The Film Handbook#177: Mitchell Leisen
Mitchell Leisen
Nascimento: 06/10/1898, Menominee, Michigan, EUA
Morte: 28/10/1972, Los Angeles, Califórnia, EUA
Frequentemente considerado enquanto um diretor sub-Lubitsch contratado pela Paramount para materiais os mais diversos, James Mitchell Leisen tem sido ostensivamente, de fato vergonhosamente, negligenciado. O lendário "toque de Lubitsch" pode parecer pesado quando comparado ao modestamente estilizado e intrincado tratamento da comédia e do melodrama, que tratava repetidamente de temas com delicada ironia e profundidade emocional.
Formado em arte e arquitetura, Leisen entrou para Hollywood como figurinista, posteriormente diretor de arte para DeMille e outros: seus primeiros créditos incluem Macho e Fêmea/Male and Female, Rei dos Reis/The King of Kings e os épicos de Fairbanks Robin Hood e O Ladrão de Bagdad/The Thief of Bagdad. Sua estreia na direção se deu em 1933 com Filha de Maria/Cradle Song; no ano seguinte, Uma Sombra que Passa/Death Takes a Holiday e Segue o Espetáculo/Murder at the Vanities (um bizarro musical de bastidores-comédia-thriller, que chamava a atenção pelas rotinas exóticas de suas coristas e pela canção Sweet Marijuana) estabeleceram-no como um talento digno de observação. Uma série de comédias glamorosas e sofisticadas se sucederam, revelando seu uso fino de atores (MacMurray, Milland, Lombard, Goddard, dentre outros, demonstrariam ser particularmente suscetíveis) e seu amor por cenários extravagantes e elegantes: na verdade, após o charmoso Corações Unidos/Hands Across the Table (uma comédia romântica intensificada por cenas de real dor emocional) Leisen se encontrou capacitado a trabalhar com os mais promissores roteiristas de Hollywood. Wilder e Charles Brackett escreveram o brilhante Meia-Noite/Midnight>1, no qual uma oportunista americana em busca de fortuna se encontra atolada até o pescoço em um lamaçal de decepção e ciúmes, quando posa de esposa de um aristocrata francês empenhado em conquistar de volta as atenções de uma esposa infiel. Eles também foram responsáveis por dois melodramas de alta qualidade: Levanta-te, Meu Amor/Arise, My Love, sua propaganda fermentada com engenho, enquanto acompanha o problemático amor de um casal de americanos numa Espanha dilacerada pela guerra, e A Porta de Ouro/Hold Back the Dawn, uma história tocantemente dolorosa de uma união sem amor de um refugiados apátrida e da mulher com a qual casa para obter cidadania estadunidense.
Durante o mesmo fértil período, Leisen também se beneficiou do talento para a escrita de Preston Sturges. Garota de Sorte/Easy Living foi uma mordaz sátira de Wall Street, enquanto Lembra-se Daquela Noite?/Remember the Night>2 mesclava comédia suave, romance pungente e uma alusão de comentário social: história de um bem sucedido advogado cuja carreira hesita quando se apaixona por uma ladra de lojas a qual está processando, mas que solta por fiança no Natal. Leisen, no entanto, não foi um simples intérprete sensível dos roteiros alheios - ritmo, vivacidade e um compromisso com os fundo emocionais de seus ocasionalmente controversos roteiros emprestam-lhes graça e poder a sua obra consistentemente comercial.
A despeito de seu interesse recorrente nos problemas e absurdos criados por sociedades obcecadas por sexo, status e classe, o estilo de direção de Leisen foi essencialmente "invisível", evitando efeitos visuais virtuosos para focar em personagens críveis e narrativas sem sobressaltos. A Mulher que não Sabia Amar/Lady in the Dark>3, no entanto, baseado em um musical de Kurt Weill-Moses Hart, apresentou o gosto do diretor por cenários e figurinos mirabolantes levado ao extremo. Sobre uma editora de moda que se submete à psicanálise para desemaranhar os sentimentos sobre os três homens de sua vida, fez lúgubre uso de seus cenários e figurinos ridiculamente extravagantes para criar uma fantasia freudiana que é inadvertidamente uma obra-prima de Technicolor kitsch. Um desenho de produção luxuoso também inspirou Gaivota Negra/Frenchman's Creek (um espadachim de alto nível) e no estilo de Pigmalião, Flor do Lodo/Kitty>4, uma recriação engenhosa, elegante e raramente autêntica do período regencial inglês, com Paulette Goddard em plena forma como a jovem de rua cuja vida é radicalmente transformada quando é pintada em trajes aristocráticos por Sir Joshua Reynolds. Desde então, no entanto, a sofisticação exuberante de Leisen se encontrava em desacordo com a propensão dominante no pós-guerra por obstinado realismo, e sua carreira foi constantemente declinando, apesar dos filmes originais e divertidos que ainda emergiram em intervalos regulares. Só Resta Uma Lágrima/To Each his Own>5 foi um thriller impressionantemente atmosférico com Barbara Stanwyck chantageada por uma antiga paixão quando assume a identidade da viúva de um soldado para herdar a fortuna da família. O Quarto Mandamento/The Mating Season fazia uso do talento loquaz de Thelma Ritter com fino efeito cômico e Uma Aventura em Balboa/The Girl Most Likely foi um alegre musical, notável pelas cores brilhantes e expressivas de seus cenários e figurinos. Por volta de então, no entanto, a carreira cinematográfica de Leisen estava virtualmente acabada: após dirigir um documentário sobre Las Vegas e diversas atribuições televisivas, ele se retirou para se concentrar em seus negócios como alfaiate e decoração de interiores em Beverly Hills.
Frequentemente no seu melhor, Leisen foi o diretor arquetípico de leves, mas infalivelmente inteligentes, entretenimentos, com interpretações, enredos e organização visual afiados em brilhante perfeição. Embora raramente tenha lidado com temas "importantes", um seguro senso de tom e gosto, uma habilidade ao mesclar comédia e drama sem criar solavancos humorísticos e uma vontade de confrontar as emoções humanas com honestidade mais que indulgência, marcam-no como um realizador merecedor de maior atenção crítica que até agora tem recebido.
Cronologia
Talvez ainda mais que Lubitsch, o melhor diretor da Paramount, Leisen possa ser visto como uma contrapartida menos teatral de Cukor e como precursor tanto de Wilder quanto de Sirk; seu senso de desenho, ele próprio possivelmente derivado de figuras como DeMille, von Stroheim e von Sternberg, antecipa a obra de Minnelli.
Destaques
1. Meia-Noite, EUA, 1939 c/Claudette Colbert, John Barrymore, Don Ameche
2. Lembra-se Daquela Noite?, EUA, 1940 c/Barbara Stanwyck, Fred MacMurray, Beulah Bondi
3. A Mulher que não Sabia Amar, EUA, 1944 c/Ginger Rogers, Ray Milland, Warner Baxter
4. Flor do Lodo, EUA, 1945 c/Claudette Colbert, Ray Milland, Constance Collier
5. Só Resta Uma Lágrima, EUA, 1950 c/Barbara Stanwyck, John Lund, Jane Cowl
Texto: Andrew, Geoff. The Film Handbook. Londres: Longman, 1989, pp. 164-5.
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