Filme do Dia: Gente no Domingo (1930), Robert Siodmak & Edgar G. Ulmer
Gente no Domingo (Menschen am Sonntag, Alemanha, 1930).
Direção: Robert Siodmak & Edgar G. Ulmer. Rot. Adaptado: Billy Wilder, a
partir de reportagem de Curt Siodmak.
Fotografia: Eugen Schüfftan. Música: Otto Stenzeel. Dir. de arte: Moritz
Seder. Com: Erwin Splettstösser, Brigitte Borchert,Wolfgang von Waltershausen,
Christl Ehlers, Annie Schreyer.
O motorista
de táxi Edwin vive com a modelo Annie, com quem sempre está às turras e planeja
passar o domingo na praia com o amigo Wolfgang, que faz um pouco de tudo. Wolf
leva consigo sua nova namorada. Christl, mas ao lhe resistir os avanços, volta
sua atenção para a melhor amiga dela, Brigitte, com quem se afasta e tem um
momento de intimidade. Christl tampouco deixa que Edwin a toque. Quando
retornam na embarcação que é uma espécie de pedalinho, flertam com duas garotas
que se encontram em dificuldades por terem deixado cair o remo na água. A
segunda-feira chega.
Auto-proclamando-se
um filme sem atores, certamente se beneficia de um frescor na captação de seus
atores em seus ambientes habituais de frequência – menos por eles, em si, algo
tensos (ainda que não compostos enquanto atores profissionais, tais como os de Nada Além das Horas, de Cavalcanti),
que pela forma como são registradas a espontaneidade da rotina das ruas
berlinenses, de forma talvez ainda mais espontânea que o aclamado revigoramento
que Acossado realizou em relação a Paris
mais de trinta anos após. A forma como decupa seus “atores naturais” em suas
conversas é bastante próxima das ficções, no entanto, então o fato de talvez
ter sido o filme mais próximo da concepção de “sinfonia urbana” e que, ao mesmo
tempo, dá um rosto e vida psicológica própria para alguns em meio a massa
informe se torna menos efetivo por atuar em um registro distinto do documental
nesses momentos, com uma decupagem muito bem planejada – caso da cena de amor e
da corte que lhe antecede no parque, enquanto exemplo mais enfático, chegando a
verdadeiros requintes de esteticismo como os planos que observam muito
aproximada e de baixo três de seus personagens ao redor de um gramofone. Uma
exceção, caso tivesse sido melhor aprofundada (ao menos na versão que consta
hoje), apresentaria com mais vagar a segunda-feira, com seus personagens, antes
observados como que por uma lente de microscópio, novamente no tecido social
mais amplo e relações mais impessoais, provocando um efeito de quebra brutal
com a intimidade antes observada que, potencialmente, serviria como protótipo
para todos os rostos anônimos entrevistos ao longo do filme. Em relação ao
filme de Cavalcanti, aqui se utiliza de vários momentos de desfiar frenético de
uma colagem de imagens do que fazem os berlinenses aos domingos, aproximando-se
bem mais do caráter “sinfônico” que
aquele. Seu teor, próximo dos preceitos da Nova Objetividade, se não chega a
explorar a nudez dos locais coletivos de intimidade, como é o caso dos
operários da mina em Tragédia da Mina,
apresenta, de forma mais pudica, duas jovens e um jovem se trocando
improvisadamente, em meio ao mato, para usufruírem do banho. Não se tem acesso
à versão completa da época de seu lançamento, mesmo na restauração que faz uso
de cópias de diversas cinematecas europeias. O número de colaboradores que se
tornariam ilustres aumenta quando se leva em conta as participações não
devidamente creditadas de Fred Zinemmann e Curt Siodmak na direção e também de
Edgar G. Ulmer e Robert Siodmak como co-roteiristas, somando-se ao creditado Billy Wilder. Sua poética é de longe
menos devedora da apresentação das disparidades sociais (de forma um tanto
esquemática e mesmo caricata em alguns momentos, diga-se de passagem), assim
como de elementos que apenas reforçam o estigma do lumpem-proletariado, como o
crime, do filme de Cavalcanti; embora os
personagens aqui presentes, aparentemente, sejam representantes mais de uma
classe média baixa que do lumpem como naquele. Por outro lado, sua busca de
representação dos momentos de lazer de personagens populares antecipa
estratégias que serão exploradas, de forma mais convencionalmente ficcional,
por Jean Renoir. Como em Nada Além das Horas se fica com a
impressão que a ficção drena quase por completo o teor documental. Destaque
para o tocante momento em que pessoas são fotografadas e sua foto fixa fica
impressa no próprio filme, evocativa do momento mais bem efetivado do
contemporâneo O Homem com a Câmera,
de Vertov. Filmstudio Berlin. 73 minutos.
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