Filme do Dia: A Sociedade Anonyma Fábrica Votorantim (1922), Armando Pamplona
A Sociedade
Anonyma Fabrica Votorantim (Brasil, 1922). Direção e Fotografia: Armando
Pamplona.
Há evidentes
recordações dos primeiros anos do cinema nas imagens iniciais dessa produção. E
que também vão para além dele, no caso dos longos, insistentes e belos
travellings que apresentam aspectos da paisagem da viagem de trem entre
Votorantim e Sorocaba. Ainda mais tipicamente localizado no Primeiro Cinema são
os lentos “panoramas” descritivos que pretendem ressaltar a monumentalidade do
complexo fabril da Votorantim. Porém, em meio a tanta demonstração de
modernidade, incluindo bondes elétricos e a abertura das comportas de uma
barragem, ou ainda a enormidade das roldanas em planos propositalmente pensados
para se dispor em escala em relação aos seres humanos, convivem elementos mais
prosaicamente triviais, como são os moradores locais, os trabalhadores de beira
de estrada (evocativos do célebre Black
Diamond Express) ou o cachorro que passeia pelas comportas. Sem utilização
de música (será que assim também foi exibido à época? Pouco provável) na cópia
em questão, o principal elemento de articulação dos temas, explicitados pelas
cartelas em negro, são as aberturas e fechamentos em íris. Se os Lumière
registraram para a posteridade a mais relaxada saída dos operários de uma de
suas fábricas, aqui se observa a entrada dos mesmos. Embora logo a seguir se
observe várias saídas e uma entrada da segunda turma, da qual muitos acenam
para a câmera com seus chapéus. De uma maneira geral, os processos modernos da
fábrica são observados por uma linguagem cinematográfica arcaica, vinculada
mais a momentos passados da história do cinema e ainda distante dos arroubos
modernistas soviéticos de alguns anos após.
A fábrica possui mil e trezentos teares, mas a jornada dupla, duplica
igualmente o potencial dessas máquinas, como frisam as cartelas. Essas ao mesmo
tempo fazem menção meritória aos cuidados com as habitações de seus
trabalhadores na vila operária, mesmo o espectador tendo flagrado há pouco um
quase acidente de trabalho no qual os operários não se encontravam com proteção
adequada à cabeça ou havia qualquer regulamentação quanto à idade,
observando-se centenas de crianças entre seus operários, em quase todos os
setores de produção. Mesmo que não falte a “fotografia posada” das lideranças
da fábrica, tem-se um nível de anonimato e maior distanciamento do
pertencimento direto de tudo e todos à figura do coronel (como é o caso de seu
equivalente nordestino, produzido inclusive alguns anos após, A Indústria Açucareira Através da Usina
Estrelliana). Aqui não se observa cenas de intimidade da família do
proprietário, mal entrevisto, mesmo sendo um negócio eminentemente familiar, e
da casa do gerente se observa uma simulação de um flagrante de seu cotidiano,
com as crianças brincando na entrada da casa, mas que as “fotos posadas”
habituais. Há uma menção a uma escola para os filhos dos operários, não observado
naquela, bastante sintomática de um processo que prevê um aperfeiçoamento das
futuras gerações de potenciais trabalhadores da empresa. E para além de uma
igreja católica, mais modesta que seu equivalente açucareiro, existe também uma
ainda menor igreja presbiteriana. Além do armazém (também existente na Usina
Estrelliana) e da farmácia, existe um teatro, consultório, sala de operações,
padaria, açougue e clube esportivo. Dividido em doze partes. Independência Film. 85 minutos.
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