Filme do Dia: Matar ou Correr (1954), Carlos Manga


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Matar ou Correr (Brasil, 1954). Direção: Carlos Manga. Rot. Original: Amleto Daissé & Victor Lima. Fotografia: Amleto Daissé. Música: Luiz Bonfá & Lyrio Panicalli. Montagem: Carlos Manga, Wilson Monteiro & Waldemar Noya. Cenografia: José Cajado Filho. Figurinos: Gilda Bastos. Com: Oscarito, Grande Otelo, José Lewgoy, John Herbert, Inalda de Carvalho, Renato Restier, Suzy Kirby, Julie Bardot, Nicolau Guzzardi.
Kid Bolha (Oscarito) se torna xerife de uma cidade do Velho Oeste, Citydown, após acidentalmente prender o vilão temido por toda a sociedade local, Jesse Gordon (Lewgoy), que mata por motivos diversos, inclusive tédio. Seu amigo, Cicscocada (Otelo) torna-se o ajudante dele no cargo. Jesse trabalha para o mafioso Bob (Restier), e consegue fugir da prisão em pouco tempo, deixando Bolha desesperado. Quando o trem chega a cidade todos se encontram tensos com o retorno de Jesse Gordon e um novo enfrentamento com os heróis.
Impressionante, para os padrões modestos de produção do estúdio, é não apenas a reconstituição do ambiente do Velho Oeste tal como elaborado no imaginário popular via Hollywood, como abdicar com desenvoltura dos ambientes internos aos quais toda a tradição do estúdio, como anteriormente da Cinédia, fora grandemente devedora, e tal como o gênero tradicionalmente pedia. E, quando as cenas se deslocam para os interiores, os ambientes também se tornam perfeitamente críveis e até o timing dos atores em sua foma de se deslocarem ou falarem. O título do filme é uma explicita sátira ao que recebeu em português célebre filme de Fred Zinnemann, Matar ou Morrer, de dois anos antes. E, numa mescla entre o cômico e o western, sua tirada sobre a morte do cantor, presumida e comentada, sem nenhum abalo pelo proprietário do saloon, é digna do posterior Mel Brooks. E de forma mais breve que outras chanchadas também investe nas “inversões” de gênero, caso da máscula mulher que salva a dupla de heróis avacalhados ao início, a qual nenhum homem enfrenta. Na sua cópia das convenções do cinema no qual se inspira não faltam sequer motivos que casam visualmente, servindo como transição entre as sequencias ocasionalmente. Embora contando com roteiristas e diretor diferentes, as fórmulas desenvolvidas em outros filmes do estúdio anterior (como Aviso aos Navegantes) ressurgem, como é o caso do momento em que um dos vilões é entretido pelo personagem de Otelo, enquanto uma das figuras do “eixo do bem” revira suas coisas, momento esse quase tão temporalmente dilatado quanto o similar no porão de um navio no filme de Watson Macedo. E, de modo um pouco diverso, o mesmo se aplicaria ao momento em que todos, de ambos os eixos,  esperam com ansiedade, a chegada do comboio ferroviário. Lewgoy está excepcional na construção de seu tipo, sobretudo no gestual, olhares e voz. A cena climática do duelo do filme de Zinnemann é aqui revivida de modo jocoso. Destaque para o momento um tanto perverso que Ciscocada passa sorrindo do desespero daqueles que perderam o gato de estimação que ele levou para ser cozinhado para Jesse Gordon. E, como escracho mais ou menos tributário de sua fonte original, é sintomático que o casal romântico aqui – que seria o equivalente da dupla Anselmo Duarte & Eliana – tenha nomes como Phil & Helen, não apenas nomes anglicizados como de outros personagens, mas pronunciados enquanto tal na voz conscientemente empostada de John Herbert; já a dupla bufona possui nomes mais prosaicos. Se parece ser a falta de códigos apropriados para se contrapor a Jesse que traz vantagem para a dupla bufona, é curioso que todos ao redor apenas observam a luta e não os ajudem. Ao final, ainda que inadvertidamente não fosse com esse próposito, Manga apresenta como contraponto aos beijos românticos dos dois casais um terceiro “casal” composto pelos assexuados bufões, revelando a existência de investimento erótico habitualmente como apontando para os seus modelos originais hollywoodianos, em que verdadeiras histórias de amor podiam ser escritas sobre a fidelidade entre amigos no western. Atlântida Cinematográfica para U.C.B. 98 minutos.

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