Filme do Dia: A Mulher Marcada (1957), Miguel Morayta

 



A Mulher Marcada (La Mujer Marcada, México, 1957). Direção: Miguel Morayta. Rot. Original: María Luisa Algarra, Miguel Morayata, Luis Spota & Adolfo Torres Portillo. Fotografia: Jack Draper. Música: Luís Hernández Bretón. Montagem: Rafael Ceballos. Dir. de arte: José Rodríguez Granada. Com: Ana Luisa Peluffo, Joaquín Cordero, Alberto de Mendonza, Erna Martha Bauman, Enrique García Alvárez, Pompín Iglesias, Rosina Navarro, Carmela Rey.

O jovem e bem intencionado pianista, Germán (Cordero), após deixar a namorada Alicia (Bauman) em casa, surpreende uma suicida e a salva de sua tentativa desesperada. Trata-se de Ana (Peluffo), mulher de rosto desfigurado por um acidente no qual morreu toda sua família. Germán a leva para a sua casa e essa lhe conta sua história. Apiedado, deixa que ela more em sua casa. O que ele não sabe é que no acidente que vivenciou, Ana guarda um passado misterioso, que envolve o criminoso cínico Rodolfo (de Mendonza), que volta a surgir inesperadamente em sua vida e a quer ver transformada em estrela da música, indicando-a para um exímio cirurgião plástico, o Doutor Luna (Álvarez). Ela reencontra com Germán em La Golondrina, onde esse também inicia sua carreira como cantor, porém é toda mistérios. Quando Rodolfo chama Germán para se tornar maestro de Lucy Morán, quem ele encontra é Ana e, para sua estupefação, morando com Rodolfo. Ana descobre um documento que pode vincular Rodolfo a uma série de mortes. Atordoada e temerosa de uma possível reação, a única pessoa que pensa em se aconselhar é com Luna, o médico.

Inicia-se com um número de canto romântico típico de sua época, e levado adiante com bravura por Rey. Peluffo causou furor à sua época, como a primeira estrela mexicana a protagonizar cenas de nus no cinema mexicano, e surgindo aqui em uma cena a banhar-se, embora de relativo recato. E noutra mais adiante, na qual se sugere que ela se desnude para Rodolfo. Os trejeitos identificadores de cada personagem carregam uma carga de pura caricatura, provocando momentos de humor involuntário, como o que o mau caráter Rodolfo atira contra duas pessoas, e depois simplesmente saca um cigarro da carteira a sorrir. Ou suas gargalhadas de vilão.  Pascual, o mordomo extrovertido de Rodolfo, fica a cargo do contraponto cômico ao drama. Embora a pouco organicidade das canções em relação à trama como um todo esteja longe da média das contemporâneas chanchadas brasileira, basta dizer que o crédito referido a Rey apenas a identifica como cantora. Quanto às figuras femininas, enquadram-se perfeitamente nos moldes de tipos do melodrama, com pequenas variações tampouco raras. De um lado se tem a virginal, pura, fiel e sem sal (como de praxe, igualmente) Alicia, que Germán não precisará do menor esforço para tê-la no papel de submissa, caso case, e do outro Ana, mulher fatal, sensual, que tira partido de sua beleza física (após a cirurgia), interesseira, envolvida com tipos criminosos e um passado suspeito que lhe ganhava registro inclusive na face, mas que guarda no seu íntimo toda uma reserva de amor pelo herói.  Faz o uso mais interessante das duas opções que poderia em relação ao chefe da organização. A triangulação de olhares ao final, entrega a paixão de Ana/Lucy, a insegurança de Alicia – que também quis que o noivo fosse para sentir sua reação – e os sentimentos inconfessos de Germán. Trilhando convenções até sua última cena, observamos os policiais serem detidos de aprisionar Lucy Morán antes que ele termine seu número musical, numa deferência à arte e seu público. E o nada naturalista silêncio aquietado da plateia quando essa é levada pelos policiais, que reproduzem um tableau vivant ao final. Que os tiros em seu camarim, não despertem a atenção de ninguém, demonstram uma capacidade de blindagem acústica um tanto incomum. O melodrama fez bastante uso de – sobretudo – mulheres de rosto desfigurado, como metáforas para sentimento ou caráter. Nesse sentido, o filme se encaixa numa linha de várias produções hollywoodianas e europeias anteriores, como Traição Sublime (1933), de Léonce Perret, A Mulher Que Vendeu a Alma (1938), de Gustaf Molander  e Um Rosto de Mulher (1941), de George Cukor, assim como posteriores como Os Olhos Sem Rosto (1960), de Franju ou A Pele Que Habito (2011), de Almodóvar. Brooks y Enriquéz. 97 minutos.

 

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