canção integrante do Clube da Esquina, Me Deixa em
Paz,
talvez por ser composta por integrantes fora do círculo musical, e Costa já
trazer uma carreira anterior ao universo musical mineiro, sendo carioca, também
é deixada de lado. As raras imagens amadoras de parte desta geração apresenta
apenas rapazes em uma cena de praia. Uma imagem icônica a também ficar fora do
esquadro é a célebre capa do álbum-manifesto do grupo, deixada de lado
provavelmente por conta dos processos judiciais que a acompanharam por parte
dos dois garotos fotografados e descobertos, décadas após, serem os que estavam
lá na capa, gerando artigos de jornais. Alguns dos primeiros contatos entre
membros do grupo deram-se por motivações outras, como o patinete que Guedes
tinha, invejado por Lô e que os aproximaria, quando tinham dez anos de idade.
Já a descoberta de Milton por Lô se deu quando descia as escadas e viu Bituca
(“um negrinho”) tocando violão. Ambos os casos, frutos do acaso. Destaque para
o momento no qual o Clã Borges se empolga a cantar e tocar Para Lennon e
McCartney.
E para o que Lô afirma que muitos acreditavam que Trem Azul era uma referência a ácido
lisérgico, e vinham atrás dele buscando ácido. |Paladina Filmes/Canal Brasil
para Lira Filmes/Vitrine Filmes. 82 minutos.![]()

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