Filme do Dia: Arquitetura da Destruição (1989), Peter Cohen

 


Arquitetura da Destruição (Undergangens Arkitektur, Suécia, 1989). Direção e Rot. Original: Peter Cohen. Fotografia: Mikael Cohen, Gerhard Fromm & Peter Östlund.

Talvez as imagens mais fortes e que valham, por si só, pelo documentário, independente do que virá após, seja as que apresentam casos clínicos de más formações genéticas e doenças equivalentes, comparadas, pelos nazistas, com os princípios da estética vanguardista. Eles traçam então o paralelo dessa “arte degenerada” com o futuro da raça alemã, caso não seja liberta de seus elementos impuros, dos quais notadamente a figura proeminente e bode expiatório sabemos bem quem foi. Mesmo sendo dono de um belo título, talvez fosse mais adequado ser intitulado Arte da Destruição, já que somente com 35 minuto de filme é que se detém um pouco mais sobre a arquitetura em um trecho. E assim continua, após o referido trecho. E, dedicando-se, de forma mais literal, aos campos de concentração, existe pouco. No plano formal, trata-se de um documentário de formato bastante clássico, praticamente televisivo, centrado basicamente em imagens de arquivo (talvez o que possua de melhor) e a narrativa fleugmática, algo monotonal e distanciada de Bruno Ganz (que posteriormente encarnaria o próprio führer em A Queda! As Últimas Horas de Hitler, de 2004). A não alternância da narração over com entrevistas, por exemplo, não facilita a empreitada de sua longa metragem. As imagens produzidas pela própria equipe do documentário são muito poucas, como as do prólogo aéreo sobre a cidade de Nuremberg ou a reconstituição de uma sala cirúrgica contemporânea mais de 50 minutos após. Dentro de uma perspectiva didática como a sua, no bom e mau sentido da palavra, falta ao documentário algumas associações básicas, como a do Discóbolo grego, adquirido por Hitler e peça preferida em sua coleção de arte e a utilização do mesmo para uma das cenas mais emblemáticas de Olympia (1938), de Leni Riefensthal, em que meio a estatuária grega esta ganha vida. O que tal imagem reforçaria, caso incorporada aqui, seria a incomensurável concentração de poder numa única pessoa, compradora de metade ou um terço das obras de arte das exposições anuais no período em que esteve no poder, e com projetos arquitetônicos delirantemente maniqueístas com o de uma cúpula que serviria como galeria de arte com capacidade para quase duas centenas de milhares de pessoas e com uma extensão 17 vezes superior a da Basílica de São Pedro, no Vaticano. E para quem os artistas pareciam se endereçar diretamente, como no caso da cineasta ou diversos artistas plásticos.  Impressionam as imagens de um provinciano Hitler visitando a Paris (que não conhecia) ocupada de manhã cedo e desfilando e se locomovendo de carro aberto para chegar a Ópera de Paris. Sua mediocridade intelectual é enfatizada ao desenhar o projeto de remodelação de seu chalé – com a maior janela retrátil do mundo, verdadeiro quadro ou tela cinematográfica para as montanhas, um dos motivos a obcecarem os nazistas (sendo que o ciclo de filmes de montanha, muitos dos quais interpretados por Leni Riefenshtal a fizeram cair nas graças do führer), como pode ser observado na quantidade de quadros que as evocam nas exposições anuais. Aliás é curioso não existir nenhuma referência (medo de processo por parte dela?) a realizadora que conseguiu traduzir melhor as aspirações estéticas de Hitler, sua estetização do mundo através de uma iconografia de pacotilha e referências ao imaginário cultural alemão que não iam muito além, preferindo analisar obras bem mais convencionais (e distantes da prédica esteticista) como O Eterno Judeu (1940), de Fritz Hippler. Poj Filmproduktion AB/SVT Drama/Sandrews/Svenska Filminstitutet. 118 minutos.

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