Filme do Dia: A Grande Beleza (2013), Paolo Sorrentino
A Grande Beleza (La Grande Bellezza, Itália, 2013).
Direção: Paolo Sorrentino. Rot. Original: Paolo Sorrentino & Umberto
Contarello, a partir do argumento de Sorrentino . Fotografia: Luca Bigazzi.
Música: Lele Marchitelli. Montagem: Cristiano Travaglioli. Dir. de arte:
Stefania Cella. Figurinos: Daniela Ciancio. Com: Toni Servillo, Carlo Verdone,
Sabrina Ferilli, Carlo Buccirosso, Iaia Forte, Pamela Villoresi, Galatea Ranzi,
Franco Graziosi, Roberto Herlitzka, Serena Grandi.
Jep Gambardella (Servillo) é um jornalista outonal que
foi uma das sensações da sociedade romana dita culta. Após uma estreia mais que
promissora na literatura, não mais produziu outro livro, vivendo dos créditos
passados, enquanto participa das intermináveis festas agitadas por gente que já
conhece pelo avesso. É subitamente visitado por um amigo de juventude que lhe
revela que a esposa com quem vivera 35 anos fora sempre apaixonada por Jep, com
quem namorara brevemente e passa a se envolver com a filha de um amigo do
passado, a stripper Ramona (Ferilli). Com a língua afiada, Gambardella nunca
deixa nenhuma provocação ser respondida com silêncio, seja uma esnobe amiga de
longa data, seja o Cardeal Belucci (Herlitzka), forte candidato a papa, quando recepciona
em sua casa uma velha de 104 anos tida como santa.
O débito mais evidente do filme é certamente com A Doce Vida (1960), de Fellini, como se a desencantada e
decadente elite que circunda o mundo das artes e das letras, e o vazio
correlato dos que dela fazem parte, retornassem, alguns anos (ou décadas) mais
velhos. Visualmente opulento, como os filmes de Sorrentino costumam ser, assim
como derrisório com relação não somente a Roma, mas igualmente a Itália, paradoxalmente
efetivando mais um tributo sobretudo a primeira, o filme é de uma inspirada
verve não apenas em termos da espirituosidade de seu roteiro como de soluções
visuais que mais parecem atualizações da excentricidade de tipos de Fellini.
Como em Oito e Meio, trata-se do velho mote de um artista em crise,
só que aqui há já várias décadas. Amargo como seu protagonista, o filme se
encontra eivado de um cinismo calculista que parece ser o refúgio para alguém
que não conseguiu consumar de fato o grande amor de sua vida. Imperdoável para
com os lances sensacionais que se querem fazer passar por arte, ele leva às
lágrimas uma atriz performática que não consegue esboçar de forma minimamente
coerente o que ela entende por arte e observa com suspeitoso desdém uma garota
que incorpora uma alma de artista, pintando grandes telas a partir de uma
mistura de cores enquanto chora. Porém, quando busca expressar o outro lado da
moeda: o sublime do amor passado, não consegue ir além do trivial, através de
imagens, corpos e faces belas. Será que essa lógica poderia ser aplicada ao
próprio filme? Aparentemente não. Na sua diatribe entre clássico e
moderno-contemporâneo ou cultura erudita x cultura pop, o filme talvez descambe
para um amargor típico de um grupo de cineastas que lançou filmes de propostas
biográficas sobre uma contemporaneidade vazia e, no caso brasileiro, destituída
de um projeto de civilidade, de viés bastante reativo e desencantado tal como O Príncipe (2002), de Giorgetti ou A Suprema Felicidade (2010), de Jabor,
mesmo Sorrentino se encontrando longe de fazer parte dessa geração. Destaque
para a tocante homenagem a Fanny Ardant, encontrada ao acaso pelo protagonista
nas ruas de Roma. Indigo Film/Medusa Film/Babe Film/Pathé/France 2 Cinéma
para Janus Film. 142 minutos.
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