Dicionário Histórico de Cinema Sul-Americano#46: Jorge Prelorán

 

PRELORÁN, JORGE. (Argentina, 1933-2009). Um professor emérito na UCLA School of Theater, Film and Television, à época de sua morte, e o maior realizador etnográfico do cinema argentino, Jorge Prelorán desenvolveu o cinema "etnobiográfico". Nascido em Buenos Aires, Prelorán estudou arquitetura na Argentina, antes de se mudar para a Califórnia, onde inicialmente continuaria estudando arquitetura, antes de ingressar no curso de cinema da UCLA. Graduou-se em 1961, e retornou ao seu país natal, onde sua carreira começou para valer. Havia iniciado a fazer filmes na Argentina aos 18 anos, mas após seu retorno, armado com a primeira de muitas bolsas norte-americanas, começou a realizar curtas documentais, muitos dos quais focavam em rituais e celebrações na Argentina rural, tais como La Feria de Yavi, ou sobre artes tradicionais indígenas,  como Un Tejador de Tilcara (1966). Muitos desses primeiros filmes foram apoiados pelo Fundo Nacional de Artes da Argentina, ainda que um deles, Ocurrido in Hualfin (1966), co-dirigido pelo radical esquerdista Raymundo Gleyzer, tenha sido apoiado pela Universidade de Córdoba. 

De forma típica, Prelorán trabalhava sozinho, e filmou suas produções com uma câmara Bolex 16 mm, de alimentação portátil. Com esse equipamento, foi incapaz de gravar som direto. Ele desenvolveu um método de viajar a uma parte remota do país, encontrando um tema de interesse humano, e entrevistando a pessoa em tapes de áudio. Voltava então com sua câmara e filmava seu tema em segmentos curtos, que seriam então montados juntos e acompanhados por trechos selecionados das gravações em áudio. Esse gênero cinematográfico, conhecido como etnobiográfico, tem sido descrito pelo etnográfo norte-americano David MacDougall como "compartilhando as qualidades testemunhais da obra de Jean Rouch, embora se encontrando relacionada proximamente ao gênero etnográfico da história de vida."

O primeiro longa documental de Prelorán, Hermógenes Cayo, também conhecido como Imaginero (1969), é igualmente seu filme mais celebrado, tendo sido recentemente votado como um dos dez melhores filmes argentinos de todos os tempos pelos críticos do país. Hermógenes é um velho que vive simplesmente na estéril província de Santiago del Estero, onde esculpe ícones religiosos a partir da madeira do cacto local. Ele é um imaginero. Após uma série de visitas, Prelorán gravou sua entrevista em uma longa sessão. Então escreveu o "roteiro" de seu filme, e cortou todas as indagações que fez, deixando um monólogo de Hermógenes sobre sua vida e trabalho, sem correspondência direta entre imagem e voz. Mas Hermógenes morreu durante a fase da montagem, então o realizador retornou para filmar imagens de seu túmulo, proporcionando um final para o filme. Prelorán sempre evitou questões políticas e usar comentário em voz over. 

Sua insistência em dar aos seus indígenas tematizados suas próprias vozes em seus filmes, e não explorá-los de qualquer modo (embora simultaneamente removendo sua voz enquanto realizador) foi estimado e manteve sua obra à parte de seus contemporâneos sul-americanos. Por outro lado, realizando todas as tarefas da filmagem ele mesmo, abriu flancos à crítica de sua autoria individual (e egotista) e aparente ausência de controle técnico (e artístico) da produção em áudio e imagem. Em 1975, após receber sua segunda bolsa Guggenheim - a primeira foi em 1971 - e com a democracia sob risco na Argentina, mudou-se definitivamente para os Estados Unidos. Começou a ensinar na UCLA em 1976, onde permaneceu até sua aposentadoria, em 1994. Continuou a realizar filmes, incluindo o curta documental indicado ao Oscar, Luther Metke a los  94 (Argentina, 1971), seu único longa de ficção, Mi Tía Nora (Argentina/Equador, 1983), e a série de televisão em sete partes, Patagonia - In Search of Its Remote Past (Estados Unidos, 1992). 

Fez experiências com a reflexividade (reconhecendo que estava realizando um filme, não apenas representando a realidade), e introduziu outras vozes, incluindo a sua própria, ao realizar Zulay, Facing the 21st Century (1989). O filme inclui uma conversa entre Prelorán, sua esposa antropóloga Mabel, e Zulay Saravino, uma equatoriana que viajou a Los Angeles, para se envolver na montagem de um filme sobre sua própria comunidade. Foi um acadêmico Fullbright em 1987 e em 1994, no ano que se aposentou, começou a escrever biografias aprofundadas de colegas e artistas, muitos dos quais foram temas de seus filmes. Em 2005 recebeu um Prêmio Golden Astor, pelo conjunto de sua obra, no Festival Internacional de Cine del Mar del Plata, e foi declarado Cidadão Distinto, pela cidade de Buenos Aires. Em 2008, Prelorán doou sua obra, incluindo 46 documentários, para o Human Studies Film Archive, localizado no Smithsonian Institute, em Washington D.C. Após uma batalha de dez anos contra o câncer de próstata, faleceu em 2009.

Texto: Rist, Peter H. The Historical Dictionary of South American Cinema. Plymouth: Rowman & Littlefield, pp. 462-4. 

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