Filme do Dia: Coração Vadio (1934), Fritz Lang
Coração Vadio (França, 1934). Direção: Fritz
Lang. Rot. Adaptado: Fritz Lang, Robert Liebmann & Bernard Zimmer
(diálogos), baseado na peça de Ferenc Molnár. Fotografia: Rudolph Maté &
Louis Née. Música: Franz Waxman. Dir. de arte: René Renoux. Cenografia: Paul
Colin. Figurinos: René Hubert. Com: Charles Boyer, Madeleine Ozeray, Florelle,
Pierre Alcover, Robert Arnoux, Roland Toutain, Alexandre Rignault, Henri
Richard.
Liliom Zadowski (Boyer) trabalha em um
carrossel, sob o comando de Madame Muskat (Florelle) até o dia em que conheci
Julie (Ozeray). Após discutir com Madame Muskat, acaba sendo despedido e indo
morar em condições precárias com Julie. Liliom é tentado por Muskat para retornar
ao carrossel e aceita o convite, porém depois o rejeita ao saber que Julie se
encontra grávida. Tenta então um roubo com Alfred (Alcover), mas é flagrado
pela polícia e se suicida. No céu, consegue o induto de voltar a ver sua
família após 16 anos de purgatório. Retorna à terra e reencontra sua filha
(Ozeray), mas perde a paciência igualmente com ela e é reconduzido ao céu.
Trata-se do único filme dirigido por
Lang na França, após abandonar a Alemanha com a ascensão do partido nazista e também
um dos mais estranhos a sua filmografia, seja alemã, seja americana. O filme
certamente se enquadra bem mais dentro dos cânones do realismo poético então
vigente no cinema francês e sua visão adocicada e romantizada de personagens
marginais e pobres que de Lang, ainda que tampouco deixe de apresentar alguns
elementos mais próximos do realizador alemão. Quanto aos últimos, certamente a
inclusão do cinema como modo de trazer ao protagonista verdades – inclusive
ocultas em seu pensamento – é uma de das marcas indeléveis do realizador,
retrabalhada na tentativa de linchamento em seu filme seguinte, o bem mais
interessante Fúria (1936). Se a longa e cansativa narrativa pós-morte
parece antecipar algo da auto-condescendência de um Capra (A Felicidade Não se Compra), há uma ironia que, de certo modo,
atenua o sentimentalismo, enfatizada pelo próprio modo cínico de um ceu criado
tão imperfeito quanto à própria vida terrena, sobretudo no que diz respeito às
suas alusões à burocracia, escamoteada em ambas as vidas. Por outro lado, o
tema do amor que transcende os limites da existência material e mesmo terrena é
bastante evocativo de Bozarge (que, não por acaso, já havia adaptado a peça de
Molnar quatro anos antes). Ainda que o filme possua suas virtudes, entre elas a
atuação bastante carismática de Boyer, numa sofisticação dos tipos rudes
vividos por alguns protagonistas dos filmes de Bozarge, tais como o Charles
Farrell de Sétimo Céu. Porém, ao
mesmo tempo o acréscimo de “realismo” na composição de um “mau caráter de bom
coração” vivido por Boyer acaba, ao final das contas, por justificar, de forma
conservadora, a atitude de violência do personagem para com sua mulher e filha,
e o papel de subjugamento que é relegado à condição feminina – sintomático,
nesse sentido, o diálogo que mãe e filha travam sobre uma brutalidade que não
chega a doer de fato, quando se referem a truculência do marido/pai. Porém, o
que há de mais problemático no filme é certamente o que poderia sugerir uma
desconstrução do melodrama pela ironia cômica crescente que acompanha a
narrativa pós-terrestre do protagonista, mas que acaba soando mal resolvida em
sua definição. É considerado por Lang como seu melhor filme. A peça de Molnar,
que já havia sido adaptada também por Curtiz em 1919 e por Bozarge em
1930, voltou a ser filmada, como
musical, por Henry King em 1956, além de 4 versões posteriores para a
televisão. Boyer, como seu personagem, suicidaria-se na vida real, em 1978, 2
dias após a morte de sua esposa. Les Productions Fox Europa para 20th Century-Fox. 118 minutos.
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