Filme do Dia: No Ritmo do Coração (2021), Sian Heder

 


No Ritmo do Coração (CODA, EUA/França/Canadá, 2021). Direção Sian Heder. Rot. Adaptado Sian Heder, a partir do roteiro de Victoria Bedos, Stanislas Carré de Malberg, Éric Lartigau & Thomas Bidegain, para o filme A Família Bélier. Fotografia Paula Huidobro. Música Marius De Vries.  Montagem Geraud Brisson. Dir. de arte Diane Ledereman, Paul Richards & Jeremy Woolsey. Cenografia Vanessa Knoll & Amy Morrison. Figurinos Brenda Abbandandolo. Com Emilia Jones, Troy Kotsur, Daniel Durant, Marlee Matlin, Ferdia Walsh-Peelo, Eugenio Derbez, Amy Forsyth, John Fiore.

A jovem de voz talentosa, Ruby Rossi (Jones) é constantemente vítima de bullying na escola, por sua família ser composta de surdos-mudos e por ter que trabalhar com eles, na pesca. Uma de suas poucas amigas é Gertie (Forsyth), que se sente atraída pelo irmão de Ruby, Leo (Durant), e estranha a súbita investida nas aulas de coral de Ruby, que se encontra interessada no rapaz que se inscreveu também nelas, Miles (Walsh-Peelo). Porém, no primeiro dia de aula, quando o excêntrico professor Bernardo Villalobos (Derbez) lhes pedem para que cantem qualquer coisa, para que ele descubra qual o tipo de voz de cada, Ruby tem uma crise de pânico e desaparece. Quando apresenta sua voz, no entato, Villalobos observa seu potencial e, a partir deste momento, Ruby terá que conviver com a pressão do professor para que se dedique mais integralmente aos seus estudos e sua família, onde sua presença é essencial, já que numa investida sem ela, o barco da família foi abordado pela guarda costeira, após não ter percebido os sinais de alerta que essa emitia.

Os primeiros planos são já maus presságios do que nos aguarda. A música é utilizada como efeito empático, não uma trilha original, mas canções medianamente ou muito (caso da recém muito utilizada inclusive, Starman) conhecidas, fazendo a tarefa, desde o início, de angariar empatia, a partir de situações poucos convincentes, paternalismo sentimental e sua superficialidade rasa melhor traduzida pelo título brasileiro que pelo acrônimo original, que significa pessoa de família surda-muda que não é surda-muda. Se existe um pacto deste filme, é com o mercado. Com toda sua aparente preocupação com as pessoas surdas-mudas, estamos efetivamente próximos é da única que não o é, na família. E também da única que vivencia o amor romântico, enquanto os três membros surdos-mudos são quase selvagemente instintivos no trato do sexo. E é sobre ela que nos sobra a empatia e as lágrimas – afinal os norte-americanos conseguem vender para o mundo o que o filme original, A Família Bélier no máximo conseguiu vender para seus países produtores, França e Bélgica.  Já os três outros são vividos por três atores de fato surdo-mudos (uma deles, Marlee Matlin, ganhadora do Oscar por Os Filhos do Silêncio, de 1996), o que tanto pode, uma vez mais, realçar as situações vivenciadas por Jones, em seu relacionamento com o restante da família quanto uma crescente vigilância em torno das representatividades de minorias pela indústria. O que não deixa, em última instância, de trazer questões para uma profissão como a de ator/atriz. E é  a partir de pequenas situações cotidianas ou não  de um  surdo-mudo que o filme elabora sua graça e seu drama. A graça não soa tão engraçada, quando apela para o sexo dos pais de Ruby durante a visita de seu namorado. As situações dramáticas conseguem ser mais comoventes, embora sempre guiadas com todo o esmero da manipulação emocional. A parte mais frágil em todo esse quinhão fica pelo relacionamento entre o casal jovem, isso talvez desde antes da origem desse relacionamento – com todas as habilidades vocais de Ruby, é estranho que ela somente se sinta impulsionada a fazer um curso vinculado às mesmas, após o garoto que deseja se inscrever no mesmo. Independente dos clichês e previsibilidade com que a trama se desenlaça, Emilia Jones carrega o filme com quase a mesma bravura dos desafios de sua personagem. E a escolha do elenco do par romântico levou em conta seus dotes musicais, já que ambos cantaram suas próprias partes (e também tocaram, no caso de Walsh-Peelo, que já tinha em seu portfólio o chamariz de Sing Street, lançado meia década antes).  E como uma amostra grátis que a empatia buscada pelo filme é sincera, há um momento em que o som se apaga durante a apresentação de Ruby, para que possamos sentir como ela seria vivenciada pelo pai – algo que um filme sobre o crescente ensurdecimento de seu protagonista, O Som do Silêncio, se detém bastante. Vendome Pictures/Pathé Films/Picture Perfect Federation para Apple TV+. 111 minutos.

 

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